29 junho 2011

Um brasileiro chamado Miguel

Muito antes de me dedicar aos estudos do direito e da economia, “saboreava” intensamente livros e filmes sobre ficção cientifica. Curiosidade, gosto e prazer que mantenho até os dias de hoje.
E essa foi a motivação e razão principal para estar às dezenove horas de segunda-feira (naquele frio imenso) sentado na primeira fila de cadeiras do anfiteatro da UFRGS para assistir a palestra do brasileiro Miguel Nicolelis. E obter o autógrafo no seu último livro: “Muito além do nosso eu” (Companhia das Letras).
Formado em medicina e especializado em fisiologia e neuroengenharia, Nicolelis é um dos pesquisadores brasileiros de maior prestígio internacional, devido aos seus estudos sobre interface cérebro-máquina.
Seu trabalho e suas descobertas aparecem na lista das dez tecnologias que deverão mudar o mundo, de acordo com o Instituto de Tecnologia de Massachusetts-MIT (EUA).
É o primeiro brasileiro a merecer uma capa da revista Science (fundada em 1880!), a mais prestigiada publicação científica do mundo, com tiragem de 130 mil exemplares.
Durante uma hora falou e demonstrou suas principais pesquisas, cujas aplicações serão na medicina com novos métodos de reabilitação neurológica. Objetivamente, sobre o desenvolvimento e utilização de exoesqueleto, já em desenvolvimento na Alemanha.
Exoesqueleto, ou esqueleto externo, é um dispositivo mecânico que dará sustentação ao corpo de uma pessoa paralisada e que é capaz de mover-se obedecendo ao controle da mente.
Nicolelis também falou sobre as expectativas tocante às próximas décadas (o que denomina de médio prazo). Afirma que não usaremos mais teclados, monitores, mouse, etc… O computador convencional deixará de existir. Iremos submergir em sistemas virtuais, com os quais nos comunicaremos diretamente.
Afirma que a internet como conhecemos vai desaparecer. Usaremos uma rede cerebral. Não é a toa que empresas como o Google, Intel e Microsoft já tem suas divisões de interface cérebro-máquina.
E no próximo século (que Nicollelis denomina de longo prazo), o corpo deixará de ser o fator limitante da nossa ação. Nossa mente poderá atuar com máquinas que estão à distância. E comandar e operar dispositivos tanto de proporções nanométricas quanto gigantescas. Seja uma nave espacial ou uma ferramenta que penetra no espaço entre duas células.
Tudo isso começou quando conectaram eletrodos de dois milímetros e meio dentro do cérebro de um macaco. Mais precisamente em cinqüenta neurônios (aleatoriamente).
Dessa experiência inicial resultou a construção do primeiro centro de neuroengenharia do mundo na Universidade Duke (Carolina do Norte-EUA), onde o brasileiro Miguel atua. Hoje já ha iniciativas similares no Japão, na Suíça. E no Brasil!
Vários testes e experimentos depois, o macaco já movimentava um braço mecânico como se fosse o seu próprio.
Atualmente já conseguem conectar cerca de 600 neurônios. Nos próximos dois anos, chegarão a 60 mil neurônios graças a uma inovadora tecnologia de eletrodos tridimensionais.
No longuíssimo prazo (vários séculos), a integração entre cérebro e máquinas vai influenciar e acelerar a evolução humana. Um futuro em que a mente assumirá o controle, o alcance e todo o potencial de ação humana na natureza.
Ao final da apresentação, e depois de breves palavras com o palestrante, obtive meu autógrafo. Saí satisfeito, menos ignorante e mais otimista.
Afinal, no meio de tantos e renovados escândalos e bandalheiras nacionais, um deserto de líderes e homens virtuosos, o relato e a experiência de Miguel foi como uma salvadora gota d’água!

24 junho 2011

Ação e Ilusão Virtual

Desde a revolta popular nos países árabes - ainda em curso - intensificou-se o debate em torno da capacidade de mobilização e ação político-social via internet, mais precisamente através das redes sociais, a exemplo do Facebook e do Twitter, bem como as imagens do YouTube.
Seria um novo poder, uma forma de poder invisível, de ação e reação quase instantânea. Uma forma de ação que transcende as limitações geográficas e que pode ser deflagrada a partir de um ponto distante, periférico e politicamente insignificante.
E mais significativo ainda é o fato de que a ação pode ser realizada de forma anônima e sem medo de represálias.
Resumindo, seriam as vantagens tecnológicas a serviço da democratização do conhecimento e do poder. Ou da fragmentação e contenção dos abusos de poder.
Ainda que desarticuladamente, seriam os indivíduos superando os grupos tradicionais de representação e participação. Sem manuais de conduta, sem gurus, sem hierarquias e sem regulamentos.
Claro que de parte dos mais notórios acossados e acusados também há reações. Alvos tradicionais, políticos, partidos e governos também montam suas estratégias de comunicação, informação e contra-informação.
O poder clássico de Estado – financeiro, judicial e fiscal, principalmente, ficou em segundo plano. O núcleo está na comunicação. No poder de incutir pensamentos e convicções. No poder de reforçar conceitos e preconceitos. No poder de incutir medos e temores.
A política, em particular e regra geral, é especialista em contra-informação, em “destruição” de personagens e personalidades, em abalos de confiança. Como se diria no futebol amador e de várzea: “do pescoço para baixo vale tudo!”
Conseqüentemente, esse intenso processo de participação, agitação, confusão, informação e contra-informação gera um volumoso, variado e caótico painel.
Não é a toa que se sucedem os escândalos de toda ordem. Também não é toa que beiramos – se é que já não atingimos o fundo do poço – a completa desmoralização das representações clássicas.
É o excesso de tudo gerando a fadiga e o cansaço. Gerando a desmoralização de tudo. Gerando a o desprestígio como regra.
Mas, em verdade, tudo isso já estava por aí, desde sempre, ainda que sob outras roupagens. A novidade são as novas mídias, os novos e intensos meios de comunicação e divulgação.
Então, a regra não é mais o silêncio e a máscara. A regra, agora, a partir do saber e do conhecer, é a indignação e o caos. A regra é não ter regras!
Mas, sempre há um "mas", a pergunta essencial é a seguinte: do ponto de vista do interesse público, haverá revolução, mudança de práticas e hábitos a partir de ações sem regras e sem hierarquia, sem planejamento e sem método?
Ou tudo não passa e passará de uma ilusória e virtual sensação de ação e participação?

15 junho 2011

Caso Battisti: diplomacia dos devaneios ideológicos

Retomo o assunto Cesare Battisti e sua não extradição. Neste momento, não há como não lembrar dezenas de filmes estrangeiros que têm cenas e diálogos que fazem referência à hipótese de fuga para o Brasil.
Historicamente, havia, e ainda há, inúmeras razões para escolher o Brasil como refúgio. Corrupção, informalidade da economia e facilidade para fugir e fazer a “lavagem” de dinheiro.
Mas a razão principal seria, ou ainda é, a fama de que nossa polícia não prende, a justiça não pune e o processo judicial é lento e frágil!
Façamos um parêntese aqui: a Polícia Federal afirma que essa fama é coisa do passado. Hoje teríamos um expressivo índice de prisões e extradições. O Brasil não seria mais o refúgio e paraíso de ladrões e bandidos internacionais.
Bem, estatisticamente até pode não ser mais o paraíso dos bandidos. Porém, os fatos da semana passada permitiram que o mundo assim pensasse. Assim como a absoluta maioria dos brasileiros.
Relembremos. Preso pela Polícia Federal, Battisti teve concedido o pedido de refúgio pelo ex-ministro da Justiça e agora governador Tarso Genro. Uma decisão contrária ao Tratado Brasil-Itália.
Mas admita-se, em tese, que naquele momento o Ministro da Justiça fizesse o que fez e com razão. Ou por suas prováveis e próprias razões ideológicas!
Entretanto, e logo após, uma vez demandado o Supremo Tribunal Federal – que decidiu que era um crime comum! - Lula deveria ter acatado a orientação judicial.
Aqui cabe um esclarecimento. O Supremo enviou para decisão de Lula por se tratar de um tratado entre nações. Regra geral, tratados são gerenciados pelo Poder Executivo, na pessoa do Presidente e Chefe de Estado.
Respeitáveis tratadistas e pensadores do direito afirmam que se não é crime político, não cabe o asilo. E se é crime político, pode o presidente (talvez) extraditar ou não. Há até uma síntese jurídica famosa: “Se não, não. Se sim, talvez!”
Talvez influenciado pelo ministro Tarso, Lula tenha sido induzido a erro. E errou três vezes numa única decisão. Não respeitou o tratado, ignorou a deliberação de nosso maior tribunal e de várias instâncias judiciárias italianas e européias.
Há quem aumente o rol de infrações cometidas pelo Brasil incluindo o Tratado sobre Cooperação Judiciária em Matéria Penal e o Tratado Relativo à Cooperação Judiciária e ao Reconhecimento e Execução de Sentenças em Matéria Civil.
Finalmente, semana passada, como que acometido pelo estado geral de ignorância e soberba, também o STF – que acertara antes, repito – incorreu em erro, rescindindo decisão anterior e gerando grave precedente.
Acompanhei todo o julgamento. Os magistrados pareciam mais preocupados em dar “o troco” em alguns italianos que falaram bobagens. Ou, então, invocando a soberania nacional.
Claro que não se faziam as mesmas perguntas e afirmativas em relação à soberania italiana de reclamar pela extradição daquele que julgaram um criminoso comum.
Não esqueçamos que há consenso na Itália e na Europa. O parlamento italiano aprovou o pedido de extradição por unanimidade. 413 deputados votaram. Somente a extrema esquerda se absteve. Absteve-se!
Também o Tribunal Europeu de Direitos Humanos declarou por unanimidade, em dezembro de 2006, que as decisões dos tribunais italianos foram tomadas em conformidade com os princípios do devido processo legal.
Uma sucessão de erros à conta de devaneios ideológicos juvenis de algumas autoridades brasileiras. E que com seus erros reafirmaram nossa sina de eterno e sonhado paraíso tropical de bandidos e ladrões.

08 junho 2011

PaloXXi

O ministro Palocci pediu demissão. É o mínimo que lhe resta. É o mínimo que resta ao governo. Mas não foi surpresa. O sinal foi o arquivamento da ação contra Palocci pela Procuradoria Geral da República.
O procurador-geral Roberto Gurgel foi indicado por Lula e deverá ser reconduzido ao cargo por Dilma, nos próximos dias. Mera coincidência!
Entre uma mordaça e outra, o silêncio presidencial acerca desse escandaloso assunto permite inferir e deduzir, dada a relevância e ascendência de Palocci nas estruturas e entranhas do poder federal - e no próprio PT, de que realmente estivesse o tempo todo a serviço do partido.
Importante não esquecer que foi o coordenador da campanha presidencial e líder mais próximo de Dilma. O silêncio de Dilma, Lula e do PT em relação a esse escândalo não são diferentes do comportamento adotado por ocasião de outros escândalos, com destaque ao "mensalão".
Não é a toa que a maioria das pessoas envolvidas está "retornando" ao partido, alguns até festejadamente. Hipocrisia total. Nunca tinham saído. Tudo muito simples: estavam a serviço do partido.
E o que difere esse escândalo dentre outros tantos que vivenciamos periodicamente, seja quem fosse o governo, a exemplo dos governos de Sarney, FHC, Lula e Dilma?
Em comum a esperteza e a "cara-dura" de algumas pessoas que realizam tráfico de influência e troca de favores. Em comum a implacável e crescente espoliação e concentração tributária.
Em comum o abuso de poder, a incompetência e o desperdício acintoso de dinheiro público. Em comum mais uma meia-dúzia de escândalos menores, mas não menos desmoralizantes.
Mas repito a pergunta: o que difere os escândalos e os governos? Relativamente ao governo Lula e o agora governo Dilma, a diferença essencial entre os mencionados governos está na capacidade e organização da cooptação de parcelas da sociedade civil organizada, do movimento estudantil e, principalmente, dos sindicatos e suas centrais, vergonhosamente silenciosos e deliberadamente omissos. E nem vou me referir ao decadente Congresso Nacional, com certeza no fundo do poço.
Compreendo o constrangimento de muitas pessoas. Política e historicamente engajadas. Mas deve haver um limite para nossas paixões partidárias, nossas idealizações, um limite para os fanatismos e a cegueira.
Há valores sociais e éticos que não precisam de explicações e justificativas. Valores que se impõem naturalmente. Entretanto, tudo parece amordaçado. Um silêncio metódico provoca a desconstrução da razão e da razoabilidade.
Também deveria estar falando e escrevendo sobre o "kit-homofobia" - a inédita propaganda de um governo sobre a natureza das opções sexuais pessoais - que Dilma mandou arquivar, não por convicção, mas por "chantagem" da bancada evangélica.
Também deveria estar falando e escrevendo sobre "os livros dos erros de português e matemática", à custa de milhões e milhões de reais desperdiçados no Ministério da (des)Educação. O Ministério das Trapalhadas.
Porém, falar ou escrever sobre tudo isso, ou sobre o "caso PaloXXi" - sim, com dois XX, depois que multiplicou por vinte seu patrimônio pessoal - é perda de tempo. Afinal, tudo está sob controle. Ou não?

01 junho 2011

Modo de Vista

Sobre o Parque da Oktoberfest em Santa Cruz do Sul (RS)

Um desses “bigbróderes”, não lembro seu nome - afinal, são todos iguais, não?, costumava dizer “modo de vista” quando dava sua opinião sobre algum assunto, circunstância que comumente denominamos de “ponto de vista”.
Objetiva e geograficamente, um ponto de vista, um olhar direcionado a determinado ponto natural ou construído, uma perspectiva sobre um lugar qualquer, será sempre diferente de um outro olhar, já que duas pessoas não ocupam o mesmo espaço físico.
Se sobre uma certeza geográfica não estabelecemos concordância, o que dizer, então, sobre questões de repercussão política, econômica, estética e cultural, entre outras?
E agravam-se nossas dúvidas e as diferenças de opinião e percepção quando mesmo questões geográficas naturais e construídas adquirem dimensão política, econômica, estética e cultural, ao mesmo tempo.
Outro dia, nosso jornal Gazeta do Sul divulgou notícia sobre a mobilização e os esforços político-sociais santa-cruzenses para obter a cessão de uso (ou doação) da área central do DAER, com o objetivo de ali construir um Centro de Eventos.
Há unanimidade sobre a oportunidade, necessidade e utilidade de um investimento dessa natureza.
Entre os vários argumentos elencados havia um que fazia menção a proximidade com o Parque da Oktoberfest, com certeza pensando na própria festa de outubro, a festa da alegria e do chope, mais precisamente.
É sobre o Parque da Oktoberfest que quero dar meu ponto de vista, expor minha percepção geográfica, social, estética e cultural, apresentar meu “modo de vista”!
Historicamente, trata-se de uma área fraturada, seccionada e extirpada, lentamente utilizada para as mais variadas e contraditórias destinações. Um “carnaval” de edificações e fins.
Pois bem, fosse eu o governante trataria de “fazer uma limpa na área”, desocupação geral, retirada de todas as edificações, transformando toda a área numa imensa reserva florestal, um parque com algumas instalações esportivas, entre elas o ginásio.
Um parque reflorestado e central para o povo usar, a exemplo de uma “Redenção, Parcão e Marinha do Brasil”, para ficar nos exemplos de Porto Alegre.
Mas alguém dirá, e onde realizar a Oktoberfest e construir o Centro de Eventos? Bem, a Prefeitura deixou de comprar a área da Souza Cruz. Mas, com certeza, há outras áreas e soluções possíveis na cidade.
Santa Cruz do Sul é hoje uma cidade com milhares de pessoas morando em apartamentos. Uma tendência que só vai crescer. Além disso, freqüentar parques e praças também é um saudável estilo de vida. Precisa dizer mais?
É o meu modo de vista!