28 novembro 2008

O Ovo da Serpente

Conflito de gerações e dessintonia entre pais e filhos é uma “guerra” antiga, atual e interminável. As rupturas e os desencontros são de toda ordem, natureza e dimensão. E sem limites geográficos de ocorrência.
A propósito de diferenças entre gerações que vão e que vêm, “corre” na internet, faz muito tempo, um texto muito expressivo (que reproduzo, reduzo e adapto parcialmente abaixo), e acerca do qual não há certeza de autoria.
A internet é pródiga em mensagens de todos os tipos, anônimos ou não, assumidos ou atribuídos. Afinal, trata-se de um gigantesco tsunami de palavras, imagens e sons, de autorias falsas e verdadeiras, de mentiras e verdades, de realismo e ilusionismo.
Naturalmente, à conta desse dilúvio verborrágico e imagético a grande maioria é lixo. Mas mesmo no lixo podemos encontrar sabedoria e pérolas. Reduzido e adaptado, leia:
“Somos a primeira geração de pais decididos a não repetir com os filhos os erros de nossos pais. E com o esforço de abolir os abusos do passado, somos pais mais dedicados e compreensivos.
Mas, na tentativa de sermos os pais que queríamos ter, parece que passamos de um extremo ao outro.
Assim, somos a última geração de filhos que obedeceram a seus pais e a primeira geração de pais que obedecem a seus filhos!
Os últimos que respeitaram os pais e os primeiros que aceitam que os filhos lhes faltem com o respeito!
Antes se consideravam bons pais aqueles cujos filhos se comportavam bem, obedeciam as suas ordens e os tratavam com o devido respeito.
Mas, na medida em que as fronteiras hierárquicas entre pais e filhos foram-se desvanecendo, hoje, são os filhos quem, agora, esperam respeito de seus pais, pretendendo de tal maneira que respeitem as suas idéias, suas preferências e sua forma de agir e viver. E, além disso, que os pais os patrocinem no que necessitam para tal fim!
Os papéis se inverteram: agora são os pais que têm de agradar a seus filhos para “ganhá-los”, e não o inverso, como no passado.
Isso explica o esforço que fazem pais e mães para serem os melhores amigos e "tudo dar" a seus filhos.
Se o autoritarismo do passado encheu os filhos de medo de seus pais, a debilidade do presente os preenche de medo e menosprezo ao ver os pais tão débeis e perdidos como eles.
Se o autoritarismo suplanta, a permissividade sufoca!
Apenas uma atitude firme e respeitosa evitará o afogamento das novas gerações no descontrole e no tédio. À deriva, sem parâmetros, nem destino!”
Concluo eu: muitas obras de ficção, como filmes, textos e livros, usam a expressão “o ovo da serpente” como uma metáfora para a constatação de um mal em incubação!

21 novembro 2008

A greve do magistério e o X da questão

Falar sobre a relação “governo x magistério” se tornou uma cansativa repetição de constatações. Cansativa repetição porque não decorrem as medidas saneadoras e definitivas.
Basicamente assentada sobre questões salariais, a crise (permanente) revela a perda de controle sobre este contingente humano e suas perspectivas profissionais.
Enquanto os professores reclamam melhor tratamento salarial, correspondente à importância de suas funções, os sucessivos governos têm esgrimado com as históricas dificuldades financeiras estruturais.
Mas os governos vão além: atribuem à categoria a falta de dedicação, desídia, desvios de função, entre outros lapsos de conduta, a exemplo de partidarização do CPERS.
Porém, ainda que verdadeiras tais afirmativas, e disseminado na opinião pública o desgaste do professorado, entendo que o responsável principal ainda é o “patrão”, no caso específico, o governo.
Mas, então, por que o desgaste é maior entre o professorado? Por que se reclama mais dos professores do que dos governos? Por que não há uma grave crise social a cada greve?
O que impede a adesão/apoio de outros setores social e economicamente representativos? Por que, afinal, há uma profunda indiferença diante dessa grave e não resolvida questão pública?
A resposta que encontro para essas perguntas passa por uma compreensão capitalista de nossos papéis sociais. O que é isto?
Explico: nas greves e interrupções de outras categorias profissionais, com prejuízos materiais e financeiros da sociedade passíveis de medição e de conversão em moeda, a solidariedade advinda (ou a revolta social) sempre é rápida, contundente e eficaz.
Sim, e daí? Daí que greves na área da educação produzirão resultados somente constatáveis após anos. Após pesquisas e medições que apurem que em determinada época houve uma queda no nível de desempenho escolar. Enfim, um evidente período de retrocesso e prejuízo educacional!
Isso ocorre porque educação não produz resultados imediatos, não produz peças passíveis de quantificação no final da linha de produção.
Educação trabalha com crianças e adolescentes, “produz” operários, médicos, professores, advogados, músicos e filósofos. “Produz” gente!
O desafio da sociedade e do governo consiste na recuperação do sentido histórico e original do magistério escolar, e na garantia aos professores de realização na profissão.
Nossa indiferença social às demandas do magistério é uma fatura que vencerá logo ali adiante, no tempo. De antemão, já sabemos que será irresgatável, incalculável e dolorosa!
Parênteses: não reconheço legitimidade no governo federal para criar um piso nacional haja vista a hiperconcentração tributária da União e as diferenças regionais. Mais: atribuir aumento salarial cujo pagamento será com dinheiro alheio é um ato demagógico!

14 novembro 2008

446 - O Número Mágico da "Pilantropia"

Na república lulo-petista do mensalão, das cuecas recheadas com dólares, dos grampos ilegais, da farra dos cartões corporativos e das ONG’s de araque, o mais recente escândalo atende pelo número 446.
Outrora prática tão criticada pela então oposição, se trata de medida provisória publicada no Diário Oficial da União de 10 de novembro e assinada pelo Presidente Lula.
A pretexto de aperfeiçoar e descentralizar o modelo de concessão de benefícios tributários – e sob alegação de que precisa manter a continuidade do serviços sociais - a MP concede perdão bilionário e extingue recursos contra entidades filantrópicas que não cumpriram exigências e/ou cometeram fraude.
Entidades que praticam - e provam! - a benemerência social têm o direito de reivindicar isenção no pagamento da contribuição previdenciária e tributos, inclusive estaduais e municipais, além de receber repasses de verbas públicas. Para tal, recebem o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social – CEBAS.
Porém, em meio a muitas ações e entidades corretas, centenas são flagradas malversando e manipulando dinheiro público. São bilhões de reais por ano!
Para investigar, conter e processar as fraudes, crimes de corrupção ativa e passiva, advocacia administrativa e tráfico de influência, surgiu a Operação Fariseu: uma força-tarefa composta por auditores da Receita Federal, do INSS, procuradores da República e policiais federais.
Sem contar os Ministérios da Saúde, Educação, e do Desenvolvimento Social, só no Ministério da Previdência Social (MPAS) são aproximadamente 1.700 processos e 597 instituições sob investigação. Com a MP 446, o Presidente Lula joga todo o trabalho investigativo e processual na lixeira!
Do conjunto de 49 artigos da MP, constam três artigos mais representativos do gigantesco trem da alegria. Reproduzo-os, literalmente:
“Art. 37. Os pedidos de renovação de CEBAS protocolizados, que ainda não tenham sido objeto de julgamento por parte do CNAS até a data de publicação desta Medida Provisória, consideram-se deferidos.
Parágrafo único. As representações em curso no CNAS propostas pelo Poder Executivo em face da renovação referida no caput ficam prejudicadas, inclusive em relação a períodos anteriores”.
Entendeu? Leia de novo. Resumindo: mesmo pendentes de análise e mérito, consideram-se deferidos e aprovados os pedidos. E no parágrafo único, joga no lixo as investigações e todo o passado suspeito da entidade requerente. Inacreditável!
“Art. 38. Fica extinto o recurso, em tramitação até a data de publicação desta Medida Provisória, relativo a pedido de renovação ou de concessão originária de CEBAS deferido pelo CNAS”.
Eu explico: de novo joga no lixo todas as investigações e contestações sobre escrituração das entidades e renovação de certificados suspeitos!
“Art. 39. Os pedidos de renovação de CEBAS indeferidos pelo CNAS, que sejam objeto de pedido de reconsideração ou de recurso pendentes de julgamento até a data de publicação desta Medida Provisória, consideram-se deferidos”.
Incrível. No mínimo, crime de responsabilidade. Releia e veja: converte “indeferido” em “deferido”!
Em síntese: se trata de uma ampla, geral e irrestrita anistia, apesar de todas as investigações e acusações realizadas por autoridades administrativas, policiais e judiciais.
Essa medida provisória é uma pérola anti-republicana. República, uma expressão tão ao gosto da autonominada esquerda no poder!

07 novembro 2008

O show da democracia norte-americana

O fenômeno Barack Obama é um assunto que demandará mais estudos e reflexões haja vista que é conseqüência de uma rara conjugação de inúmeros e contraditórios fatores históricos.
Não é a toa que ascende sob uma aura de esperança e revolução de comportamento nas relações internas e externas norte-americanas.
Porém, dado o nível de comprometimento das históricas e conservadoras forças sociais e econômicas do império do norte, só vendo para crer!
Mas o show da democracia norte-americana não se esgotou nessa memorável eleição presidencial. Enquanto a nação se dividia entre os partidários de democratas e republicanos, muitos estados e cidades norte-americanas tinham opções adicionais na cédula eleitoral.
Há muitas décadas, os Estados Unidos aproveitam as eleições para promover plebiscitos. No dia da eleição presidencial outras 153 consultas foram realizadas em 36 estados.
Entre tais, a mais badalada e complexa se realizou na Califórnia. Além de 11 outras diferentes questões sob julgamento dos californianos, estava em discussão a "proposta 8".
A “proposta 8” foi um pedido plebiscitário promovido por grupos conservadores e religiosos para anular a decisão da Suprema Corte da Califórnia que legalizara o casamento entre homossexuais. Venceu o voto contra o casamento!
Também na Flórida e no Arizona venceu a tese contra o casamento homossexual. Atualmente, só Massachusetts e Connecticut permitem o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Enquanto isso, Dakota do Sul, Colorado e Califórnia (de novo) votaram sobre limitações no direito ao aborto. Aborto é um assunto recorrente em eleições norte-americanas.
No Arizona estava em votação a previsão e autorização do aumento de multas e punições para as pessoas que contratarem imigrantes ilegais.
Em Michigan foi aprovada a legalização do uso da maconha para fins médicos. Massachusetts e Califórnia decidiram sobre a descriminalização do uso da maconha.
Enquanto isso, em Washington a maioria apoiou a descriminalização da assistência médica para o suicídio de pacientes terminais (autoriza a eutanásia).
No Oregon os cidadãos opinaram sobre o acesso de estudantes estrangeiros aos estudos de sua língua nativa. E no Missouri resolveram sobre se o inglês se tornará a língua oficial do estado!
Já o povo de Massachusetts opinou sobre a proibição das corridas de cachorros. Ainda sobre animais, o povo da Califórnia julgou uma emenda constitucional que garante espaço vital mínimo aos animais de fazenda. No Nebraska e no Colorado os eleitores decidiram sobre a proibição de programas públicos que dêem preferência aos negros e às minorias.
E os cidadãos de San Francisco opinaram sobre a descriminalização ou não da prostituição. A vitória da "proposta K" impediria as forças policiais de prender prostitutas!
E você, meu caro cidadão brasileiro, não gostaria também de opinar sobre a proibição do fumo, jogatina oficial, acidentes de trânsito, uso de drogas, casamento de homossexuais, direito ao aborto, corrupção, pena de morte, eutanásia, ..., ???
Assunto não falta. Falta coragem e democracia!