26 junho 2009

República de Ladrões

Hoje é o Senado Federal. Ontem foi o dinheiro nas cuecas. Amanhã serão a Petrobrás e os fundos de pensão. A sucessão de escândalos permite três óbvias constatações que agravam nosso pessimismo.
Os escândalos são apenas a ponta de um imenso iceberg denominado estado brasileiro, um gigante fora de controle público (1);
predomina o império do “jeitinho” e da omissão, não havendo conseqüências administrativas e penais (2);
o espírito do saque ao dinheiro público é uma epidemia nacional. Nepotismo (emprego de parentes), compadrio, favorecimentos e manipulação licitatória, são comuns em todas as esferas públicas (3).
Aliás, os escândalos e as constatações me fazem lembrar de um comentário (dos eleitores) que muito ouvi ao longo das inúmeras campanhas eleitorais de que participei.
Em tempos de ditadura e abertura democrática, empenhados e otimistas na renovação político-partidária, éramos surpreendidos. Muitos diziam:
“- É tudo igual mesmo. Melhor deixar o cachorro gordo no poder do que colocar um magro. Vai custar caro engordar outro!”
Ouvia triste e a contragosto porque não concordava. Como não concordo até hoje. Mas no olhar e sentir de muitas pessoas do povo a sucessão e a renovação político-partidária é uma simples troca de cachorros. Cachorros atrás do osso!
Voltando mais no tempo e na história, à época da colonização, e depois do fracasso das capitanias hereditárias, o governo português inventou os governadores-gerais. E com eles, a burocracia.
Há registros históricos sobre o desembarque de nobres, funcionários públicos, soldados e criminosos (réus e degredados). Aliás, quase todos solteiros e interessados em grana fácil.
Resultou uma estrutura estatal forte, organizada, centralizadora e burocrática. Que não encontrou resistência civil. Conseqüentemente, nossa sociedade de então se adaptou a esta estrutura estatal.
Trata-se do domínio de uma casta de altos funcionários aliada ao patronato político cujos interesses comuns formam uma associação parasitária.
Juntos compõem uma rede que, espalhada pelo país, extrai dele tudo o que pode (leia mais em Os Donos do Poder (1958), do gaucho Raimundo Faoro (1925-2003).
O fruto principal dessa deformação histórica e dessa adaptação da sociedade é o “jeitinho brasileiro” e o famoso “querer levar vantagem em tudo”.
Nepotismo (emprego de parentes), compadrio, fraudes, falsificações, desrespeito a contratos, entre outros exemplos, são ações e atitudes que não sofrem reprovação moral. Ou então, se descobrirem, “não dá nada!”
De modo que o espírito do saque e o ânimo dominante confirmam a máxima de Aparício Torelly, o popular Barão de Itararé: “Negociata é um bom negócio para o qual não fomos convidados!”
Em verdade, estamos a merecer, como povo e sociedade, um apurado estudo de caráter sociológico sobre nosso caráter e nossa natureza (a) ética.
Ou tudo será, simplesmente, falta de educação, repressão, punição e cadeia?

19 junho 2009

Migrações Humanas

Abertas as urnas, as recentes eleições para o Parlamento Europeu confirmaram o que já se esperava. Um crescimento do nacionalismo e da xenofobia.
Vulgar e politicamente falando, xenofobia é uma rejeição, uma aversão em relação a pessoas, culturas ou raças diferentes, geralmente os estrangeiros.
Ainda que não maioria, e limitado a conquista de algumas cadeiras, os vitoriosos simbólicos foram os partidos de direita e centro-direita que defendem, principalmente, as políticas anti-imigração.
Durante muitos anos a Europa estimulou a vinda de estrangeiros, originários principalmente da América Latina e da África, e direcionados e empregados em atividades menos atraentes - e higiênicas! - do mercado de trabalho.
Mais recentemente, com a criação e a ampliação da Comunidade Européia, a oferta de mão-de-obra está sendo suprida pelos trabalhadores do leste europeu, países mais pobres da atual Europa.
Porém, face o desemprego que castiga duramente a Europa, cresce o sentimento de rejeição aos imigrantes latinos e africanos. Mas cresce também em relação aos trabalhadores vindos do leste europeu.
O problema da discriminação é tão grave que mesmo na unificada Alemanha um alemão originário da Alemanha Oriental sofre o preconceito. Então, que dirá um trabalhador não alemão, um não europeu.
Repito, no centro de todo esse processo de rejeição ao imigrante, ao estrangeiro, está o desemprego. E que atinge os jovens, principalmente.
O Brasil é um grande exportador de mão-de-obra qualificada e pouco qualificada. Os números são impressionantes. Há 250 mil brasileiros no Japão. 65 mil em Portugal. 65 mil na Itália. 45 mil na Suíça. 30 mil no Reino Unido. 20 mil na Bélgica. 350 mil no Paraguai E outros 500 mil nos demais países!
Sem contar os 1.500.000 de brasileiros que vivem nos Estados Unidos, especialmente nas cidades de Nova York, Miami, Houston, Chicago, Boston e São Francisco. Detalhe muito importante: metade desses brasileiros estaria trabalhando ilegalmente.
Mas essa história tem outro lado. Nosso país também recebe muita gente de outros países. A partir da metade do século XIX, o Brasil recebeu milhares de imigrantes vindos da Alemanha, Itália, Japão, Polônia e Portugal, principalmente.
Ultimamente, face os graves problemas político-econômico-financeiros enfrentados pela maioria dos países sul-americanos acontece um movimento migratório de sul-americanos rumo ao Brasil.
Claro que essa movimentação guarda relação com o mencionado endurecimento das regras de imigração nos Estados Unidos e na Europa.
Mas também sinaliza e caracteriza que há um reconhecimento em torno de nosso desenvolvimento econômico, cultural e social.
Sem dúvida, estamos sempre de portas abertas e receptivos. Por exemplo, votado pelo Congresso Nacional, nos próximos dias o presidente Lula vai anistiar 50.000 imigrantes ilegais que estão no Brasil.
Encerro e pergunto: estamos preparados para receber grandes fluxos migratórios internacionais quando também nos enfrentamos graves problemas de desemprego, de déficit de infra-estrutura social e habitacional?

12 junho 2009

REELEIÇÃO, DÉFICIT PÚBLICO E O VIR-A-SER

O direito à reeleição dos governantes é um assunto que suscita as mais variadas defesas e contestações. Mesmo entre os não fanáticos.
Teoricamente, procede a tese de defesa da continuidade administrativa e o direito do governante ter sua administração referendada (ou não) pelos cidadãos.
Claro que uma boa gestão também pode ser aprovada (e reeleita) através da eleição de um dos seus membros administradores ou partidários, sem ser o atual governante, assim evitando o risco e excesso personalista.
Isso tudo teoricamente. Porque não prática a história é outra. Não podemos ignorar a prática política real dos governantes.
Aberta a possibilidade da reeleição não é à toa que são, e foram, inevitáveis e crescentes os escândalos político-econômicos.
Também contrariamente ao direito de reeleição, devemos considerar os habituais e ruins níveis de gerência e eficácia dos negócios públicos e a quase completa ausência de fiscalização popular.
Se ainda pudéssemos contar com o parlamento. Infelizmente, é ineficaz a atuação das Câmaras de Vereadores, das Assembléias Legislativas e do Congresso Nacional, todos de atividades mansas, subservientes, e de pouco exercício essencial, ou seja, naquilo que lhes é essencial: a fiscalização do Poder Executivo.
Objetiva e consequentemente, o que tivemos e teremos, sempre, é uma explosão de gastos públicos, endividamento, e um aviltamento do processo eleitoral, desigual em todos os sentidos.
Inversão de prioridades públicas e gestão marcada pelo fisiologismo, o clientelismo e o interesse eleitoral do prefeito, do governador e do presidente, preocupados, unicamente, com sua reeleição.
Pode-se agregar a estes temores mais um aspecto fundamental, suponho que de natureza ética. Diz respeito à imprensa, aos meios de comunicação, que recebem muito dinheiro de órgãos públicos.
Inevitavelmente, interferirão indiretamente no processo eleitoral tendendo a comunicar “as boas novas administrativas e o ótimo desempenho do prefeito, do governador, do presidente...”, em paralelo ao processo eleitoral e à margem da equidade desejada pela legislação eleitoral.
Irônica e contraditoriamente aos esforços de controle da inflação, redução do déficit orçamentário, enxugamento dos gastos públicos, os candidatos à reeleição colaboram para o agravamento do desequilíbrio das contas públicas.
Falando em outros e objetivos termos, e dando lugar à compreensão acerca das fraquezas humanas e das vocações autoritárias dos grupelhos políticos, entende-se o atual e oportunista movimento queremista. É da natureza da política e dos políticos seu agudo instinto de sobrevivência. Se necessário mudam o comportamento, esquecem as promessas juramentadas, mudam de companheiros, mudam as regras, mudam o que for necessário e de acordo com a perspectiva nova. Afinal, um político raramente é o que tem sido, ou é o que foi ontem, mas é o que pode vir a ser!
Então, por todas as razões éticas, pelos princípios republicanos, e no interesse da boa administração pública, se já é discutível (e ruim) uma reeleição, o que dirá uma segunda reeleição!

05 junho 2009

Capitalismos

Ao longo de sua história, povos e governos experimentam e vivenciam diversas teorias políticas e econômicas, alternando sucessos e fracassos. Reais e ilusórios. Catastróficos, às vezes!
Nos dois extremos mais recentes destas experiências encontramos o capitalismo e o comunismo, teorias ainda em busca de uma síntese.
Esta síntese se imaginava realizada no estado de bem-estar social tipo europeu, o famoso welfare-state. Infelizmente, as alterações geopolíticas na Europa (e no mundo) modificaram dramaticamente aquela realidade, ora submetida a graves desafios e distúrbios sócio-econômicos.
Enquanto não encontramos ou realizamos a boa síntese, nos resta, com ares definitivos, o capitalismo com todos os seus defeitos, sua hipocrisia e cinismo. E com suas virtudes!
No núcleo e motor de tudo, o egoísmo e a busca do lucro, isto que alguns filósofos denominam de inevitabilidade da condição e natureza humana.
Adiadas e não (re)descobertas as utopias da sociedade humana ideal, restam as dificuldades inerentes e o inevitável humor sobre suas contradições e paradoxos. Veja alguns divertidos (e não menos verdadeiros) exemplos nacionais de teoria capitalista:
Capitalismo ideal: Você tem duas vacas. Vende uma e compra um touro. Eles se reproduzem e a economia cresce. Você vende o rebanho e se aposenta rico!
Capitalismo norte-americano: Você tem duas vacas. Vende uma e força a outra a produzir leite de quatro vacas. Fica surpreso quando ela morre.
Capitalismo Alemão: Você tem duas vacas. Elas produzem leite regularmente, segundo padrões de quantidade e horário previamente estabelecido, de forma precisa e lucrativa. Mas o que você queria mesmo era criar porcos!
Capitalismo Chinês: Você tem duas vacas e 300 pessoas tirando leite delas. Você se gaba de ter pleno emprego e alta produtividade. E prende o sujeito que divulgou os números.
Capitalismo Japonês: Você tem duas vacas. Redesenha-as para que tenham um décimo do tamanho de uma vaca normal e produzam 20 vezes mais leite. Depois cria desenhinhos de vacas chamados Vaquimon e os vende para o mundo inteiro.
Capitalismo Suíço: Você tem 500 vacas, mas nenhuma é sua. Você cobra para guardar a vaca dos outros.
Capitalismo Britânico: Você tem duas vacas. As duas são loucas.
Capitalismo Português: Você tem duas vacas. E reclama porque seu rebanho não cresce...
Capitalismo Indiano: Você tem duas vacas. Ai de quem tocar nelas!
Capitalismo Brasileiro: Você tem duas vacas. Uma delas é roubada. O governo cria a CCPV- Contribuição Compulsória pela Posse de Vaca. Um fiscal vem e aplica uma multa, porque embora você tenha recolhido corretamente a CCPV, o valor era pelo número de vacas presumidas e não pelo de vacas reais. A Receita Federal, por meio de dados também presumidos do seu consumo de leite, queijo, casacos e sapatos de couro, presumia que você tivesse 200 vacas. Para se livrar da encrenca, você dá a outra vaca para o fiscal “deixar por isso mesmo”!

02 junho 2009

A Dor de Liane

Estamos ameaçados e acuados. Sentimento real ou psicológico, não importa, é o que todos sentimos. Desconfiança e insegurança.
Em cada transeunte, em cada cidadão que passa, vemos um suspeito, uma ameaça ao nosso bolso e à nossa integridade física. Estamos à beira de um ataque de nervos!
Vejam só nossas casas, pátios e empresas. À porta de entrada, guaritas. Grades, cercas elétricas, cães e vigias. “Bunkers” é o que parecem.
Nossas ruas são imensos corredores gradeados. Verdadeiros alçapões. Quem precisar correr, fugir, buscar socorro em alguma casa ou pátio alheio está perdido.
Não tem por onde entrar, nem por onde sair, nem para onde correr. Presa fácil do bandido da ocasião. Ou presa fácil de um cachorro violento e desgarrado.
Como aconteceu agora com a senhora Liane Anton, em Santa Cruz do Sul(RS), que teve partes do seu corpo dilaceradas pelo ataque e violência de dois pitpulls. Liane está hospitalizada e em estado gravíssimo.
Nesse caso, como em outros tantos, fica evidente a perigosa combinação de nossos medos, dos nossos excessos de proteção e de nossas negligências e imprudências.
É o mesmo caso do pai que tem uma arma em casa, mas não a guarda com a devida cautela e zelo. Quantas tragédias não conhecemos consequência da inabilidade e curiosidade infanto-juvenil.
E com os cães de guarda não é diferente. Ora são os canis impróprios, ora as cercas frágeis e as guias inadequadas.
Mas a maior imprudência, a maior negligência, é a cega confiança que o dono nutre por seu cão, inadequada e soberbamente. Por excesso de afeição e ignorância, muitos donos esquecem que seus “bichinhos” são animais irracionais.
Apesar de todos os estudos, pesquisas e adestramentos, não compreendemos e dominamos plenamente suas reações e seus limites.
O que nos leva a imaginar que o mais singelo bichinho pode ser controlável? E que “linguagem” animal é esta que os donos supõem dominar a ponto de cogitar/controlar/dialogar com seus bichos e suas reações ancestrais e atávicas?
Quanto às feras em destaque, a exemplo de pitbulls, rottweilers e dobermanns, em especial, com um histórico genético complexo e antecedentes de violência, a imprudência e a negligência dos donos dá margem à cogitação de ocorrência de dolo eventual. Caso de polícia e justiça!
Quantas pessoas mais deverão morrer, a exemplo de dezenas de velhos e crianças trucidadas, e outros tantos que restam mutilados e com prejuízos funcionais e estéticos irreversíveis?
Em respeito e diante da imensa dor de Liane, não vou simplificar e discorrer sobre condomínios, parques e ruas que estão tomados de animais e sua urina e fezes.
Seja por razões de higiene pública, seja por razões de segurança das pessoas, não deveria ser assim tão simples e inconseqüente a divisão dos espaços públicos com os animais.
Afinal, na rua, no parque ou na praça, diante da aproximação de um cão, independentemente do seu tamanho, por que deveríamos adivinhar se é manso ou não? Explique isto para uma criança!?