17 dezembro 2010

Governo Tarso Genro: meios e fins

Recentemente, participei de um programa televisivo de debates cujo objeto de discussão era a formação do futuro governo de Tarso Genro, recém eleito governador do Estado.
Nesse artigo, reproduzo alguns conceitos e argumentos que utilizei.
Primeiramente, creio que é um dever ético, um compromisso de otimismo e exercício de esperança desejar sucesso ao novo governante e sua equipe. Se não bastasse essa razão, sobressai-se o fato de ter sido uma vitória contundente e em primeiro turno.
Praticamente montado seu secretariado, percebe-se que há uma evidente opção por secretários de forte experiência e compromisso político, deputados e ex-prefeitos, principalmente, em detrimento de opções de formação técnica.
Evidentemente, a nominata do secretariado é uma conseqüência de uma decisão anterior do futuro governador, qual seja: formar uma ampla maioria parlamentar na Assembléia Legislativa. E a maioria se constituirá de um leque de partidos que foram, obviamente, premiados e recompensados com cargos!
Tarso copia Lula nesse ponto. Faz uma opção pela governabilidade em detrimento de suas declaradas origens e práticas ideológicas. É o pragmatismo vencendo a ideologia.
De imediato, duas constatações, duas viáveis deduções. Essa folgada maioria parlamentar indica que não haverá oposição. E se houver, será mínima, sem força.
O segundo ponto passível de cogitação é o seguinte: a maioria parlamentar será uma garantia de uma “certa paz e tranqüilidade” no exercício governamental, um seguro antiestresse.
E (ou) será uma razão e prenúncio da apresentação e exame de projetos polêmicos - e tensões corporativas - que demandarão maioria estável e sólida para seu enfrentamento.
Outro aspecto que foi objeto de meu comentário e análise diz respeito ao método de preenchimento dos cargos do primeiro e segundo escalão. Tarso defende o que chama de “transversalidade”.
Publicamente, a transversalidade se refere e cogita a ação uniforme e objetiva - intersecretarias – nas ações e projetos em que as pastas interagem. Mas, internamente, a transversalidade também significa a nomeação de membros de diferentes partidos em uma mesma secretaria.
Seria uma forma de provocar a vigilância mútua, a co-responsabilização. Em tese, muito positivo. Na prática, um desastre. Campo fértil para a prática do “fogo-amigo” e a alimentação de intrigas e neuroses partidárias, a cargo dos grupelhos que se apropriam das funções públicas.
Outro ponto que considero de alto risco e inconveniente para os interesses maiores (e financeiros) do Estado é o fato de haver um exagerado número de Secretarias.
Considerando alguns cargos com status de secretário, serão mais de 24 pastas. Aqui Tarso também imita Lula. O Governo Federal tem 37 Ministérios. Um escândalo. Um absurdo.
Secretarias de Estado e Ministérios Federais significam excesso de atividades-meio, repetição de procedimentos e formalismos, engessamento e lentidão nas ações de governo. E o mais grave: a feudalização e a personalização, em função dos objetivos eleitorais do titular e seus próximos.
Num próximo artigo eu prossigo na análise. Ainda há importantes questões a serem abordadas. Finanças públicas, principalmente.

10 dezembro 2010

WikiLeaks versus EUA

Não são dois times da liga norte-americana de basquete. É o nome do mais recente fenômeno da internet mundial. Um terremoto nas relações diplomáticas internacionais. Começou a ciberguerra!
O assunto mundial das últimas semanas tem dois nomes: WikiLeaks e Julian Assange. WikiLeaks é o site que promoveu o “vazamento” de milhares de documentos diplomáticos e militares das grandes potências mundiais, principalmente dos Estados Unidos. E o australiano Julian Assange é seu jovem organizador e mentor intelectual.
Entre os documentos e filmes “vazados” está o vídeo que mostra o bombardeio sofrido por doze inocentes pessoas no Iraque, realizado a partir de um helicóptero de guerra Apache norte-americano. Entre os feridos, duas crianças. E entre os seis mortos, dois repórteres fotográficos da Agência de Notícias Reuters.
Entre no Youtube e digite “collateral murder (versão integral wikileaks)”. Um filme autêntico e dublado de 17 minutos. Uma barbárie. Uma patetice que demonstra o nível que a estupidez humana alcança em meio a uma “guerra”.
Aliás, as periódicas e catastróficas incursões norte-americanas por territórios estrangeiros, a pretexto de “ensinar democracia e proteger a galáxia do mal”, têm causado milhares de mortes, mas sobretudo a morte de inocentes, notadamente crianças e mulheres.
O comportamento norte-americano, sua arrogância, sua soberba, são típicos dos impérios, nações ou povos que em determinado momento histórico sobrepõem-se aos demais pela força de sua economia ou de suas armas, “perpetuando” seu poder, sua influência, até limites insuportáveis.
Logo após o ataque ao World Trade Center-WTC, tratei diversas vezes desta temática atualíssima que é a questão do imperialismo. Haja vista a sofisticação tecnológica e a natureza global das relações sócio-econômicas, nada se compara, em todos os tempos, ao atual estágio do poder norte-americano. Para o bem e para o mal.
Os “abelhudos” diplomáticos e militares esquecem que é uma tradição do direito internacional que cada país resolva seus problemas internos, suas contradições políticas, a permanência ou o fim de suas ditaduras, suas opções sócio-econômicas, etc... Assim como o direito de reação está inscrito na história da humanidade.
Desde ontem, Julian Assange, o fundador do WikiLeaks, está preso em Londres, sob acusação de “crimes sexuais”. Foi denunciado por duas mulheres suecas.
Os crimes: ato sexual sem camisinha com uma delas, enquanto a outra o acusa de ter feito sexo enquanto (ela) dormia. E sem camisinha, também!
É de rolar de rir. Mas é sério. O risco que Julian corre é ser extraditado para os EUA e ser levado a julgamento. Crime contra a segurança nacional. Pena de morte.
Com certeza, isso não acontecerá. Porque o “mundo” sairá em sua defesa. Tirante algumas questões especiais, que podem ser classificadas como de segurança nacional e objeto de processo, a maioria dos documentos “vazados” revelam a patetice, a paranóia, a mediocridade e a incompetência dos corpos diplomáticos e de muitos governantes!

04 dezembro 2010

Rio 40 Graus

Independentemente de nossa torcida pelo sucesso do empreendimento militar, a complexidade e amplitude do problema do narcotráfico não permitem conclusões e expectativas otimistas.
Ocorre que continuam sem resposta questões muito mais importantes que a perseguição e as prisões propriamente ditas. Questões ainda não respondidas pelas autoridades estaduais e federais.
Como entram no país e sobem o morro toneladas e toneladas de droga? Como entram e chegam às mãos dos bandidos milhares de armas leves e pesadas?
E importa não esquecer que por trás do narcotráfico, por trás do negócio das drogas, sucedem-se as mortes. Muitas mortes. Principalmente, a morte de jovens. Sejam os jovens aqueles recrutados e utilizados pelos traficantes, sejam os jovens viciados.
Parênteses. Somos os campeões mundiais em número de homicídios. Embora tenhamos apenas 3% da população mundial, cometemos 13% dos homicídios.
Quarenta e cinco mil pessoas perdem a vida a cada ano. E entre essas mortes destacam-se as que correm à conta do narcotráfico.
Conseqüência de desintegração familiar, desigualdade de renda e trabalho, desemprego e urbanização desordenada. E o narcotráfico a reboque de todos os quesitos!
A desigualdade social e econômica a gente percebe nas questões relativas à moradia, ao saneamento básico, ao emprego e ao transporte público.
E os números não mentem. Oitenta e três milhões de pessoas não são atendidos com pelo menos um destes serviços públicos: água, esgoto, coleta de lixo e energia elétrica.
Estes números têm conexão com os números relativos aos jovens. Trinta milhões têm entre 15 e 24 anos e vivem no meio urbano. Dezessete milhões não estudam. Metade dos desempregados brasileiros é esses jovens.
Conseqüências? Sensação de impotência, descrença na família e na sociedade. Descrença no esforço coletivo, na comunidade e nas autoridades, desrespeito às normas e às regras de convivência. Grave crise de valores e absoluta falta de perspectivas pessoais.
A solução? Bem, a solução outros países já encontraram faz muito tempo. Educação, educação e educação. Oportunidade de trabalho e infra-estrutura residencial.
Mas tudo isso precisa de muito dinheiro. E onde está o dinheiro? O dinheiro corre pelos ralos do desperdício de governos incompetentes e corruptos.
Tudo isso só terá uma solução, um encaminhamento razoável, no dia que enfrentarmos com seriedade duas questões que andam juntas: o tamanho do estado brasileiro e o problema da corrupção. Desde a pequena negociata até a grande maracutaia.

02 dezembro 2010

AeroDilma e os caixeiros-viajantes

Notícias e declarações oficiais recentes informam acerca da intenção governamental em adquirir um novo avião presidencial, com maior autonomia de vôo, aliás, desde já nominado de “aerodilma”.
De modo que está instalada uma nova discussão pública. Não custa recordar que nos debates eleitorais- presidenciais de 2006 já surgira o assunto do super-avião, o ironicamente denominado “aerolula”, então adquirido à custa de muitos milhões.
É claro que o presidente Lula poderia ter encomendado um avião menor e mais barato à Embraer, a exemplo do conhecido e elogiado modelo Legacy. Mas, enfim, são tantos “amigos” na fila de passageiros, e a generosidade estatal deveras sensível, que umas poltronas a mais vêm bem!
Anteriormente, acerca de Fernando Henrique Cardoso também já se fizeram muitas piadas (e intrigas político-partidárias), haja vista que - afirmavam em tom de acusação - permanecia mais tempo em território estrangeiro que nacional. O que Lula também fez. E ampliou a milhagem. Nada como o tempo, dizem meteorologistas e relojoeiros!
Não faz muito tempo, aqui mesmo no torrão gaúcho, face ao “compra-não compra” avião - o “yeda-air”, o neurótico Rio Grande também mergulhara em duelos medievais, em meio aos quais esvanecem as razões e a memória coerente.
De modo que só a política menor e a reles disputa partidária explicam porque as razões de um governante (presidente) não valem para o outro (governador)!
Afinal, serão as razões federais maiores que as razões estaduais? Guardadas as proporções, a natureza e os graus de ação ou omissão governamental não são os mesmos do ponto de vista das tarefas públicas e das expectativas populares?
Ironias e piadas à parte, a verdade é que desde o fim do comunismo, simbolizado pela queda do Muro de Berlin, e a definitiva mundialização da economia e pulverização dos capitais financeiros, os presidentes dos ditos países em desenvolvimento, agora nominados emergentes, entre os quais o brasileiro, viraram caixeiros-viajantes.
Explicando: a internacionalização da economia, a necessidade de “fazer caixa”, ampliar as exportações, vender estatais, privatizar serviços públicos, estabelecer parcerias, são razões suficientes para justificar a necessidade e agilidade nos deslocamentos governamentais.
Ademais, ainda há a necessidade de enfrentar o desemprego, pauta primeira para que a agenda presidencial (e do governador) seja, essencialmente, comercial e internacional. Esta é a realidade mundial desde 1989.
Outro aspecto, não necessariamente secundário, é que esta agenda comercial e internacional, dentro da aparente inevitabilidade histórica que vivenciamos, tem um papel fundamental no processo político e eleitoral interno.
Afinal, ninguém perdoaria o governante nas omissões em torno dos esforços de captação de novos negócios e geração de empregos. É o ônus da ideologia dominante. Fazer o quê? Ou outro mundo será possível?