22 maio 2013

Pós-política

Recentemente, escrevi sobre a anti-política. Dizia que a anti-política poderá ser uma nova utopia, uma possibilidade de revitalização das idéias e das esperanças. Principalmente, poderá desmascarar um tradicional (e fraudulento!) discurso político, que afirma que os interesses da classe política são idênticos aos interesses da comunidade. Ou, que os interesses do estado se equiparam aos objetivos da população. Ambos falsos!

E lembrava as palavras de George Konrad (1933), escritor húngaro, que definiu a anti-política (seu premiado ensaio de 1985) como “uma força moral da sociedade civil que articula a desconfiança e rejeição públicas do monopólio de poder da classe política dentro do Estado – um poder usado contra as populações através de legislação. Esta força moral não pretende derrubar o poder político, mas opor-se à opressão que ele exerce sobre as populações”.

No mesmo sentido, hoje falo sobre o pós-político. Enquanto que a anti-política quer refazer e recuperar o sentido e debate ideológico (mas questiona os partidos e suas práticas), a pós-política representa o contrário. Pensa, acredita e aposta no fim da ideologia.

Enquanto que a anti-política ainda não sabe como agir, a pós-política sabe muito bem o que fazer, como fazer e o que quer: o poder. E o poder se estabelece pela conquista do estado. A pós-política é realista. Joga o jogo do sistema. Não tem ilusões, nem pudores.

Utiliza e manipula os partidos, faz permanente cooptação das instituições sociais, as despolitiza e as converte em instrumentos de sua manutenção de poder. Isso explica uma persistente e óbvia pergunta: onde estão os sindicatos e os movimentos sociais e estudantis?

Utópica, a anti-política, ao contrário, quer recuperar as manifestações e os movimentos sociais, sua cultura e dinâmica. Mas, sabe que “não há vida saudável dentro do sistema”.

Entre esses dois antagônicos movimentos políticos há algo essencial e expressivo em comum, mas por razões diferentes. Os meios de informação e conhecimento são ponto central de ação da anti-política para expandir a comunicação e as redes de integração do debate político-ideológico. Já a pós-política, reconhecendo os inerentes riscos à sua manutenção de poder, tenta impor o controle sobre os meios de comunicação.

Qualquer atual semelhança com a natureza do exercício do poder de estado e a situação geral da política brasileira é mera coincidência!






15 maio 2013

Reunião Ministerial

Com vistas às eleições presidenciais de 2014, e para acomodar mais um partido na sua base de apoio político-parlamentar (agora já são 22 partidos), a presidenta Dilma nomeou como 39º ministro o atual vice-governador de São Paulo, Guilherme Afif Domingos (PSD-SP).

Observada a onerosa e escandalosa razão eleitoreira, importa, entretanto, destacar a relevância do segmento econômico, que reúne sete milhões de empresas e gera mais de 11 milhões de empregos formais.

Com status de ministério e vinculada à Presidência da República, a Secretaria da Micro e Pequena Empresa abrigará, além do ministro, do secretário-executivo e servidores públicos, mais 66 cargos em comissão, de livre indicação e nomeação.
Ironicamente, porém, é irresistível não imaginar como seria uma reunião ministerial. Pense na cadeia logística para reunir trinta e nove ministros. Secretária ligando para secretária “n” vezes. Ministros cancelando ou voltando de viagem às pressas. Carros oficiais, motoristas, seguranças e assessores.

E o pessoal de apoio ficaria na mesma sala? Se cada ministro levar um assessor seriam mais 39 pessoas. Contando a assessoria da presidência, seriam mais de 80 pessoas no salão.

Quanto tempo seria necessário para todos os ministros se cumprimentarem? Considerando que há dez mulheres ministras, mais a presidenta Dilma, somados quantos serão os clássicos “dois beijinhos”? Calculei 726 beijos. Mas beijo na boca, só o casal Paulo Bernardo (Comunicações) e Gleisi Hoffmann (Casa Civil)!

E quantos garçons serão necessários para servir a água mineral e o cafezinho? Dois, quatro ou oito? Se servirem dois cafezinhos durante a reunião, serão oitenta cafezinhos. Sem contar os copos de água. “Vai uma barrinha de cereal, senhor ministro?”

Se a maioria dos ministros queira fazer uso da palavra, com certeza, deverá previamente retirar uma senha. E não falar mais do que cinco minutos. Aliás, se todos falassem apenas cinco minutos, teríamos enfadonhas três horas e quinze minutos de reunião.

E se - a cada intervenção de um ministro - a presidenta também falasse os mesmos cinco minutos teríamos mais três horas e quinze minutos, totalizando seis horas e trinta minutos.

Tudo isso pode parecer muito irônico, kafkiano e engraçado. Mas não é de rir. Trinta e nove ministros é um deboche a qualquer princípio de boa administração e gerenciamento. É de perder as esperanças. Ou fazer uma revolução. Mas se estão “todos” no poder, como?







08 maio 2013

Crise Mundial

Nos últimos duzentos anos, mais precisamente desde o final do século XVIII, a história e hegemonia capitalista estavam em mãos de ingleses e norte-americanos, respectivamente. Mais recentemente, desde 1945, os Estados Unidos da América (EUA) comandam o mundo financeiro e comercial mundial.

Não é a toa que seu produto interno bruto (PIB) totaliza anualmente US$15,6 trilhões. Quase equivalente a soma de outros três gigantes mundiais: China (US$8,2), Japão (US$5,9) e Alemanha (US$3,4). Ou, então, igual a soma de seis Brasis (US$2,5).

Embora ainda muito consistentes e grandiosos, os números desses países líderes escondem indicadores sócio-econômicos preocupantes e decadentes. Estados Unidos e Japão há mais tempo. Comunidade européia, ultimamente. E, agora, mesmo a poderosa China já está de freio de mão puxado.

Os grandes fluxos do sistema capitalista sempre estiveram sob a liderança e influência de uma grande nação, de natureza e comportamento imperial. Pela primeira vez, porém, conseqüência da globalização, isso deixa de ocorrer. O conjunto da crise desestabilizou uma série de elites corporativas e financeiras que detinham poderes centenários e mundiais.

A grande surpresa (e contradição) é que se supunha que o processo de mercantilização mundial seria uma alavanca automática de crescimento e aperfeiçoamento do capitalismo. Que se constituiria em fenômeno irreversível e planetário, indiferente a eventuais obstáculos nacionais e locais. A crise atual parece desmentir essas hipóteses.

Os mais afoitos (e ideologicamente comprometidos) sugerem a fragilidade e o fim do capitalismo. Hoje, seria um sistema à deriva. Mais grave é a visão dos pessimistas. Anteveem processos autodestrutivos, desastres ecológicos e até hipóteses de genocídios. Ao contrário, os otimistas preveem a regeneração do sistema, o crescimento da solidariedade e uma expressiva consciência ecológico-ambiental. Afinal, são reações típicas nas crises.

Mas se a economia global está em crise e colapso, as comunicações não estão. Esse fenômeno de informação e comunicação, assentado sobre a internet, permite o conhecimento, a organização e consolidação de vários pontos de resistência social e econômica dos países mais humildes e periféricos. Neste contexto é que crescem e se afirmam os ditos países emergentes, entre os quais o Brasil.

Duas ironias, entretanto. Primeiro: suas economias ainda dependem dos negócios com as ditas potências em crise. Segundo: com seus novos negócios, seus novos ricos e burgueses, empresas transnacionais e oligopólios, os países emergentes reproduzem internamente as mesmas contradições do capitalismo mundial. Em tese, são candidatos a reprodução das mesmas crises sistêmicas.

01 maio 2013

Crime e (nosso) Castigo

Crime e (nosso) Castigo

A criminalidade/impunidade é “um filme nacional” que não sai de cartaz. Seja nas cidadezinhas do interior ou nas capitais brasileiras, as ocorrências diárias e fatais colocam o país em estado de tensão. Somos todos reféns.

Trata-se de um problema gigantesco e cruel, fruto da incompetência e desídia dos governantes e administradores públicos, sobretudo do sistema policial, judicial e carcerário.

Faz tempo - e não há soluções a vista - que o estado brasileiro demonstra incapacidade de tratar e lidar com o crime. E de proteger a sociedade. Mas há algo bem pior acontecendo: desde o menor infrator até o adulto mais perverso, os criminosos têm a certeza que o poder está com eles, não temem a reação policial, muito menos as decisões judiciais.

Kafkiana e ironicamente, o poder de alguns chefões do crime organizado é exercido de dentro dos presídios. Simbolicamente, há algo que melhor (?) possa representar a falência do estado brasileiro?

A ousadia dos criminosos e seu volume de atentados são frutos de nossa tolerância política e uma legislação penal branda. Há pesquisas que indicam que nossas condenações e punições correspondem, em média, entre cinco e 10% das punições do mesmo tipo penal aplicadas por outros países.

Então, resulta que a prática criminosa é uma ação de baixo risco e compensadora, um bom negócio econômico e financeiro, um eficaz método de resolver problemas pessoais. As estatísticas comprovam. E se compreende por que a criminalidade cresce. E com ela nossa (mais que sensação) absoluta insegurança.

Evidentemente, desenvolver qualificação e inteligência policial, estruturas de prevenção e repressão, planejamento de médio e longo prazo, exigem elevado investimento de recursos públicos. Mas, observando a “corte” de Brasília, percebe-se que dinheiro há, basta estabelecer prioridades.

Porém, há governantes, parlamentares, cidadãos e eleitores que preferem priorizar uma Copa do Mundo. Não é debochadamente escandaloso o gasto de um bilhão de reais na reforma do Maracanã? E saber que serão necessários mais 500 milhões para sua adequação para as Olimpíadas?

Defensiva e espertamente, entre os (des)governantes prevalecerá um argumento do filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900), quando disse que “os fatos não existem, mas, sim, a interpretação dos fatos”. Ou, então, dirão como o escritor, dramaturgo e jornalista Nelson Rodrigues (1912-1980), reza a lenda: “Se os fatos são contra mim, pior para os fatos!”.