26 março 2010

Romaria Envergonhada

O gigantismo do estado brasileiro é evidenciado pelo exagerado número de órgãos, empresas estatais e funcionários públicos. Tudo e todos assentados e garantidos por uma imensa arrecadação e concentração tributária e aparelhamento burocrático.
Desde a promulgação da Constituição de 1988, paulatinamente o governo federal constrói uma ditadura institucional de natureza fiscal e tributária.
A concentração tributária desmoraliza e inviabiliza as promessas constitucionais de descentralização e melhoria dos serviços públicos.
Inevitável e conseqüentemente, o resultado lógico dessa hiperconcentração é um estado perdulário, incompetente e corrupto.
Amparado em extraordinário conjunto de leis, medidas provisórias, decretos e regulamentos. E, claro, no inigualável servilismo parlamentar.
Sem compromisso com as necessidades populares, o servilismo parlamentar têm-se consagrado na composição de maiorias legislativas que são constituídas em rigorosa relação de trocas, benefícios pessoais e regionais, tipo “toma lá, dá cá”.
Além dos deputados e senadores, também vereadores e prefeitos esquecem as promessas feitas na posse de seus mandatos e prosseguem em suas romarias à Brasília e fazer loas ao “rei e sua corte”.
Trocam abraços, promessas de longa vida parlamentar, mimos, fotos (montagens ou não) e “tapinhas” nas costas com as autoridades políticas e burocráticas. Enquanto mendigam migalhas!
É uma relação incestuosa, cínica e hipócrita, que une vereadores, prefeitos, deputados, senadores e ministros, que no Congresso Nacional “matam” seus municípios e estados, e depois vêm, correndo, às bases municipais e estaduais, “chorar” no velório da falta de recursos.
De volta para “casa” e cuidadosos com seus “rebanhos de eleitores”, sobram sorrisos fartos e promessas fáceis que nos contam de uma reforma tributária, obras e serviços e outras maravilhas públicas. Mas só falam!
Fossem lideranças autênticas e politicamente comprometidas, lutariam pela independência tributária de suas comunidades e o alívio nos impostos que o povo paga.
De antemão, já sabemos que não diminuirá o grande e concentrado poder da União, um monumento de desprezo aos ideais republicanos e a independência de estados e municípios.
Afinal, já está provado com centenas de estudos e pesquisas que o governo é um guloso que quer mais, e mais, e sempre mais, e que para satisfação de sua gula e cardápio cria os mais variados argumentos e necessidades. Ainda que falsos!
Uma esperança que eu tenho é que os comerciantes e empresários – que bem entendem de tributos - se dedicassem com mais afinco à denúncia e ao esclarecimento do povo.
Poderiam começar explicando para os próprios clientes, fornecedores e funcionários (e esses para os seus familiares e amigos) o que significam essas siglas todas - existem mais de 100 impostos, taxas e contribuições - e para onde vai o dinheiro.
De modo que no dia em que a maioria das pessoas compreender o significado de cada sigla de tributo e o destino do dinheiro, e souber analisar o comportamento dúbio e omisso das autoridades e dos políticos, talvez a mudança possa começar.
Uma mudança que resulte em obras e serviços públicos dignos e de qualidade. E que o próprio povo fique rico!
Sim, por que hoje apenas o governo é rico. O povo é pobre. E a cada dia que passa, é cada vez mais pobre. E no meio da pobreza generalizada crescem os vales-disso e daquilo. Uma forma barata de comprar a simpatia, o silêncio e a consciência dos pobres, as maiores vítimas da concentração tributária.

20 março 2010

Estado Policial

Essa sucessão de denúncias e escândalos, alguns conseqüência de operações policiais federais, principalmente, tem como fonte comum e principal a escuta telefônica.
Prática fora de controle, já não se trata de quebra de sigilo de investigados. “Pegou geral!” Vasculham cadastros pessoais e monitoram todas as ligações telefônicas. Não há mais comunicação privada!
Não é a toa que há graves divergências no poder judiciário acerca da previsibilidade e amplitude legal para tais condutas investigativas. Afinal, o sigilo ainda é uma das garantias asseguradas pela Constituição.
Policiais e juízes que cometem os “atropelos legais” acreditam que a rapidez é fundamental. E uma forma de acabar com os excessos de “garantismos (uma teoria de constitucionalidade)” em favor de delinqüentes e corruptos.
Essa “liberalidade autoconcedida” tem como risco a perda de controle e foco no que realmente é de interesse público, desvirtuando e submetendo investigações aos interesses corporativos, políticos e partidários.
A cada dia que passa, e a cada operação policial, ficam evidentes os tratamentos diferenciados, o vazamento sistemático de informações e a teatralização midiática.
Sem indiciamento, sem processo e sem julgamento. Tudo em trinta segundos de exposição em rede nacional de televisão. Uma guilhotina virtual de eficácia real!
Pergunto: quando indícios são previamente considerados como verdades, , quando ainda não há processo judicial, nem advogados de defesa (constrangidos ou impedidos), quando há linchamento público, e quando o princípio da inocência é ignorado, para onde caminhamos?
Quando a ação policial contém irregularidades legais e impropriedades jurídicas que transformam o conseqüente processo numa colcha de retalhos - onde “deitam e rolam” os defensores dos acusados, a que(m) servimos?
Quando os acusados acabam impunes por que a polícia “embaralhou” a ordem dos procedimentos, trocou a qualidade e fidelidade processual pela espalhafatosa e cinematográfica operação midiática, o que pretendemos?
A apropriação de serviços públicos, principalmente os policiais e judiciais, para servirem aos interesses políticos, partidários e ideológicos de uma facção não é uma característica do estado policial?
Vamos deixar bem claro que não se trata de defender corruptos e ladrões em geral. Principalmente, esses ladrões de dinheiro público. Eles estão por aí. Em todos os lugares. Quase sempre nas altas rodas sociais, exibindo seus títulos, suas medalhas de mérito e suas demais honrarias.
Trata-se de defender o Estado Democrático de Direito e o império das leis, a independência do serviço público e o não aparelhamento do Estado!
O momento é de gravidade porque proliferam os adeptos da nova ordem e, em contrapartida, cresce a omissão dos que de direito, dever e saber deveriam agir e travar a repetição fatídica da história.
O filósofo alemão Hegel (1770-1831) já dissera que a transformação sumária do suspeito em culpado e sua condenação à morte sem direito de defesa, é uma morte efetuada sob a forma do espetáculo público.

12 março 2010

Verdade e Política(e as fotomontagens)

Entre os vários substantivos que viabilizam a democracia, e outros tantos adjetivos que a caracterizam, uma palavra merece mais atenção e mais zelo de todos nós. Refiro-me a verdade.
A busca da verdade faz parte da essência humana. Em todas as áreas da vida. Mas quando a verdade é fabricada, deixa de ser verdade. Torna-se matéria prima da mentira.
O direito à verdade dos fatos sociais deve ser uma garantia democrática. Mais que uma garantia, deve ser uma virtude pública.
Histórica e secularmente, o exercício do poder tem-se utilizado da mentira e da verdade pré-fabricada. Quando a verdade é manipulada, a mentira surge e aumenta seu poder de simulação e esconderijo de outras verdades.
Nunca é demais, nem tardio, relembrarmos que o regime democrático está concentrado na sociedade e em cada cidadão. E o seu exercício através dos eleitos.
Infelizmente, nosso sistema político representativo se afastou da sociedade. E a nossa participação tem-se limitado ao comparecimento às urnas e a volta para casa. Mansamente.
Dirão que não. Que estou exagerando. Afinal, nunca houve tanta liberdade de ação e opinião. Sim, e daí? Para que serve tudo isso se o que estamos vivenciando é a inversão de valores?
Estamos ou não estamos à margem da atuação das esferas políticas, à mercê dos que estão no exercício das formas de poder? Somos meros expectadores. Não somos participantes. E por que não participamos, por que somos expectadores?
Porque nossa democracia deixou de produzir a verdade e a autenticidade, deixou de cultuar os melhores e essenciais valores.
A verdade e a autenticidade são essenciais na sociedade como fatores de produção de questionamentos e transformações sociais. Geram descobertas, participação e fiscalização. E refutam, com vigor, as imposturas e as imposições.
E o que é o voto, ou deveria ser o voto? Não é, a rigor, o depósito de nossas convicções, de nossas crenças e de nossas verdades nas mãos e consciência dos representantes? Ou dos parlamentares e governantes, como acontece na política?
E o que sucede se isso é frustrado, rotineiramente frustrante e decepcionante? Na medida em que se sobrepõem os interesses individuais, e se desconstrói a verdade, a política perde seu sentido.
Mas o mais significativo e odioso, sim, odioso, é que na medida em que a política perde seu sentido, mas preserva sua institucionalidade, sua exigência social, as meias e falsas verdades, as verdades ocultas e a permanente manipulação “aprisionam” a população.
Isso que chamamos de política, mas que não é a verdadeira política, acaba funcionando como um controle das possibilidades de ação e reação popular.
As falsas, meias e ocultas verdades modificam os fatos e conseqüentemente a própria história. O passado já não podemos mudar. E o futuro resta manipulado.
De um modo ou de outro, a sociedade percebe isso. Sente a manipulação. Sente, vê, mas não reage.
Ao final, a generalizada e hegemônica memória curta popular esquece sua revolta, renova mandatos, repete formulismos e mágicas crenças.
Mas ensina o filosofo de plantão que a mentira e a manipulação são da natureza humana. Estão ao nosso alcance. Assim como a verdade e a liberdade.
Se estão ao nosso alcance tanto a verdade como a liberdade, porque continuamos mentindo para nós mesmos?
Em fevereiro de 2009, no Encontro Nacional dos Prefeitos, em Brasília, cerca de 300 prefeitos abriram seu sorriso e tiraram uma foto ao lado do presidente Lula e da ministra Dilma Rousseff.
Mas o que poderia ter sido um privilégio, um motivo de orgulho pessoal, se tratou, simplesmente de mais um episódio no já famoso “jeitinho brasileiro”. Ao preço de R$30,00 tratava-se de uma fotomontagem instantânea.
Assim, combinados a realidade política e o comportamento humano, o recente fato em torno de uma fotomontagem patrocinada por um veterano vereador de Santa Cruz do Sul não deveria se constituir em tamanha surpresa.

08 março 2010

Pena de Morte

As últimas duas semanas foram de notícias trágicas e muito sofrimento familiar em nossa cidade, Santa Cruz do Sul. O assassinato frio e cruel de duas mulheres e um homem mexeu com os sentimentos da população.
E nessas trágicas ocasiões um assunto sempre volta à tona, sempre retorna aos comentários do povo. A pena de morte!
Sabemos que se for feita uma pesquisa de opinião pública, ou mesmo um plebiscito sobre esse assunto, o voto a favor da pena de morte vencerá por grande diferença. Sem dúvida!
Há várias razões para ser a favor e muitas outras razões para ser contra a pena de morte.
Uma boa razão para ser contra diz respeito ao fato de que a justiça brasileira e o sistema policial ainda não são confiáveis o suficiente para não cometer erros. E assim sendo, o sacrifício de um único inocente não justificaria a adoção da pena de morte.
Também, eu creio que enquanto não resolvermos algumas necessidades básicas de nosso povo, educação e saúde, moradia e trabalho, principalmente, não podemos defender a pena de morte.
São necessidades básicas cuja falta tem levado muitos brasileiros ao desespero e a miséria, e conseqüentemente à criminalidade.
Claro, nem sempre isso é verdade. E mesma uma coisa não justifica a outra. Mas é isso que tem acontecido. E essa é uma das principais razões da criminalidade.
E no meio dessa discussão sobre a pena de morte, alguns equívocos de pensamento e raciocínio se repetem. Por exemplo: muitas pessoas pensam que com a implantação da pena de morte muitos criminosos pensariam duas vezes antes de cometer seus crimes e os assassinatos.
Na verdade, tem ocorrido o contrário. E há pesquisas em diversos países sobre isso. Onde a pena de morte é praticada os índices de criminalidade continuam elevados ou até aumentaram.
Outro pensamento equivocado: embora um tanto quanto inconfesso, há a ocorrência de um sentimento popular de vingança. Olho por olho, dente por dente!
Mas isso significa, isso é como se todos nós nos equiparássemos ao nível dos criminosos. Não creio que seja uma boa idéia.
Aliás, o grande líder e libertador pacifista da Índia, Mahatma Ghandi, já dizia - sobre a vingança - que "olho por um olho acabará por deixar toda a humanidade cega!"
Finalmente, também não devemos esquecer que quando o Estado executa um cidadão, na verdade somos todos nós que estamos erguendo a espada da morte. Apertando o botão que libera a energia da cadeira elétrica. Comprimindo a seringa da injeção mortal. Ou puxando a corda da forca.
E como nós nos sentiríamos quando aparecessem os erros dos processos policiais e judiciais? O que diríamos para as famílias dos inocentes que executamos?
Repito, enquanto não progredirmos na solução de nossos problemas sociais e realizarmos a modernização dos presídios - com a criação de colônias penais onde os presos possam trabalhar, e a melhoria dos sistemas policiais e judiciais, não creio que possamos ser a favor da pena de morte.
E, afinal, concluir também, filosófica e simplesmente, que para deter o mal, não devemos aumentar o mal!