18 junho 2013

Quem paga o ônibus

Há uma análise – números! – que desqualifica e esvazia ideologicamente a luta pela tarifa. Trata-se de uma simples equação matemática que desmonta argumento, mobilização e pretexto.

Dados de maio de 2013 (ATP) indicam que 62% do faturamento das empresas de ônibus decorrem dos vales-transporte (10.632.910 passageiros). Vales comprados, pagos e antecipados pelo patrão (empresas comerciais e industriais e empregadores domésticos), em atenção à legislação federal que dá ao trabalhador tal direito. É verdade que o trabalhador contribui com parcela descontável do seu salário, mas que não alcança um quarto do custo total das passagens. Porém, nem todos os empregadores fazem o desconto.

Consequentemente, o custo do vale-transporte dos funcionários das empresas em geral está diluído nos preços dos respectivos serviços e produtos de sua fabricação e comercialização. Consumidos e pagos por toda a sociedade.
O mesmo se repete tocante a quota de vale-transporte de prestadores de serviços pessoais e residenciais (empregadas domésticas, babás, cuidadores, etc), contratados e remunerados pela classe média.

Isenções, a meia passagem e o passe livre perfazem 7.339.626 de passageiros (30% entre 24.596.145 de passageiros/maio). Custo absorvido e acolhido no valor da tarifa paga em vales (62%) e em dinheiro (38%). Então, conclui-se que a tarifa é extremamente socializada. E por isso encarecida.

Objetivamente, quem está pagando o custo das passagens de ônibus de 15.183.478 passageiros (10.632.910 mais 4.550.568 (62% dos isentos, passe livre e meia-passagem) são os empregadores particulares e os consumidores de produtos e serviços das empresas comerciais e industriais. Ou seja, todos nós cidadãos e consumidores de bens e serviços. Mesmo quem não anda de ônibus!

Em tempo: sobre a avaliação, composição, cálculo e definição da tarifa, há informação de que teria havido recusa da inclusão dos custos da frota reserva. Estranho. Parece muito óbvio que tudo tem um custo, mesmo um ônibus parado. Afinal, há um custo financeiro constante por sua imobilização patrimonial. E se, eventualmente, já amortizado e depreciado, ainda assim tem custos de manutenção e de reserva técnica.

Finalizando, se é verdadeira e aceitável a argumentação sobre quem realmente paga a “conta ônibus”, salvo prova em contrário, qual é mesma a causa (e quantum monetário) de tanta revolta e depredação?

Talvez fosse mais objetivo reclamar e questionar a carga tributária em Brasília (e depredar, se quiserem).


12 junho 2013

Minha Outra Namorada

Hoje é o dia dos namorados. Esqueceu? Ainda há tempo para presentear e comemorar o tempo de relacionamento. É o que vou fazer também. Porém, tenho um fato complicador e agravante. Devo confessar. É outra namorada. Sempre gasto em dobro por causa de minha outra namorada. Ela é muito exigente.

Se presenteio minha namorada com um perfume ou um conjunto de maquiagem, nacional ou importado, ela, a outra namorada, quer mais do que seu valor. Se for um vinho ou um espumante, jóias ou bijuterias, não importa se de primeira ou de segunda qualidade, ela também quer.

Um aparelho de DVD, ou de som, antigo ou moderno tipo IPOD e MP3; calça jeans, par de botas ou uma bolsa; notebook ou telefone celular desses modernos, não tem choro, ela também quer. Uma moto, ou um carro, então, nem pensar em comprar.
Vá pensando em qualquer hipótese, você não encontrará um único presente que eu possa dar para minha namorada sem que a outra namorada exija também. Para dizer a verdade, nem importa o valor dos objetos, caro ou barato, ela quer sua parte. Minha outra namorada é muito possessiva.

E ai de mim se não cumprir. Ela é capaz até de romper relações e provocar uma ação judicial. Pior: é capaz de cobrar dos meus herdeiros o presente que não chegou, ou que chegou a menor, ou chegou atrasado. Chego à conclusão que isso não é amor, não é uma relação saudável e justa. Parece mais chantagem.

Como um consolo pessoal, amigos já disseram que enfrentaram o mesmo drama. Uns até em situação pior que a minha. Tentaram fugir e se esconder. Impossível. Perderam tudo ao longo e depois do namoro.

Do jeito que anda a nossa relação, ela querendo sempre mais e mais, talvez a única solução seja eu terminar o namoro com a minha verdadeira namorada, e ficar, definitivamente, com essa outra namorada.

Mas aí, avaliando e pesando, e fazendo uma DR, sabe, discutindo a relação, concluo que ela nem me ama. Só se aproveita de mim. Não me dá nada em troca. Nada. Só me explora. Mais: dizem até que ela tem um amante, a quem entrega tudo o que tira de mim. Dizem pior: de que o amante é um gigolô!

Bem, como eu decidi terminar esse segundo namoro - embora ainda não saiba como colocar isso em prática, posso dizer para vocês, de modo preventivo e de alerta, os nomes da minha outra namorada e do seu amante – aquele que dizem que fica com tudo.

O amante se chama Governo. E a outra namorada se chama Receita. Mas também atende pelos nomes de Receita Federal, Estadual e Municipal. Vulgarmente, também atende por Carga Tributária.



05 junho 2013

Pagando o pato

Ainda que não se saiba, até o momento, a origem dos boatos que tumultuaram suas agências em razão dos pagamentos intempestivos da Bolsa-Família, a Caixa Econômica Federal voltou melancolicamente às manchetes nacionais. Inclusive, desmentindo membros de sua própria direção nacional ao admitir haver liberado saques antecipados na véspera do início dos boatos.

E por que afirmo que voltou melancolicamente às manchetes? Porque nos últimos anos tem tido uma sucessão de ações e negócios obscuros - de parte da direção central e do governo - que não guardam relação com seu papel institucional e suas tarefas sociais e primordiais junto à população.

Exemplos não faltam. Em 2010, a Caixa usou R$ 600 milhões do FI-FGTS (dinheiro dos trabalhadores!) para investir e se associar com a Rede Energia, uma companhia energética insolvente e que sofreu intervenção da agência reguladora. Quando a Caixa comprou sua participação, a empresa elétrica já precisava faturar seis vezes mais para cobrir dívidas, principalmente com governo e fornecedores.

Em 2009, a Caixa comprou parcela acionária do Banco Panamericano, até então controlado pelo animador e apresentador Silvio Santos. À época, a justificativa para o negócio seria o fato de que o banco teria forte penetração nas classes sociais “C e D”.

Para virar sócia, a Caixa injetou R$ 739,27 milhões. Diante da fragilidade do banco teria investido mais R$ 340 milhões. Na tentativa de recuperar e reergue-lo, o aporte de verbas publicas estaria próximo de R$ 1,8 bilhão.
Um ano depois do investimento inicial, descobriu-se que o banco Panamericano tinha “um rombo”. Esse fato motiva a tramitação de um processo na 6ª Vara Federal Criminal, em São Paulo, que apura as responsabilidades em possíveis fraudes que deixaram um rombo de R$ 4,3 bilhões na instituição.

Mais recentemente, houve uma interessante coincidência entre a compra do passe do jogador Alexandre Pato (ex-Milan-Itália) pelo Corinthians (SP) e assinatura de um patrocínio (ao Corinthians) pela Caixa, no valor de R$ 40 milhões anuais. Tramita na justiça federal uma ação popular questionando o negócio. O fato do ex-presidente Lula ser torcedor do Corinthians também é mera coincidência. Afinal, no embalo, também foi confirmado o patrocínio do Flamengo(RJ), no valor de R$25 milhões anuais. A Caixa também patrocina os clubes Atlético (PR), Avaí e Figueirense (SC).

Em 2012, a Caixa foi o terceiro maior anunciante do país. Gastou mais do que as cervejarias, mais do que as companhias telefônicas, mais do que as fábricas de automóveis. Gastou R$ 676,534 milhões.

Em resumo, à conta de “aventuras econômicas, financeiras e publicitárias” com o dinheiro público, o contribuinte paga a conta. Paga dois patos!






Paradoxo Social

Em qualquer reunião de pessoas, conversa vai, conversa vem, sempre ressurge o debate em torno das transformações sociais e comportamentais que vivenciamos. E quando digo nós, digo todo mundo. O mundo todo. Mudanças nos modos de vida e na convivência social. Para o bem. E para o mal.

E entre as várias e diferentes indagações e afirmações, se apresentam sempre a questão da ética, da moral e da solidariedade. Perguntas que estão no ar, com certeza, por causa dos evidentes sinais sociais que revelam a preponderância do individualismo, do egoísmo, do cinismo, do erótico e do sexismo. Em suma, em análise à moda antiga, “a falácia e decadência dos bons costumes e valores em geral”.

Para aqueles afeitos aos discursos e práticas religiosas e participação nas igrejas, soa consensual que a suposta degradação é conseqüência do crescimento do ateísmo, do consumismo e da hierarquia do dinheiro. Com certeza, a influência das igrejas e dos líderes religiosos diminuiu bastante.

Mas “as coisas” não parecem ser exatamente assim. Paradoxalmente, crescem e já são imensos os movimentos sociais em defesa de uma ética pública, notadamente relacionada aos direitos humanos, aos negócios e à política. De parte dos mesmos ativistas que também tem tempo, pernas e braços para lutar pela defesa ambiental e as relações equilibradas de consumo, por ações humanitárias e filantrópicas.

Então, o fato de realmente sermos/estarmos mais individualistas, preocupados com (a beleza de) nosso corpo e o prazer, por exemplo, ocupados em ganhar dinheiro e consumir, não significa necessariamente que sejamos omissos ou insensíveis às questões gerais de interesse da sociedade.

Possivelmente, a resposta para essa hipotética contradição esteja no fato de o que realmente mudou foi o modo de agir, as formas de atuar, reivindicar e protestar. Por exemplo, já não há mais o culto ao mártir, ao herói, ao solitário líder que a tudo e todos enfrentará, mas uma consciência de que a força reside nos grupos, no coletivo.

E, sem dúvida, nos modernos meios de comunicação e informação, a exemplo de redes sociais, que viabilizam as novas formas de mobilização e ação. Principalmente porque são movimentos não hierárquicos.
Resumindo, se essas contradições e tendências ainda não estão muito claras, atuantes e devidamente enraizadas, é porque ainda vivemos sob o estigma e a influência dos velhos laços de poder.

Entretanto, são e serão relações possivelmente menos sisudas e moralistas (naquele sentido antigo), mas não menos racionais, universais, éticas. E divertidas, por que não?