26 maio 2011

Abusados Privilégios e Direitos Abusados

Os recentes duelos retóricos entre o governador e setores do serviço público de altos salários, a propósito do projeto governamental de aumento de alíquotas previdenciárias, reproduzem uma danação nacional, qual seja: a culpa é sempre dos outros!
E a argumentação das partes piora bastante a questão quando é argüida a dita negativa influência das potências estrangeiras e seus teóricos “da dominação e apropriação alheia”, a exemplo do mencionado FMI e os “Chicago boys”.
Piora igualmente quando ainda se ouve o mofado discurso da “benéfica” intervenção e dominação estatal, ainda que arejado com os sonhos juvenis de justiça social e distribuição de renda.
Cantilenas repetidas e antigas que a história nacional e internacional já provou em contrário. No nosso caso, ilustradas com a indiscutível espoliação tributária e a incompetência estatal. Entretanto, danem-se os fatos!
Irônica e contraditoriamente, a mesma e legítima autoridade que agora quer “reformar” algumas leis (com razão e antes-tarde-do-que-nunca), meses antes patrocinara fantástica criação e acomodação de cargos comissionados, conscientemente ignorando a indisponibilidade econômica e financeira do estado!
Entrementes, ainda não se (ou)viu nada sobre contenção de gastos e abusos no setor público, a exemplo de gastos incontroláveis, excesso de órgãos e secretarias, propaganda e publicidade de monopólios estatais e atividades-meio, etc e etc...
De outra parte, a intransigência corporativa daqueles que se julgam abençoados em sua vocação e destinação social (se assim não é, assim sugere a reação!), eis que assegurados pela generosidade e perenidade das leis que lhes convém.
Ainda que saibamos que não há perenidade legal, nem social. Como se o direito adquirido não fosse adquirido apenas até o dia de hoje. Como se novas ordens sociais não possam ser instituídas a partir de amanhã, legal e legitimamente.
No fundo, o núcleo da atual discussão diz respeito a um antigo e insuperável problema nacional de extrema gravidade, disseminado em todo o território nacional, em todas as representações da organização estatal. É a “captura do estado”!
“Captura”, assim entre aspas, significa, politicamente, e na administração pública, principalmente, a subordinação, a submissão, o “seqüestro” da coisa pública, da função de estado, do poder de estado, do órgão de estado, aos interesses corporativos e privados. E, agora, nos últimos anos, agravado e com mais vigor, ousadia e método, uma captura pró-partido político.
A prática da “captura” se opera num campo de ação e representação, numa faixa de atuação onde legalidade e legitimidade, concomitantes ou não, podem autorizar e viabilizar a respectiva ação. Ainda que - a seu tempo e circunstância - imoral e não ética!
Enfim, é a tomada do poder político nas diversas esferas públicas e sua transformação em valor econômico privado. De lei e constituição na mão, travestem o antigo e sofisticam a apropriação do Estado!

18 maio 2011

Gutenberg redivivo

Não há um só dia em que não surja um novo escândalo. Seja no Brasil, seja em outras partes do mundo. E o que significa isso? Que todos enlouqueceram? Ou que todas as virtudes estão se evaporando?
Na verdade, não há nada de novo no mundo das virtudes e dos escândalos. Violência e escândalos sempre existiram, assim como a corrupção e acidentes naturais. Mas então, qual a novidade?
A novidade se chama internet. A novidade se chama telefone celular. A novidade é um aparelhamento tecnológico por indivíduos como nunca houve antes no mundo.
O atual telefone celular é um poderoso gravador e uma câmera de vídeo. Nada lhe escapa. E a internet é o meio de propagação das imagens, dos sons e dos textos. E salve-se quem puder!
Objetiva e principalmente, a internet é um fenômeno de desintermediação. É o meio de divulgação da informação e da notícia sem intermediários. Verdadeiras ou mentirosas informações, não importa.
É o fenômeno da comunicação entre os indivíduos e os grupos sociais sem a participação de meios de comunicação, de partidos políticos, de governos e de sindicatos, por exemplo. Esses meios vêm depois. Ou seja, foram ultrapassados pela tecnologia e pelas pessoas.
Há um novo poder na sociedade. O poder da comunicação instantânea e global. Para o bem e para o mal, repito. E já faz algum tempo que isso ocorre, mas poucos se adaptaram.
Os estudiosos do fenômeno já disseram que a internet cria um mundo sem hierarquias. Coitado de nós, historicamente acostumados à influência das instituições como os governos, os partidos políticos, os jornais e as igrejas.
De modo que precisamos todos nos reencontrar, nos identificar e nos organizar dentro desse mundo em que não há regras. Um mundo em que todos mandam e ninguém obedece.
Não é a toa que os partidos políticos estão desesperados e desorganizados. Não é a toa que as igrejas também estão preocupadas com a escassez de seus rebanhos de fiéis.
Do mesmo modo que os meios de comunicação como a televisão, o rádio e os jornais estão procurando soluções para manter sua histórica influência e, principalmente, seu faturamento.
É claro que não deixarão de existir. Mas deverão se adequar para sobreviverem e serem ouvidos. Embora ninguém saiba exatamente para onde estamos indo.
O caos é total. Informações úteis e inúteis, tudo ocupa o mesmo nível. Não há hierarquia. O mundo digital é plano.
Assim como o alemão Gutenberg (1398-1468), com seus tipos e prensa móvel, revolucionou e democratizou o acesso ao saber, a internet (e o celular) fez o mesmo em escala global. Igualitária e caoticamente!

14 maio 2011

O Escorpião

A arrogância e soberba norte-americana são típicas de nações que em determinado momento histórico sobrepõem-se às demais pela força de sua economia ou de suas armas, “perpetuando” seu poder e sua influência até limites insuportáveis.
É o imperialismo. É o estabelecimento da soberania política de uma nação sobre povos e territórios estrangeiros.
Uma influência dominadora, preponderância, domínio político de expansão e domínio territorial e/ou econômico de uma nação sobre as outras, ensina o dicionário Aurélio.
Alguns pensadores julgam superado o debate em torno do imperialismo e sua significação dado o atual caráter da globalização e seus efeitos gerais e colaterais.
Porém, comparativamente aos exemplos do passado e haja vista a sofisticação tecnológica e a natureza global das atuais relações sócio-econômicas, nada se compara, em todos os tempos, ao atual estágio do poder norte-americano. Para o bem e para o mal.
Há uma vasta relação de ações norte-americanas contrárias aos interesses das demais nações relacionadas a tratados, acordos, convenções e pactos de interesse mundial. Alguns de natureza antibélica.
Não é a toa que abandonaram o tratado que previa o controle desarmamentista. Assim como não abriram as suas instalações de fabricação de armas químicas e biológicas.
Lembram a impaciência norte-americana com os representantes da ONU encarregados de fiscalizar o armamento iraquiano, o que resultou novamente em desrespeito às convenções internacionais?
Ou dos argumentos fraudados (por Bush) para garantir a aprovação legislativa e justificativa popular para atacar o Iraque e o Afeganistão?
Entre as várias cenas do filme “Tiros em Columbine”, do cineasta norte-americano Michael Moore, chamam atenção as imagens de várias invasões de territórios estrangeiros pelos norte-americanos nos últimos cem anos.
Aliás, no mesmo filme também há o registro das imagens de Saddan Hussein, Bin Laden e Noriega, à época “amigos” e armados pelo americanos. Depois descartáveis!
Atualmente, todos esses discursos e essas ações seriam a pretexto de tornar o mundo melhor, mais pacífico e mais democrático. Será?
Nestas horas, é bom lembrar-se dos poetas. George Bernard Shaw (1856-1950), Prêmio Nobel de Literatura (1925), disse: “toda esta luta e porfia para tornar o mundo melhor constitui um grande engano, não porque não seja uma boa coisa melhorar o mundo, se soubermos como fazê-lo, mas porque porfiar e lutar é a pior maneira que poderíamos escolher para fazer alguma coisa.” (1886).
E no fim de tudo, o que explica o imperialismo é uma pequena história, qual seja: Para atravessar o lago, o Escorpião pediu carona para o Sapo. O Sapo, desconfiado, perguntou se não seria picado. O Escorpião respondeu que não, que não era louco, pois isto representaria a própria morte. O Sapo acreditou no argumento do Escorpião. E deu a carona. No meio do imenso lago, o Escorpião picou o Sapo. O Sapo, surpreso, volta-se e diz para o Escorpião:
- Mas você prometeu que não me picaria, pois isto significa também a sua própria morte.”
- Desculpa, é da minha natureza!, disse o escorpião.

04 maio 2011

Osama: o lado B

Logo após a tragédia das torres gêmeas nova-iorquinas, muita gente, mesmo dentro dos Estados Unidos, alimentou a esperança e a utopia de que norte-americanos - nação e autoridades, melhor compreendessem seus exageros intervencionistas e agissem em sua contenção e moderação.
Mera e ingênua ilusão. O nível e a intensidade da ação e participação americana nos negócios mundiais, com repercussões econômicas e sócio-culturais, não permitem imaginar-se a viabilidade desta esperança.
Os EUA constituem-se no grande império econômico-bélico, sem precedentes na história do mundo, e não haverá de sensibilizar-se com crises de identidades de outros povos, notadamente àqueles subordinados e dependentes.
Isto significa que se dispõe a pagar o preço e o custo da hegemonia, inclusive com vidas humanas, próprias ou de outras nações.
Então, dada sua natureza intervencionista, não se limitará às suas expostas razões de combate ao terror, mas permite deduzir que haverá uma nova e forte redefinição dos papéis globais, dos territórios de dominação e da qualidade e natureza intervencionista.
O pós-guerra fria determinou aos demais países a inevitável (e seja o que Deus quiser!) convivência com uma superpotência remanescente.
Irônica e cinicamente, os EUA realizam um discurso pretensamente pacifista e universalista, e utopicamente distribuidor de progresso e renda, concomitantemente com as diárias práticas intervencionistas de natureza econômica e militar, com visíveis interesses no controle dos recursos naturais e tutela política de países periféricos, a exemplo do Oriente Médio!
O que sucede, objetivamente, é que toda nação com pretensões imperialistas se sujeita a antipatia dos “conquistados e dominados”.
Além disso, o moderno imperialismo também se impõe pela produção e distribuição dos produtos de comunicação de massa, suficientes para o estabelecimento e predomínio cultural de um meio ou modo de vida, no caso estrangeiro, resultando na perda da auto-estima dos nativos e na desfiguração da identidade nacional, entre outros pontos relevantes.
Mais recentemente, com o extremo desenvolvimento e alcance da parafernália eletrônica midiática e a abertura plena dos mercados econômicos, tais diferenças entre os povos tornaram-se flagrantes e de conseqüências imprevisíveis.
Esta experiência contraditória, o interregno entre a decadência – ou seria subjugação? - dos valores sociais e culturais de uma nação e a assimilação/sobreposição de modelos e valores estrangeiros, é comum na história da humanidade, mas revela-se particular e excepcionalmente dramática, nos dias de hoje, dada a instantaneidade das comunicações e ocorrências.

02 maio 2011

O Caso dos Treze Tênis

Jocosa e ironicamente, muito repercutiu na imprensa, principalmente na internet, o pedido de abertura de licitação no estado para a compra de treze pênis de borracha. Sim, eu disse pênis de borracha!
O pedido encaminhado à Central de Compras do Estado do Rio Grande do Sul partiu da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo, também denominada FASE, outrora conhecida como FEBEM. O azarado número e a quantidade de pênis correspondem ao número de unidades de atendimento da FASE.
A entidade tem como “clientela” menores infratores de todas as idades e responsáveis por crimes variados, de menor ou maior intensidade e dolo, a exemplo de agressões, assaltos, mortes, tráfico e consumo de drogas.
A informação sobre a referida compra estatal foi originariamente veiculada pelo colunista Wanderley Soares e publicada na edição do dia 12 de abril no jornal O Sul (Porto Alegre).
Ato contínuo, a notícia se espalhou nos meios de comunicação e foi objeto de inúmeras ironias, piadas e trocadilhos. Sem prejuízo também de sérios e honestos questionamentos.
Acossada, a entidade oficial esclareceu que a compra dos pênis se destina a auxiliar os profissionais de saúde nas consultas e nas aulas de educação sexual.
Principalmente, aulas e atividades de grupos voltadas à prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, métodos contraceptivos, ações de higiene, autocuidado, paternidade consciente e gravidez na adolescência. Aulas de ressocialização, mais precisamente!
Consta que a aquisição foi realizada e concretizada ao custo total de R$ 626,00, com dispensa de licitação. O modelo comprado teria 15 cm e pesaria 185 gramas.
Obviamente, ocorreram diversos questionamentos, tanto do jornalista em questão quanto daqueles que “correram” na internet e nos jornais. Questionamentos cômicos, irônicos ou sérios, mas não menos verdadeiros!
Alguns. O modelo pedagógico de educação sexual e a respectiva compra do objeto podem se estender ampliadamente às escolas de ensino fundamental e médio, o que demandaria um orçamento mais expressivo para as próximas compras.
Ou então, admitida sua utilidade (a do pênis) na educação sexual, não seria o caso de comprar, e na mesma proporção, as vaginas de borracha correspondentes, dentro de uma perspectiva de “sexo normal e tradicional”, ainda que possa parecer politicamente incorreto.
E do ponto de vista administrativo, da responsabilidade pública e da guarda de bens do Estado, o eventual desaparecimento de um pênis demandará, com certeza, a abertura de uma sindicância.
Afinal, nunca se sabe!