30 janeiro 2013

Somos Todos Culpados

Tragédias não são exclusividade brasileira. Sucedem-se em todas as nações. Salvo episódicas ações incontroláveis da natureza, quase sempre têm na ação e omissão humana seu efeito disparador. Nos últimos anos, dada a massiva e sofisticada utilização da tecnologia, também são freqüentes os acidentes que decorrem de falhas técnicas dos equipamentos, independentemente da operacional intervenção ou omissão das pessoas. Tocante aos incidentes nacionais, principalmente, nos episódios de ação e omissão, seja na determinação da causa ou nas (falta de) ações de remediação das primeiras conseqüências, sempre se sobressaem os piores frutos de nossa aversão ao método: a incompetência e a negligência. É necessário recordar fatos? Os mais velhos lembram o naufrágio da lancha Bateau Mouche e o desabamento do prédio de Sérgio Naya. Mais recentemente, a catastrófica aterrissagem do vôo da TAM no aeroporto “alagado” de Congonhas, o incêndio na creche de Uruguaiana, o mergulho na barragem do ônibus escolar de Erechim. Substitua todas as previsíveis reticências e etecéteras por suas próprias lembranças de outros fatos trágicos. A incompetência e a negligência são irmãs siamesas. Imprudência, incapacidade, inabilidade, inaptidão e não idoneidade na concretização de determinada obra ou tarefa faz, em algum momento, toda a diferença. Negativamente. Regra geral, reagimos irônica e jocosamente àqueles que nos pedem cuidados preventivos, ações e controles predeterminados. Afinal, método e previsibilidade são monótonos, repetitivos e cansativos. Não rimam com nossa criatividade e não combinam com nossa espontaneidade. Criatividade e espontaneidade são os nomes charmosos e artísticos do nosso famoso “jeitinho”. E quando os metódicos - chatos, como nos os chamamos - insistem e nos advertem, dizemos: “Não vai acontecer nada!”. Mas, às vezes, acontece. E entre as vezes que ocorre, mesmo nas milhares de ocorrências “anônimas” e sem vítimas graves, acontece, sim, a tragédia. De uma forma ou de outra, somos todos inocentemente tolerantes e omissos. Em ásperas palavras, somos todos culpados! Basta olhar ao redor com um mínimo de atenção. Ande pelas ruas e observe. Quando não é nosso comportamento individual e coletivo inadequado e de alto risco, a exemplo do trânsito, são as obras inacabadas, mal-localizadas, não funcionais, precárias e inseguras. Nossos desejos e nossas idealizações público-privadas não resistem a um crítico e seletivo exame. A realidade nos derrota paulatinamente. E de tempos em tempos, de forma amarga e cruel! .

23 janeiro 2013

Olavo e Élida

Acometido de um surto saudosista – e impaciente para escrever sobre a mesmice político-econômica, peço licença ao José Augusto Borowski, titular da atraente coluna “Memória” (Gazeta do Sul), para também exercitar uma lembrança pessoal e coletiva. Quase que “a vida toda” morei na rua São José, proximidades da estação rodoviária. Embora próximo do Colégio Estadual Estado de Goiás, histórico e destacado colégio santa-cruzense, meu destino foi o Grupo Escolar Bruno Agnes, onde estudei dos sete aos 11 anos. A Vila Schulz (bairro onde fica o colégio) era uma região povoada por gente muito humilde e trabalhadora. Pacificamente e sem discriminações, conviviam os descendentes negros e uma “alemoada” vinda da colônia (um exemplo da intensificação do êxodo rural? uma questão a esclarecer). O Bruno Agnes era uma escola simples e pequena. Seu pátio era de tamanho médio. Tinha uma modesta área externa de recreação coberta e um campinho de futebol. Sem grama. Tinha seis salas de aula. Sala dos professores e da diretora. Nessa sala também ficavam alguns livros, uma mini-biblioteca. E tinha uma cozinha onde ficavam e trabalhavam as “tias” Zulmira e Valesca. Elas faziam tudo na escola. Durante os dias frios de inverno, preparavam um sopão de legumes. Pela manhã, cada criança trazia de casa alguma coisa que a família pudesse ofertar. Antes de ingressarmos na sala de aula, passávamos na cozinha e deixávamos cenouras, batatas, repolhos e milho na espiga, por exemplo. Quem não tivesse os legumes na horta de casa, trazia achas de lenha para o antigo e ativo fogão. Na hora do recreio, todos em fila, passávamos à porta cozinha para encher nossas canecas, pelas mãos atentas e carinhosas das “tias”. Era uma energética satisfação tomar aquela sopa gostosa e quentinha. Lembro de todos os colegas, das professoras – que ora homenageio na pessoa da então diretora e amiga Fátima Baccar – e das datas festivas em que fazíamos teatrinho e declamávamos poesias nos degraus de acesso à cozinha, no pátio coberto. Tenho em mãos meu livro do primário, o Quarto Livro do Guri. Objetivo e ilustrativo, contém referências regionais e nacionais da história, geografia, literatura, economia, lendas, flora e fauna. Essas minhas lembranças têm como cicerones seus dois principais e infantis personagens e condutores das lições escolares contidas nos “Livros do Guri”: Olavo e Élida!

16 janeiro 2013

Consenso Artificial

Novela igual, ruim e sem fim. Vimos na composição do governo federal e nos governos estaduais. E, agora, repete-se nos novos governos municipais. A pretexto de promover reformas organizam maiorias parlamentares de bases absolutamente fisiológicas. Governos nominados “de coalizão”. Mais parecem de colisão! Usam e abusam do manual do usuário. Não é um manual político-ideológico, daqueles cheios de planos ousados e estratégicos para o bom futuro. É um simples manual de manutenção do poder e diminuição dos obstáculos à vontade do poder executivo. Em troca de cargos, vantagens e liberação de verbas orçamentárias, entre outros mecanismos, parlamentares e partidos dão sustentação aos governos e aprovam tudo sem discutir mérito e oportunidade. Salvo raras (e dissimuladas) exceções. Votações importantes são submetidas à chantagem e ao fisiologismo, objeto de negociações e “preços tabelados”. Ministérios, secretarias, estatais e demais órgãos públicos são balcões permanentes de compensações, negócios e negociatas. Afinidades políticas e ideológicas não são consideradas. É uma “festa” da qual “todos” querem participar (já temos 30 partidos registrados!). E como o apoio é baseado em objetiva e constante troca de favores, resulta uma ilusão, uma farsa, uma democracia de baixa qualidade. Aos raros parlamentares e partidos divergentes, por exemplo, é quase impossível ser oposição. Não há “oxigênio político-ideológico respirável” e não há margem de ação. O debate não existe. Impede-se o conflito sob o argumento de que o consenso é positivo. Ou que o conflito é danoso e prejudicial à sociedade. Este método de composição de governo e formação de maioria parlamentar tem-se revelado recorrente, insolúvel e prejudicial aos interesses do povo brasileiro. O resultado de tudo isso é que a política (tão essencial!) perde seu sentido. Embora preserve sua institucionalidade e suas exigências sociais, a política fica desmoralizada por essas negociações e essas adesões. É como se fosse uma nova ideologia. Mas é uma falsa ideologia e deve ser denunciada. Conflito e debate são condições necessárias para um consenso de fato. A carência de debates (e conflitos) gera uma mistificação e, com certeza, traduzirá uma falsa hegemonia de posição e relação de poder.

09 janeiro 2013

É Nepotismo

“Nepos” deriva do latim e significa tanto neto quanto sobrinho. Parentes e descendentes. Historicamente, o nepotismo começou com os papas da Igreja Católica. Costumavam distribuir cargos e favores aos seus familiares mais próximos. Atualmente, o termo e a prática estão associados aos governantes do Poder Executivo. Mas também ocorre no Poder Judiciário e no Legislativo. Nossa colonial e histórica prática política não resiste à tentação. A mistura da coisa pública com o interesse privado. O argumento em defesa da nomeação de parente seria a lealdade e confiança entre as partes e a proteção de interesses do “padrinho”. Muitas vezes é um gesto de gratidão por serviços prestados. Ou para obtenção de favores futuros. Apesar de legislação e decisões judiciais superiores que impedem e proíbem o nepotismo, driblam a lei. Não é a toa que existe o nepotismo direto (parentes sob as ordens diretas da autoridade nomeadora) e o indireto ou cruzado (parente da autoridade servindo a outra autoridade de outro poder). Também uma decisão do Supremo Tribunal Federal abre uma brecha legal. A interpretação da Súmula Vinculante nº 13 admite a nomeação de parente em cargo de caráter político. É o caso de Ministro de Estado, Secretário Estadual e Secretário Municipal. Entretanto, em outra decisão (ADIN 1521-RS) o mesmo STF admite que lei municipal (e estadual) tem força e legalidade para proibir a nomeação de familiares como agente político superior na administração pública. Com a palavra (e ação) os senhores vereadores! Seja qual for a justificativa legal invocada, e mesmo que o parente possa ser pessoa exemplar e dotada de qualificações para a função, o ato de nomeação viola os princípios constitucionais da impessoalidade e da moralidade. Fere a credibilidade do governante, a relação ética e a conveniência da administração pública. Mais grave: dissemina-se um constrangimento entre os demais servidores de confiança e os de carreira, inibindo-os para qualquer avaliação crítica relativamente à administração. Sabem - e lhes é permitido supor - que qualquer manifestação pessoal poderá prosseguir no âmbito familiar. E é absolutamente natural que isso venha a ocorrer. Assim, a nomeação de parente de prefeito ou vice-prefeito, por exemplo, constitui-se em latente e potencial inibitório do processo de autocrítica da gestão. E contradição relativamente ao anunciado modo novo de governar.

03 janeiro 2013

Migrações Humanas - Em Zero Hora de 03 de janeiro de 2013.

Periódicas eleições para o Parlamento Europeu renovam e confirmam o que já se esperava. Um crescimento do nacionalismo e da xenofobia. Vulgar e politicamente falando, xenofobia é uma rejeição, uma aversão em relação a pessoas, culturas ou raças diferentes, geralmente os estrangeiros. Ainda que não maioria, e limitado a conquista de algumas cadeiras, “os vitoriosos” simbólicos são os partidos de direita e centro-direita que defendem, principalmente, as políticas anti-imigração. Durante muitos anos a Europa estimulou a vinda de estrangeiros, originários principalmente da América Latina e da África, direcionados e empregados em atividades menos atraentes - e higiênicas! - do mercado de trabalho. Mais recentemente, com a criação e a ampliação da Comunidade Européia, a oferta de mão-de-obra está sendo suprida pelos trabalhadores do leste europeu, países mais pobres da atual Europa. Porém, face o desemprego que castiga duramente a Europa, cresce o sentimento de rejeição aos imigrantes latinos e africanos. Mas cresce também em relação aos trabalhadores vindos do leste europeu. O problema da discriminação é tão grave que mesmo na unificada Alemanha um alemão originário da Alemanha Oriental sofre o preconceito. Então, que dirá um trabalhador não-alemão, um não-europeu. No centro de todo esse processo de rejeição ao estrangeiro está o desemprego. Desemprego que atinge os jovens, principalmente. O Brasil é um grande exportador de mão-de-obra qualificada e pouco qualificada. Os números são impressionantes. Há 250 mil brasileiros no Japão. 65 mil em Portugal. 65 mil na Itália. 45 mil na Suíça. 30 mil no Reino Unido. 20 mil na Bélgica. 350 mil no Paraguai E outros 500 mil nos demais países! Sem contar os 1.500.000 de brasileiros que vivem nos Estados Unidos, especialmente nas cidades de Nova York, Miami, Houston, Chicago, Boston e São Francisco. Detalhe muito importante: metade desses brasileiros estaria trabalhando ilegalmente. Mas essa história tem outro lado. Nosso país também recebe muita gente de outros países. A partir da metade do século XIX, o Brasil recebeu milhares de imigrantes vindos da Alemanha, Itália, Japão, Polônia e Portugal, principalmente. Ultimamente, face os graves problemas político-econômico-financeiros enfrentados pela maioria dos países sul-americanos acontece um movimento migratório de sul-americanos rumo ao Brasil. Claro que essa movimentação guarda relação com o mencionado endurecimento das regras de imigração nos Estados Unidos e na Europa. Mas também sinaliza e caracteriza que há um reconhecimento em torno de nosso desenvolvimento econômico, cultural e social. Sem dúvida, estamos sempre de portas abertas e receptivos. Por exemplo, votado pelo Congresso Nacional, o então presidente Lula assinou a anistia de 50.000 imigrantes ilegais que estão no Brasil. E trata de regularizar a situação de milhares de haitianos. Encerro e pergunto: estamos preparados para receber grandes fluxos migratórios internacionais quando também nos enfrentamos graves problemas de desemprego, de déficit de infra-estrutura social e habitacional?

02 janeiro 2013

Carta ao Prefeito

As demandas públicas atuais são praticamente as mesmas em todos os médios e grandes municípios. Educação, saúde e segurança pública são sempre as mais cobradas. Geração de empregos também é sempre uma exigência atual, mas costuma ter ciclos de alta e baixa, principalmente em regiões que têm aspectos de sazonalidade em sua economia, a exemplo de Santa Cruz do Sul. O prefeito eleito tem um programa de governo. Supõe-se que tenha sido considerado pelo eleitorado. E que seja factível. E que vá muito além das críticas à administração anterior. Aliás, gestão anterior que não foi ruim. Ficou na média. O problema é que Santa Cruz do Sul precisa de muito mais. Mais ousadia, mais criatividade. Precisa de um choque de gestão moderna e visionária. A cidade também precisa de “um banho de loja”. Já éramos uma cidade mais aprazível e bonita. Comparada com outras cidades do mesmo porte e riqueza, ficamos para trás. Por exemplo, em meio ao crescente número de edifícios residenciais, ou seja, moradores de apartamentos, faltam praças e parques de qualidade. O grande desafio de Santa Cruz consiste em compreender, e se comportar de acordo, de que é um pólo regional para onde se dirigem milhares de famílias vindas de pequenos municípios da região. Esse movimento migratório já tem mais de vinte anos e, infelizmente, ainda não entendemos e avaliamos correta e preventivamente sua dimensão e exigência social. O processo migratório é constante e não vai parar. De momento, é irreversível. Isso significa que se não encontrarmos soluções imediatas e permanentes de geração de emprego e renda (mais indústrias, comercio e serviços), e de ocupação qualitativa do solo, veremos crescer a pobreza e o conjunto de necessidades inerentes e conseqüentes, como saúde, segurança, infra-estrutura, déficit habitacional, entre outras. Nem vou me reportar a recentes, graves e importantes questões administrativas e de alto interesse social pendentes e sem respostas públicas adequadas. Caso da concorrência da água/esgoto, e do transporte público coletivo e a (não) profissionalização do serviço público. Está mais do que na hora de aumentar os índices de qualidade e profissionalização do serviço público, reduzindo, em contrapartida, o número e a incidência de cargos em comissão. Líderes político-partidários que não compreenderem isso perderão credibilidade e apoio popular. Finalmente, as dificuldades atuais não são mais políticas e/ou administrativas, mas sim de liderança e capacidade de discernimento. De ousadia e criatividade, repito. Santa Cruz precisa mais, merece mais!