25 setembro 2013

A Síria e o Lobo

O conflito na Síria - e a iminência de uma intervenção ocidental - recoloca na ordem do dia dos debates o tema do imperialismo. Quer por motivações geopolíticas ou econômicas, o ocidente impõe, periodicamente, práticas civilizatórias e regimes políticos aos demais povos, através de ações prepotentes e arbitrárias; militares, quase sempre!

Historicamente, vejam no que deu a África e o Oriente Médio. Sua divisão territorial, patrocinada e idealizada pelo ocidente, ignorou as seculares divisões tribais e regionais, transformando, conseqüentemente, estas regiões em cenários permanentes de conflitos. A questão palestina, por exemplo, é notório e oscilante termômetro mundial.

O norte-americano Samuel Huntington (1927-2008), autor da obra “Choque de Civilizações” (1993), e igualmente autor de outra obra importante, qual seja, “A Ordem Política nas Sociedades em Mudança” (1968), já prenunciara a natureza dos atuais e futuros confrontos.

Inglaterra, França, Estados Unidos e Rússia (ex-URSS), principalmente, destacam-se por esta prática intervencionista. A Rússia ocidental impusera-se aos demais povos da (ex) comunidade soviética. A Inglaterra, todos lembram, era “o reino onde o sol nunca se punha”, tantos eram os territórios sob seu controle. Os Estados Unidos, sucessor dos impérios decadentes, promove uma ocupação cultural e financeira, mas também sob o signo de seu aparato bélico.

Modernamente, o imperialismo surge em 1830 relacionado ao império napoleônico. O sentido pejorativo, comum nos dias de hoje, surge em 1848, graças à política “cesarista” de Napoleão III (1808-1873). Em 1870, a política de fortalecimento e expansão do império colonial britânico, na administração do primeiro-ministro Benjamin Disraeli (1804-1881), recebe, igualmente, a denominação de imperialismo.

Com o tempo, sobretudo em função da política externa e expansão inglesa, o significado ficou, definitivamente, claro: imperialismo é o estabelecimento da soberania política de uma nação sobre povos e territórios estrangeiros. Suas razões e objetivos podem ser econômicos, como podem ser de natureza estratégica quanto à manutenção de poder; e também podem ser para a preservação de áreas de influência.

Alguns historiadores julgam superado o debate em torno do imperialismo e sua significação dado o moderno caráter da globalização e seus efeitos gerais e colaterais. Mas não parece ser o que temos visto ultima e continuamente.
Ainda que, e possivelmente, influenciado pela indústria bélica norte-americana, antes de Obama decidir intervir no conflito sírio talvez devesse relembrar as aulas clássicas de direito internacional, principalmente aquelas que preconizam “o princípio da livre autodeterminação dos povos”.

Sob pena de confirmar o que já sabemos: o lobo muda o pêlo, e não a índole!



18 setembro 2013

Mensalão:curto e grosso

Sobre a continuidade do julgamento de hoje. Os embargos infringentes. Ou, em palavras mais simples, o polêmico e reivindicado direito dos acusados e condenados obterem a revisão da decisão e das respectivas penas impostas.

Quanto ao denominado recurso, há previsão no Regimento Interno, embora datado de antes da Constituição de 1988. Mas, posteriormente, houve lei (8.038/90) que tratou da matéria sem prever esse tipo de recurso no Supremo Tribunal Federal. Logo, o item no Regimento Interno do STF deixou de existir por falta de previsão legal.

A tese de alguns ministros é que houve recepção. Ou seja, que a lei teria acolhido aquela disposição regimental porque não fizera menção ao recurso. Tese equivocada. A lei não precisa revogar dispositivos do Regimento Interno. Esse é que tem que se conformar e se adequar. As leis se sobrepõem aos regimentos.

O privilégio do foro colegiado tem o ônus da não opção e existência recursal, a exceção do embargo declaratório, que serve apenas para esclarecer uma decisão. Os recursos são a proteção ao juizado singular e tribunais inferiores. É o duplo grau de jurisdição. Como o STF é o último patamar da justiça, não há possibilidade de recursos.

Admitamos, entretanto, para o salutar debate, a emergência de outra tese, contrariamente ao aqui e ora exposto. Uma tese que assegure o reexame do processo de julgamento dos recorrentes e da (re)fixação de suas respectivas penas.
É o que vai acontecer, arrisco prever.

O ministro Celso de Mello ficará fiel a sua equivocada manifestação anterior (a favor dos embargos infringentes nos debates do dia 2 de agosto de 2012) e consagrará o subterfúgio. Assim, seu sincero voto se somará aos demais. E instrumentalizará e consolidará a impunidade e a desmoralização popular da justiça.

Mais grave, porém, no meu entendimento e lamento, foi o não exercício pessoal de impedimento ético – no julgamento - de parte dos ministros José Antonio Dias Toffoli e Luis Roberto Barroso.

De janeiro de 2003 a julho de 2005, Toffoli exerceu o cargo de subchefe da área de Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da Republica, durante a gestão de José Dirceu. Além de advogado do Partido dos Trabalhadores (PT), contra a isenção de Toffoli também pesa o fato de sua namorada ter sido advogada de vários acusados do "mensalão".

De outra parte, o escritório jurídico de Luís Barroso foi recentemente remunerado pelo governo federal por serviços prestados. Mais precisamente, R$ 2.050.000,00, de acordo com extrato de inexigibilidade de licitação publicado no Diário Oficial da União, edição de 12 de agosto de 2013. O ministro Luis Barroso assumira em 26 de junho.

Ou ética não combina com justiça?

11 setembro 2013

Médicos Cubanos: uma imoralidade brasileira

Historicamente, o Brasil foi e é extremamente receptivo aos estrangeiros. Sempre se alinhou contra as diversas formas de injustiça mundo afora, razão de inúmeras vezes ofertar asilo político e receber refugiados em geral. Além da simpatia e acolhimento de nosso povo, esse comportamento, com certeza, explica o carinho que “o mundo” tem por nossa pátria.

Nosso governo pode ter inúmeras e corretas explicações e razões para proceder ao recrutamento e a contratação de (mais) médicos estrangeiros, no intuito de atender regiões desassistidas. Da mesma forma, médicos brasileiros e suas representações classistas também têm razão em afirmar que a solução dos problemas não se limita ao fator humano, mas sim às graves carências de infra-estrutura.

Minha inconformidade, entretanto, já expressa em outro artigo (Cuba Libre, 28-08-13), não se refere à questão “médico x sociedade” e às razões de governo e prefeitos, mas, sim, objetivamente, a forma e natureza do recrutamento e remuneração dos médicos cubanos.

Não foi desmentido que a expressiva e maior parte da remuneração reverterá aos cofres do governo cubano. Cuba não é uma democracia. É uma ditadura. As liberdades políticas e pessoais de seu povo não se equiparam àquelas defendidas em nossa Constituição.

Ainda que sob a formalidade da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), que receberá 5% de comissão, é um negócio de governo para governo. Financeira e politicamente. Não é à toa que esses médicos não terão direito a pedido de asilo político.

Os médicos cubanos não vêm por razões humanitárias. Ao Brasil, e em outras partes do mundo, vão por razões e necessidades pessoais e familiares. Em Cuba trabalham de 60 a 70 horas semanais e recebem, aproximadamente, R$70,00 mensais. Agora receberão, possivelmente, R$ 2 mil dos R$ 10 mil que o governo brasileiro pagará ao governo cubano por médico. Relativa e pessoalmente, ganhar trinta vezes mais é um pé-de-meia respeitável e compreensível.

Mas os fins brasileiros e as razões pessoais dos médicos cubanos não justificam os meios adotados. Nosso governo contribuirá financeiramente para a manutenção de uma ditadura que explora comercialmente as necessidades do próprio povo, alugando seu conhecimento de forma aviltada e desproporcional.

Por nosso histórico de solidariedade, dignidade e respeito às liberdades pessoais, esse “negócio” é uma imoralidade. É uma vergonha para o Brasil!


04 setembro 2013

Caso Donadon: uma interpretação

O fato: na semana passada, em votação secreta, e por omissão de 24 votos faltantes (dentre 104 deputados ausentes e 41 abstenções) a Câmara dos Deputados livrou o deputado Natan Donadon (sem partido-RO) do processo de cassação de mandato (233 votaram pela perda do mandato e 131 votaram contrariamente).

Donadon fora condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 13 anos de prisão por crime de peculato (desvio de dinheiro público por funcionário que tem a seu cargo a administração de verbas públicas) e formação de quadrilha. Pena que já está cumprindo na Penitenciária da Papuda, em Brasília.

A repercussão: de modo unânime, a nação se revoltou com o fato e, muito mais, com a ousadia dos deputados. Afinal, o que restava de supostos valores éticos sociais e constitucionais estava sendo jogado na lata de lixo da história. Que absurdo maior poderia haver do que um deputado cumprindo seu mandato de dentro de uma prisão?

Uma interpretação do fato: ao contrário do que imaginara o revoltado povo - de que o Congresso voltara ao seu comportamento padrão e ignorara as mensagens da recente rebelião das ruas, na voz de poucos analistas políticos a mais surpreendente tese acerca do que houvera naquela votação sugeria o seguinte:

- Que “tudo” fora articulado e combinado, as ausências e as omissões, de modo que o resultado fosse aquele que de fato foi (a não perda do mandato) e que houvesse uma indignação e repercussão popular gigantesca (o que de fato também ocorreu). E que o resultado e a soma de ambos os fatos gerasse uma onda poderosa que exigiria e determinaria o fim definitivo do voto secreto!

Notícia de ontem: o presidente do Senado anunciou que colocará em votação a PEC que determina perda imediata do mandato de parlamentares condenados em última instância.
Á noite, a Câmara dos Deputados aprovou por unanimidade a Proposta de Emenda Constitucional – PEC que acaba com o voto secreto em todas as situações, e não apenas nos casos de cassação de mandato.

Possível conclusão: essas medidas recentes são conseqüência do clamor das ruas? Trata-se de uma grande coincidência? A dita interpretação do fato será verdadeira ou mais uma lenda política?

Se acredito nessa surpreendente estratégia? Não tenho a resposta exata, mas sei que em Brasília não há amadores!