27 agosto 2007

A Nova Classe

Mikhail Bakunin (1814-1876) não era um adivinho, mas um estudioso das estruturas de poder e da natureza da condição humana. Possivelmente, inspirado nos exercícios e abusos de poder de Cromwell (Inglaterra) e da Revolução Francesa.

Bakunin é o principal pensador e propagador do anarquismo. Uma teoria ideológica que almeja criar uma sociedade que funciona sem hierarquias políticas, econômicas e/ou sociais.

Os anarquistas defendem a ausência de governos na suposição de que um sistema social só funciona com a maximização da liberdade individual e da igualdade social.

Bakunin defendia que o esforço revolucionário deveria ser concentrado na destruição das "coisas" (leia-se Estado), e não das "pessoas".

Afirmava que a centralização da autoridade e do Estado criavam um obstáculo ao desenvolvimento das pessoas e das nações.

Rompido com comunistas e socialistas, Bakunin lidera a criação de grupos anarquistas em vários países do mundo, pregando o anti-autoritarismo, o mutualismo e o princípio descentralizador.

Uma de suas proféticas afirmativas, diz: "Assim, (...) chega-se ao mesmo resultado execrável: o governo da imensa maioria das massas populares se faz por uma minoria privilegiada. Esta minoria, porém, dizem os marxistas, compor-se-á de operários. Sim, com certeza, de antigos operários, mas que, tão logo se tornem governantes ou representantes do povo, cessarão de ser operários e por-se-ão a observar o mundo proletário de cima do Estado; não mais representarão o povo, mas a si mesmos e suas pretensões de governá-lo. Quem duvida disso não conhece a natureza humana”.

Outro sujeito, Milovan Djilas (1911-1995), ex-ministro, vice-presidente, dissidente e contestador do regime comunista iugoslavo, ao tempo de Josip Broz Tito, dizia em seu livro “A Nova Classe” (1957):

“É muito difícil, talvez impossível, definir os limites da nova classe e identificar seus membros. Pode-se dizer que ela é constituída daqueles que gozam privilégios especiais e favoritismo econômico devido ao monopólio administrativo que detém”.

Conclusão: não há nada de novo no “front” da história! Agora, também nós assistimos a ascensão e as manobras da nova classe. Poder, arrogância, soberba e escândalos.

O politburo petista-governamental desdobra-se em procedimentos de contenção do dique comportamental rompido. Operações de dissimulação e mascaramento das relações noturnas dos companheiros da hora.

São renans, dirceus, waldomiros, delúbios, pereiras, valérios, jeffersons, dudas, jucás, severinos, fundos de pensões, assistencialismos, cartões de crédito corporativo, etc...

São os substantivos e adjetivos novos que desafiam os dicionaristas de plantão. Quando pensamos que descobrimos seu significado/dimensão, surge nova significação/significante. É como querer descobrir a cor do camaleão.

Silêncio e distância agora são os novos papéis do mercado político. Ações/inações nem tão virtuais compradas e silenciadas com dinheiro real.

20 agosto 2007

O Vestido da Verdade

A razão de existir de um sistema político está diretamente relacionada com sua função de melhorar a vida dos cidadãos e zelar pelos objetivos nacionais.

Por isto há eleições livres, diretas e periódicas, de modo a verificar e julgar a realização e a qualidade dos procedimentos da administração pública.

Para que este sistema funcione bem é necessário que o cidadão saiba o que o governo tem feito para cumprir suas obrigações. Do mesmo modo que precisa saber, também, o que o governo e a oposição defendem e objetivam.

O cidadão precisa conseguir analisar essas informações e ações para poder julgar qual sua adequação, viabilização, conseqüência social e oneração financeira.

Porém, há um problema: a maioria da população brasileira não tem capacidade para entender e analisar estas informações. Que dirá acerca das informações que não chegam.

Neste sentido, os representantes políticos – governo e oposição - deveriam se empenhar para superar esta contradição. Entretanto, aproveitam-se para corromper e denegrir o sistema político.

Na última eleição presidencial, por exemplo, a esmola (programa Bolsa Família) distribuída ao povo cumpriu um papel eleitoral fundamental pró-governo.

A influência foi tamanha que os escândalos e os crimes contra a economia, contra o dinheiro público e contra o aparelhamento do Estado, não repercutiram objetiva e eleitoralmente.

Aliás, quem questionasse a distribuição da esmola era rotulado como elitista e inimigo do povo. E quem questionasse a eficácia da gestão pública era rotulado como pró-privatizações e entreguista.

Mesmo que os questionamentos não fossem de ambição eleitoral, mas, sim, de teor econômico, sócio-educativo, jornalístico, ético, moral, etc...

Ultimamente, face às vaias impostas ao Presidente Lula, aqueles que querem e exigem o respeito às leis e às instituições são nominados de golpistas.

Entretanto, o que se percebe é um indiscreto e grosseiro movimento político do PT para reconduzir Lula à presidência, num terceiro mandato consecutivo. E os outros é que são golpistas!

Com a (in)consciência política dos pobres sendo comprada em troca de moedas e a corrupção financiando a perpetuação no poder, consolida-se a absoluta mediocrização do debate político e da ação de governo e estado.

Aliás, como conseqüência já não há mais nem oposição ideológica e institucional. O princípio da cooptação venceu.

Trata-se da desqualificação absoluta da política e da administração pública. Mas há quem goste da socialização da ignorância e da miséria!

Como diz Robert Musil, na obra "O Homem sem Qualidades", “a verdade tem apenas um vestido de cada vez e só um caminho, e está sempre em desvantagem”.



14 agosto 2007

O Paradoxo da Globalização

Faz alguns anos, o diplomata inglês Robert Francis Cooper, guru da política externa inglesa, afirmou que “(...) precisamos reverter aos métodos mais grosseiros de outras épocas – força, ataques preventivos, logro, o que for necessário (...) entre nós respeitamos a lei, mas quando operamos na selva, também temos que usar as leis da selva”.

Voltando no tempo: sabem todos que Tony Blair e George Bush utilizaram-se de argumentos fraudados para garantir a aprovação legislativa e justificativa popular para atacar o Iraque e o Afeganistão.

Rescaldo final: não somente pela tragédia da situação atual no Iraque, como também pelo conjunto do pós colapso das torres gêmeas nova-iorquinas, as bombas em Madrid e as bombas londrinas, a verdade é que ambos – Bush e Blair – ainda não convenceram seus súditos sobre a natureza daquelas operações militares e suas conseqüências presentes e futuras.

Ou então, dito de outro modo, avocada a “filosofia” do supracitado diplomata, a população norte-americana e britânica (os espanhóis mandaram José Maria Aznar para casa! e Blair também já foi!) quer saber mais detalhes e fundamentos sobre como é uma lei e uma ética para os outros. E de como os povos das selvas poderão reagir!

Como a ONU tem-se mostrado incapaz e incompetente para gerenciar os conflitos, e a União Européia é uma incógnita, os Estados Unidos não se constrangem em agir. Auto-titulam-se a “polícia do mundo e guardiões do regime democrático”.

As incursões/ações bélicas preconizadas pelos norte-americanos, a pretexto da vingança ao ataque do Word Trade Center-WTC, foram o prenúncio de (re) definições dos papéis globais, dos novos territórios de dominação/ocupação e da natureza intervencionista.

O acirramento dos conflitos no Oriente Médio interessa à política externa americana, mais precisamente aos seus negócios petrolíferos e armamentistas. Cinicamente, a pretexto da paz.

A humanidade tem inúmeros e maus exemplos sobre “as boas intenções” dos exportadores de revoluções e utopias, de modelos políticos e econômicos, da purificação das raças, etc..., entre outros devaneios que custaram, e continuam custando, a vida de milhões de pessoas.

O papel ocidental de tutela mundial estabelece uma contradição com o processo de globalização! Como conciliar um discurso pretensamente pacifista e universalista, utopicamente distribuidor de progresso e renda, com as práticas intervencionistas de natureza econômica e militar, de evidentes interesses no controle dos recursos naturais e tutela de países periféricos, a exemplo do Oriente Médio?

A historiadora norte-americana Bárbara Tuchman (1912-1989), premiada, consagrada e reconhecida mundialmente, escreveu, em sua obra “The March of Folly – from Troy to Vietnam” (1984), entre nós conhecida como “A Marcha da Insensatez – de Tróia ao Vietnã”, na edição brasileira José Olympio (1989), que “o paradoxo da condição humana é a sistemática procura – pelos governos – de políticas contrárias aos seus próprios interesses e a não consideração da existência de uma alternativa viável.”.

São páginas que servem de alerta e inspiração para toda humanidade, e aos governantes, principalmente, numa época em que a marcha da insensatez parece acelerada.