26 fevereiro 2010

Tietagem pró-cubana

Uma das passagens mais comovedoras da história mundial foi a derrubada da ditadura cubana de Fulgêncio Batista (1901-1973), em 1959, realizada por um grupo de jovens idealistas liderados pelo igualmente jovem advogado Fidel Castro (1926).
Fraudadas as expectativas de justiça e igualdade pelos tiranos comunistas europeus, naquele momento o sonho do socialismo se renovava na pequena ilha caribenha, até então lugar de veraneio e exploração comercial norte-americana.
Rapidamente, Fidel e Ernesto (Che) Guevara (1928-1967) se transformaram em ícones mundiais da juventude e das elites intelectuais, ainda traumatizadas pelos efeitos das guerras recentes e a frustração soviética.
Porém, correu o tempo, 50 anos exatamente, e o mundo experimentou diversas mudanças sociais, políticas, econômicas e culturais.
Entre estas mudanças, as mais significativas foram a desconstituição da União Soviética e a queda do Muro de Berlim. O definitivo sepultamento da idéia do partido único e do dirigismo estatal!
Mas em Cuba o tempo parara. Em todos os sentidos. Perpetrara-se uma ditadura personalista e reacionária, a exemplo dos decadentes e decaídos modelos europeus, embora mantido o discurso épico e mobilizador de pretensão socializante.
Descontado o regime e o estilo jurássico, ainda assim persistia, como persiste em alguns meios políticos e intelectuais, notadamente no Brasil, possivelmente à conta da histórica ação revolucionária, uma tolerância com Fidel e seu regime político.
No entanto, a verdade é que faz muito tempo que as ilusões se perderam em meio às atrocidades e abusos cometidos em nome do regime político.
Aliás, não faz muito tempo, haja vista a notícia do fuzilamento de três dissidentes e fugitivos do regime, Cuba e Fidel voltaram às manchetes, perdendo seus últimos simpatizantes. E agora, essa semana, a morte do dissidente Orlando Zapata Tamayo, preso e em greve de fome.
Mas, meses antes, a “pá de cal” do regime já havia sido jogada. Diante da notícia da persistência da enfermidade de Fidel, confirmou-se a transferência definitiva do poder ao seu irmão Raul Castro, seu sucessor natural. Quer dizer, “monárquico e dinástico”.
Pobre povo cubano. Materialmente falta-lhe tudo, mas falta-lhe, ultimamente, a indignação e a rebeldia.
Mas ainda assim não faltam a Fidel a tietagem e as homenagens (?) prestadas por seus súditos – entre os quais inúmeras autoridades brasileiras, repito, que insistem em permanecer algemados ao passado, encurralados por seus sonhos e idealizações juvenis, embora tiranizado o povo cubano por uma ilusão discursiva e uma prática cínica e cruel.
A história mundial ensina: valendo-se dos discursos acerca da paz, da liberdade e da prosperidade, ideais humanos e universais, muitos tiranos se autogestaram.
Como bem ensina o poeta alemão Friedrich Hoelderlin (1770-1843), profeticamente: “o que sempre fez do Estado um verdadeiro inferno na terra foram precisamente as tentativas de transformá-lo num paraíso”!

22 fevereiro 2010

Em memória do meu amigo Aldo Léo Kothe

Amigo daqueles que a gente encontra pessoalmente de meio em meio ano à conta das dificuldades decorrentes com nossas ocupações pessoais.
Mas verdade também que amigos assim como se estivessem sempre por perto. Afinal, a distância e a falta de convivência não medem nem regulam as amizades e as lembranças comuns.
Lá se vão quase trinta anos, estudantes e jovens trabalhadores acampados na capital do Estado dividíamos entre quatro um apartamento de dois quartos.
Embora as aulas noturnas e o trabalho diário que exigia acordar cedo, sempre havia tempo, à noite alta, para uma “bóia” coletiva e bom bate-papo.
E assunto e diversidade não faltavam. Afinal, dois candidatos a engenheiros, o Aldo e o Álvaro Stumm, um a advogado, e o outro ora quase arquiteto, ora quase publicitário. Nunca sabíamos exatamente o que o inquieto e criativo Gerson Tadeu Jacques (Pink) estudava. Nessas alegres ocasiões as madrugadas se tornavam pequenas.
Nas lembranças também os raros (e divertidos) desentendimentos (nunca mais que alguns minutos) à conta do não cumprimento nas escalas de faxina e as “apropriações indébitas” de produtos na geladeira. Quem já morou numa “república de estudantes” bem sabe do que falo.
Lembranças e convivências também dos sábados futebolísticos, à tarde na chácara do “seu” Stumm da Papelaria Koehler. E do bloco de carnaval “Ula-Ula”, embora eu fosse um episódico e bem-aceito “penetra”.
E assim vai o tempo. Namoros, casamentos, esposa, filhos (e já há quem tenha netos), amigos e trabalho. Sinônimos de preocupações e obrigações. É o que chamamos de vida. A gente leva a vida e a vida leva a gente.
Às vezes, alguns de nós enfrentamos dissabores de saúde e sucumbimos mortalmente à conspiração de algumas células malignas ou algumas infecções mal havidas.
É a ordem da natureza. Aleatória, imprevisível e implacável. E nem são os deuses - essa invenção humana que tenta dar sentido aos caos universal - que escolhem e determinam nossos destinos, como rezam seus devotos.
Convivemos e toleramos as células malignas e os batimentos irregulares e assustadores do coração. E mantemos nossa esperança na medicina e na ciência.
Só não gostamos, nem toleramos, ou não deveríamos tolerar (!), quando a ação humana (humana?) inoportuna e indevida intervém e aborta a naturalidade de nossas vidas e convivências.
A ação humana fatídica que em muitos casos se dá por negligência, imperícia e imprudência, como no trânsito, especialmente.
E há aqueles casos ainda mais graves que dizem respeito à qualidade de nossa organização em sociedade. Ou no caso, a falta de qualidade, a desorganização da idéia de comunidade.
Como o que sucedeu com meu calmo e agregador amigo Aldo Léo, vítima de uma razão e ação consciente (consciente?), um desespero alheio cuja origem e motivação ainda não conhecemos, embora possamos supor e imaginar, e que deu impulsos e poderes de morte à mão do homicida.
O Brasil é o campeão mundial de homicídios. Resultado sangrento da combinação de maus indicadores sociais e econômicos, desigualdade de renda, corrupção, acesso fácil a armas de fogo, crescimento do narcotráfico, desestruturação familiar e, principalmente, impunidade.
45 mil brasileiros perdem a vida a cada ano. É número muito maior que as mortes de muitas guerras internacionais.
A propósito de guerras, conflitos e mortes, atribui-se ao ditador soviético Josef Stalin (1878-1953) a seguinte frase: “Uma única morte é uma tragédia; um milhão de mortes é uma estatística!”
Vivemos um cotidiano de impunidades, mortes e velórios. Tão doloroso quanto perder o amigo querido é ver que nós continuamos nos comportando como se nada estivesse acontecendo.
Aceitamos o lero-lero e o ufanismo das autoridades e dos governantes e não reagimos como uma comunidade, como uma nação.
Miserável e passivamente, aceitamos e toleramos que as mortes de pessoas queridas se transformem em números!
Minha tristeza e minha inconformidade cívica em memória do meu amigo Aldo Léo Kothe.

19 fevereiro 2010

Escravos

Dentre os assuntos que mais tenho abordado quero destacar a questão tributária. Tributos são todos os impostos, taxas e contribuições que o cidadão paga diária e abundantemente. Em especial, os tributos federais.
Tutelado pelo imenso e complexo sistema legal e tributário, e sem representação política confiável, inovadora e reivindicativa, a população vê, dia após dia, seu dinheiro escorrendo pelo ralo governamental.
Sai governo, entra governo, ninguém tem sido capaz de articular-se com a sociedade, de enfrentar os focos de desperdício de dinheiro público, de acabar com estruturas burocráticas e arcaicas, e de estabelecer uma relação moderna, eficaz e descentralizada.
Feitos relógio-cuco, governo e políticos discursam de hora-em-hora sobre o otimismo e a esperança. Claro, é inerente a função do político. Assim como ao religioso é professar a fé. Mas é puro ilusionismo.
Embora os anúncios e a propaganda oficial, o único espetáculo do crescimento é o da arrecadação tributária. E do crescimento dos gastos de pessoal.
Claro, sabemos que há várias situações em que se justifica a presença extraordinária dos governos, além dos tradicionais “saúde-educação-segurança”.
Por exemplo, na superação de desigualdades sociais e regionais. Neste sentido, admitem-se a correspondente e necessária arrecadação adicional de tributos, suficientes para o custeio específico.
Legal, institucional e conceitualmente, porém, devemos ter em mente que os impostos devem guardar nexo causal e coerência. Ademais, os impostos não são eternos.
A sociedade deve (tem esse direito e dever!) sempre repensar os tipos de impostos e adequá-los ao seu tempo, à sua capacidade de pagamento e ao tamanho do estado (União, Estado e Município) que necessita.
Atualmente, diante da ineficácia da administração pública, do gigantismo estatal e dos alarmantes níveis de corrupção, repito, atualmente, e mais do que nunca, a sociedade está no seu limite de resistência físico-psicológica-contributiva.
E tocante aos políticos, uma vez que lhes está reservada a competência de mudar as leis e influir nos rumos dos governos e na definição da pauta político-econômica, entre os quais a redução dos tributos e o controle dos gastos públicos, são lastimáveis sua inoperância e omissão.
De modo que nesse quadro de escravidão tributária e legislativa, abusos e corrupção, a que estamos submetidos, qualquer nação já estaria em situação de desobediência civil e greve geral, entre outras reações populares.
Mas o mais chocante é o alastramento e a imensidão do silêncio e da omissão. Não só representantes empresariais e sindicais, mas todos nós, cidadãos, estamos amordaçados por alguma circunstância poderosa e constrangedora. Somos, de fato, uma nação? Será covardia cívica?
Infelizmente, ouso dizer que somos modernos escravos tributários e legislativos. Escravos sem amor à liberdade e sem capacidade de indignação. Talvez não sejamos merecedores da liberdade!

05 fevereiro 2010

S.O.S. Planeta Terra (uma nova civilização?)

A sucessão de catástrofes naturais e as mudanças climáticas em todos os lugares da Terra têm chamado atenção e sido objeto de inúmeras reportagens alarmantes.
Dada à diversidade dos meios de comunicação, principalmente pela instantaneidade e rapidez da internet, qualquer episódio é imediatamente retratado e divulgado mundialmente.
Porém, se voltarmos no tempo, lembraremos que o assunto “meio-ambiente” era um tanto quanto marginal. Tanto na política e na economia quanto na imprensa. Aliás, seus primeiros defensores e debatedores eram chamados de chatos. Ecochatos!
Mas, paulatinamente, essa temática entrou nas conversas e ações de famílias, escolas e governos. Coisas simples, mas importantes, como procedimentos de coleta seletiva de lixo e economia de água e energia.
Motivados pelo marketing, as empresas também incorporaram o tema aos seus processos comerciais e industriais. As ações verdes, os produtos ecológicos e as práticas sustentáveis são os exemplos mais comuns.
Mais recentemente, contribuiu muito na popularização e gravidade do tema “meio-ambiente” a exibição do filme “Uma Verdade Inconveniente”, apresentado pelo ex-vice-presidente norte-americano Al Gore.
Apropriação oportunista, ações midiáticas e de viés comercial ou não, importa reconhecer sua atualidade e importância!
Aliás, sobre manipulações nas informações e nos dados científicos, vários cientistas afirmam, entretanto, que a ação humana, por mais predatória que tenha sido, não é a responsável por essa série de fatos que presenciamos, a exemplo do derretimento de geleiras e icebergs. Ou o aumento do dióxido de carbono, o famoso CO2, responsável pelo efeito estufa.
Afirmam que o planeta periodicamente passa por processos agudos de transformação. São os períodos de aquecimento alternados com os períodos de esfriamento ou glacialização. E as causas estariam no espaço, mais precisamente nas variações das atividades solares!
E em meio a todos esses debates científicos ou não, verdadeiros ou falsos, frutos de estudo ou “chutes”, assistimos também as discussões entre os países.
A recente reunião em Copenhague foi reconhecida como um fracasso. Os países ricos não querem mudar seu comportamento e seu modelo de produção e consumo. Mas gostariam que os países em desenvolvimento o fizessem, de modo a preservar suas florestas e mananciais hídricos e energéticos.
Já os países em desenvolvimento, entre os quais o Brasil, não querem travar seu “progresso”, e acham que a responsabilidade é principalmente dos países ricos e industrialmente desenvolvidos.
Afinal, os países ricos chegaram aonde chegaram graças à devastação do seu meio-ambiente e o esgotamento de suas reservas energéticas. Moral e eticamente, como poderiam exigir algo de outros países que assim (ainda!) não procederam?
Esse é o ponto central. Uma mudança expressiva nos meios de produção e consumo, de modo a contribuir na redução do lixo mundial e dos gases tóxicos, bem como evitar a exaustão dos recursos naturais, diz respeito objetivamente à mudança do sistema capitalista e ao futuro das nações.
Significa e implica achar outro meio de produção, consumo e desenvolvimento material da humanidade. Significa mudar o sentido de nossa civilização.
Representa mudar nosso comportamento pessoal e coletivo, modificar e restringir hábitos e consumos. Sacrifício de uma geração em prol de gerações seguintes.
Verdadeiro e urgente o problema climático planetário, fica uma pergunta: séria e honestamente, seremos capazes de mudar nossa típica ignorância e histórico egoísmo?