19 dezembro 2008

A "captura" do Estado

“Captura”, assim entre aspas, significa, politicamente, e na administração pública, principalmente, a subordinação, a submissão, o “seqüestro” da coisa pública, da função de estado, do órgão de estado, aos interesses corporativos e privados.
A prática da “captura” se opera num campo de ação, numa faixa de atuação muito tênue, onde pode se confundir com atos de omissão, de prevaricação e de corrupção ativa e passiva.
É a tomada do poder político nas diversas esferas públicas e sua transformação em valor econômico privado.
Observação: quando se fala aqui em Estado, se está referindo aos níveis municipais, estaduais e federais.
Mas assim como há formas sofisticados, há formas muito simplórias de “captura”. Por exemplo, o nepotismo. O nepotismo, você sabe, é a ocupação de cargos públicos por parentes de autoridades públicas.
Mais recentemente, haja vista legislação proibindo a prática do nepotismo direto, seus autores optaram por nepotismo cruzado.
Isto é o seguinte: autoridade de órgão X indica seu afilhado para a autoridade do órgão Y, que por sua vez apresenta o seu afilhado para o órgão X. Não importa o nível (municipal, estadual ou federal) do cargo do padrinho e o de destino do afilhado.
Regra geral, o indicado é um familiar bem próximo. Esposas e maridos, filhos e filhas, irmãos e irmãs, sobrinhos e sobrinhas, pais e mães, netos e netas, noras e genros, tios e tias, e, às vezes, até a vovozinha ganha uma chance para “melhorar” sua aposentadoria. A administração pública virou uma grande família!
Uma vez instalados nas estruturas de poder, ficam muito a vontade para seu exercício, influência e ampliação. Não é a toa que há tantos casos de políticos e administradores públicos que fazem seus sucessores políticos em família.
Já houve um tempo em que havia um certo pudor, uma vergonha, por assim dizer, nessa prática. Hoje reina a omissão da crítica e cobrança popular, tudo com uma perspectiva de levar sua própria vantagem no momento oportuno.
As eventuais posições político-partidárias de oposição, que deveriam ser os primeiros a exercitar a denúncia e a crítica, também se omitem.
Afinal, sempre é bom ficar de bem com o governante ou com aquele deputado. E depois, o sujeito (parente) indicado apenas quer trabalhar e ganhar o seu. E dizem até que é boa gente e competente!
Mas, e o povo o que acha disso? Limita-se aos comentários à boca pequena, piadinhas e ironias. Resta-lhe adaptar-se ao meio, ou no meio, como preferem alguns mais espertos. Otário..., são os outros!
“Captura” do estado, patrimonialismo, nepotismo, são faces da mesma moeda. É a imbricação promíscua entre o interesse particular e o setor público.
Houve um tempo que diziam que era coisa de “partidos e gente de direita”. Hoje já não há mais partidos, nem oposição, nem gente direita (com perdão do trocadilho), nem à esquerda.
São as novas oligarquias. É a nova ideologia!

12 dezembro 2008

Orçamento Público ou "Caixa Preta"

Uma referência comum em qualquer programa partidário de governo, principalmente no período eleitoral, diz respeito ao compromisso de democratização do orçamento público, tanto do ponto de vista de sua publicidade/divulgação quanto de sua feitura.
De fato, comparados os níveis de transparência orçamentária desde 1990 aos dias de hoje, se percebe que muita coisa mudou para melhor.
Outrora representados apenas por volumosos livros e pastas, hoje as informações também estão disponíveis em meio eletrônico nos “sites” da Casa Legislativa e do Poder Executivo.
O orçamento é a expressão real do estado organizado (união, estados e municípios), de sua dimensão econômica, social e política, e se constitui em objeto e meio de ação.
Mas, isso ainda não garante a necessária transparência, haja vista que a maioria das pessoas não consegue entender o que ali está (d)escrito.
Consequentemente, é necessária a adoção de meios e dados mais acessíveis à linguagem popular, de modo informativo e qualitativo.
Também, é obrigação dos partidos, dos políticos e dos governantes, fazer com que a comunidade se interesse e entenda os números e as informações contidas no orçamento.
Se as informações são apresentadas de modo a favorecer análises comparativas, além de conter um painel completo das finanças, o conjunto adquire qualidade e veracidade.
Consequentemente, relevante é a participação da comunidade e a transparência existente na elaboração, na execução e na fiscalização do gasto público.
Regra geral, essa ação democrática e popular vai detectar e propiciar reformas da administração pública, a exemplo de mais eficiência e menos burocracia.
Assim como pode denunciar/constatar onerosas e ineficientes funções e tarefas. E a ocorrência de corrupção!
Enfim, a participação eficaz e permanente da sociedade e do Poder Legislativo pode assegurar maior correção, justiça social e eficácia das políticas públicas.
Mas há um grave senão. Infelizmente e regra geral, em quase todas as Casas Legislativas, em todos os níveis de governo, o orçamento público é votado tardia e açodadamente.
Normalmente, a culpa é do Poder Executivo que atrasa propositalmente sua remessa ao Poder Legislativo para encurtar o debate público e parlamentar e “forçar-acelerar” sua aprovação.
Por isso, enquanto não houver maior divulgação, esclarecimentos e debate público, bem como clareza e exatidão na execução orçamentária, permanecerá o rótulo pejorativo de “peça de ficção” e “caixa-preta”!

05 dezembro 2008

Pedágios e a contradição cívica

O assunto do momento em nosso amado Rio Grande diz respeito aos pedágios. A existência dos pedágios, é bom lembrar, é conseqüência da falência financeira do Estado e sua já histórica incapacidade de realizar novos investimentos e obras de manutenção.
Porém, o empobrecimento e a incapacidade de atender as demandas públicas e realizar os investimentos necessários em infra-estrutura estão diretamente ligados ao elevadíssimo nível de espoliação tributária exercida pela União.
Daí pergunto: por que essa mobilização político-partidária e essa revolta cidadã relativamente aos pedágios não repercutem do mesmo modo tocante a exploração tributária exercida pela União? É uma evidente contradição comportamental e política!
Deu nos jornais. A Receita Federal anunciou outro recorde de arrecadação. Entre janeiro e outubro de 2008, os brasileiros recolheram R$ 576 bilhões em impostos e tributos federais (sem contar os tributos municipais e estaduais).
Um aumento de 10% em relação ao mesmo período do ano passado. A crise financeira nunca alcança aos cofres do governo!
Significa dizer que o dinheiro que nos falta para estradas está em Brasília, escorrendo pelos ralos governamentais do desperdício e da corrupção disseminada, assentada sobre centenas de estruturas burocráticas e arcaicas!
Parte da resposta por essa contradição está na decadência qualitativa e ideológica da representação político-partidário.
A escravidão do povo e seus espasmos de indignação e revolta não repercutem em Brasília, nem comovem os líderes regionais, apenas preocupados com a pequena política e as intrigas eleitoreiras.
Tratam povo e contribuinte como otários. Não é a toa que discursam sobre o otimismo e a esperança. Puro ilusionismo. O único e deprimente espetáculo é o do crescimento da arrecadação tributária!
Não custa repetir um mantra do cidadão e contribuinte: tributos devem guardar nexo causal e coerência. E não são eternos!
Pedágios não são ruins. Paga quem usa e quando usa. O que está errado é a maioria dos demais tributos, sem eira nem beira!
A sociedade deve, sempre, repensar os tipos de tributos os e adequá-los ao seu tempo, à sua capacidade de pagamento e ao tamanho do estado (União, Estado e Município).
Hoje, mais do que nunca, a sociedade está no seu limite de resistência físico-psicológico-contributiva. Outra e qualquer nação já estaria em situação de desobediência civil!
Até parece que estamos todos amordaçados por alguma circunstância e inevitabilidade poderosa e constrangedora.
Repito o que já disse em outro artigo, provocativamente: somos, de fato, uma nação? será covardia cívica?
Infelizmente, somos escravos tributários e legislativos. Escravos sem amor à liberdade e sem capacidade de indignação!