28 agosto 2009

O Princípio da Cooptação

A razão de existir de um sistema político, e de um governo, está diretamente relacionada com sua função de facilitar e melhorar a vida dos cidadãos.
Pela mesma razão, há eleições livres, diretas e periódicas dos governantes e representantes, de modo a verificar e julgar a qualidade e a confirmação da melhoria.
Para que este sistema funcione bem é necessário que o cidadão saiba o que o governo tem feito para cumprir suas obrigações.
Do mesmo modo, precisa saber o que o governo e a oposição defendem e tem como objetivos.
Mais: é necessário que o cidadão consiga compreender e analisar essas informações para poder julgar qual sua adequação, viabilização, consequência social e oneração financeira.
Mas há um problema grave para a realização deste ideal: a maioria da população brasileira não tem capacidade para entender e analisar estas informações.
Isto na suposição de que as informações cheguem a todos os cidadãos, minimamente. Normalmente, não chegam!
Consequentemente, e sabedores dessa realidade, os detentores do poder, aqui nominados governantes e representantes, tendem a desdenhar e corromper o sistema idealizado.
Não é a toa que o voto dos pobres é comprado em troca de uma esmola e a corrupção financie a perpetuação no poder.
Na eleição presidencial de 2006, por exemplo, a esmola distribuída ao povo, denominada Bolsa Família, cumpriu um papel eleitoral fundamental pró-governo.
A tal ponto que os escândalos e crimes contra a economia, o dinheiro público e a normalidade institucional não repercutirem, objetiva e eleitoralmente.
Aliás, até hoje quem questiona esses métodos – distribuição da esmola – é rotulado como elitista. Ou chamado de imbecil, como disse recentemente o presidente Lula.
Rotulado de elitista e imbecil ainda que o legítimo questionamento fosse de teor econômico, sócio-educativo, ético, moral, entre outras abordagens possíveis.
Ou seja, estamos em meio à absoluta mediocrização do debate político e da ação governamental responsável.
O mesmo desdém ocorre em relação àqueles que querem e exigem o respeito às leis e às instituições – e o esclarecimento dos sucessivos escândalos.
Diante da legitimação de tantos maus exemplos, surpreendentemente abençoados com o sucesso eleitoral, caminha rápida a desqualificação absoluta da política e da administração pública.
Pior: como consequência, não há mais nem oposição ideológica e institucional. O princípio da cooptação venceu!

21 agosto 2009

A Força do Ralo Ideológico

A frustração das expectativas políticas, a histórica e repetida evaporação das esperanças depositadas nas urnas, parecem ser uma praga brasileira.
Regra geral, uma vez no poder, os partidos e seus representantes se acomodam de tal modo que esquecem o conjunto das promessas e das responsabilidades públicas.
A decisão de arquivamento das denúncias contra o senador José Sarney, com o apoio do Partido dos Trabalhadores, é apenas mais uma página negra no histórico da política nacional.
No caso do PT, dada a natureza da ocupação (e locupletação) do governo, das ações e das opções de estilo no exercício de poder, os prognósticos e o desfecho eram previsíveis.
Não custa relembrar a radical alteração de rotinas e procedimentos partidários. Desde a ascensão ao poder, controvérsias internas são solucionadas pela via administrativa e não mais pelo debate democrático.
A opinião partidária foi relegada a segundo plano. É o governo que está pautando administrativamente o partido. A verticalidade burocrática venceu a democracia e o consenso até então horizontalmente formados.
Mas o mais surpreendente é a aceitação e o silêncio sepulcral de suas bases, submetidas à ditadura do alto clero governamental e partidário.
Ironicamente, é o Poder Executivo que está organizando a posição do partido e não o inverso. Não é a toa que o Governo está cercado de grupos de trabalhos, conselhos, comissões, numa tentativa centralizadora de “organizar” a posição da sociedade (sic).
Outro aspecto relevante, desde a primeira hora, diz respeito à adoção de uma agenda política de centro e continuísta.
Bem, façamos algumas concessões devido às dificuldades de concretizar e manter um governo. Mas, mesmo assim, ninguém imaginaria tanta rapidez e subordinação na adoção de práticas reformistas de outros governos, tidos conservadores e responsáveis pela midiática “herança maldita”.
Assim, objetiva e ideologicamente, e do ponto de vista eleitoral, o desastre ético do PT provoca a abertura de um importante espaço político à esquerda.
É cada vez mais evidente e expressiva a perda do apoio de segmentos formadores de opinião, lideranças acadêmicas e sindicais.
Dia após dia, e em efeito dominó, se consolida a convicção de que o espírito de mudança esvaneceu nas mãos de Lula e do PT.
Mas a luta continua. Não custa lembrar uma frase do teólogo e humanista holandês Erasmo de Roterdã (1466-1536):
”O ideal que não triunfa na realidade, permanece nela como uma força dinâmica. São precisamente os ideais não cumpridos os que se revelam invencíveis.
Que uma idéia não se faça realidade, não quer dizer que esteja vencida ou seja falsa. Uma necessidade, ainda que demore, não é menos necessária, ao contrário: só os ideais que não se consumaram ou não estejam comprometidos porque não se realizaram, seguem tendo efeito em cada nova geração como um elemento de impulso moral. Só os não cumpridos retornam eternamente".

14 agosto 2009

HAL 9000 (o governo está de olho em voce!)

HAL 9000 é um personagem do escritor britânico Arthur Clarke (1917-2008), famoso por suas obras de ficção científica e, principalmente, pelo filme “2001: uma odisséia no espaço” (1968), do cineasta Stanley Kubrick.
No filme, a bordo da nave espacial Discovery e responsável por todo seu funcionamento, HAL 9000 é, na verdade, um supercomputador.
Dotado de várias câmeras e microfones, nada lhe escapa. HAL fala, faz reconhecimento facial e vocálico, leitura labial, interpreta e expressa emoções, raciocina e joga xadrez.
Desde maio de 2009, “trabalha” em Brasília outro supercomputador que se tornará famoso. Seu nome é CCS, sigla de Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional. Por causa dos poderes e da fama mundial de HAL 9000, os “amigos” chamam CCS de HAL.
CCS, ou HAL brasileiro, também tem poderes fantásticos. Há dois sistemas parecidos no mundo. Um na Alemanha e outro na França. Mas ambos são inferiores ao brasileiro!
O HAL brasileiro reunirá, atualizará e fiscalizará as contas bancárias de todos os brasileiros. Contas abertas, fechadas, movimentadas ou abandonadas em qualquer banco. Pessoas físicas e jurídicas. Pobres e ricos, empresas pequenas e grandes!
Os “amigos” de HAL, os fiscais da Receita Federal, vão cruzar todas as informações que envolvam CPF e CNPJ. Cartórios de imóveis, detrans, bancos e empresas. Terrenos, casas, aptos, sítios e construções. Registro de propriedade de carros, motos, barcos e jet-skis. Cartões de crédito e débito, aplicações, movimentações e financiamentos. Folha de pagamentos, FGTS, INSS, IRRF, compra e venda de mercadorias e serviços, contas de luz, água, telefone, saúde, etc...
O controle fiscal das pessoas e das empresas ficará tão sofisticado que a Receita Federal passará a oferecer a declaração de imposto de renda já pronta, para verificação e validação do contribuinte.
Também os devedores não escaparão. Já foi aprovada a penhora on-line. O juiz decretará instantaneamente e por meio eletrônico a indisponibilidade de dinheiro e bens do contribuinte submetido a processo de execução fiscal.
No combate a fraudes, caixa dois e lavagem de dinheiro, os juízes brasileiros poderão acessar diretamente o supercomputador e verificar as contas que um cidadão ou uma empresa mantêm no Brasil.
Como todas as conquistas científicas e tecnológicas da humanidade podem ser usadas para o bem e para o mal, dependendo de quem as manipule, ao ler e refletir sobre o HAL brasileiro não há como não lembrar do Big Brother orweliano.
Escrito em 1948 pelo inglês George Orwell (1903-1950), o romance “1984” retrata o cotidiano de uma sociedade totalitária sob o regime do Grande Irmão.
Com o objetivo de manter o poder, o meio principal de controle das pessoas é a Teletela. Um televisor bidirecional que permitia tanto ver quanto ser visto, em qualquer lugar, na rua ou na própria casa!
Pensando na nossa realidade social, econômica e política, e em meio a tantos escândalos, escutas telefônicas não autorizadas, invasões de privacidade, denúncias e acusações sem provas, chantagens de todas as naturezas, ações típicas dos jogos e objetivos de posse e poder, o CCS, ou HAL brasileiro, não será nosso futuro Teletela?

07 agosto 2009

Mofo Político

A política sempre provoca a repetição e a renovação de algumas idealizações que não resistem a um exame e confrontação com a realidade.
O estado brasileiro continua sob controle político e econômico de grupos não comprometidos com os interesses e necessidades do povo.
Consequentemente, os marginalizados, pobres principalmente, resolvem seus conflitos do cotidiano fora do espaço público, sem direito e proteção do Estado.
De modo que a violência, sistemática e crescente, e fora dos limites e controles da lei, rege a tudo e a todos.
É unânime que a pré-condição para a superação destas diferenças, notadamente as econômicas e sociais, é a democratização do Estado, a socialização da coisa pública e a popularização da justiça.
Mas a realidade é outra: há falta de entusiasmo, falta de convicções, apatia política, enfim, governantes incapazes de empolgar o povo e renovar as esperanças. Em verdade, são líderes (e candidatos a líderes) muito aquém das necessidades da nação.
Concorre para a desconfiança e apatia popular o fato de que o Estado já não responde pela sociedade como um todo.
Mas o esvaziamento do Estado não significa que suas atribuições tenham-se esgotado, ou que suas responsabilidades sejam menores.
Objetivamente, significa a necessidade de uma reconceituação de competências, assentadas sobre novos modelos de gestão, eficácia e qualidade. Nada a ver com este Estado gigante, ineficiente, expropriador, corrupto e corruptor.
Creio que este é um ponto que os políticos ainda não entenderam. Daí, este cheiro de mofo no ar!

Amigos Para Sempre

Não devia haver surpresas. Havia antecedentes de comportamento. Por ocasião do mensalão, dinheiro na cueca e outros escândalos, Lula já se posicionara do mesmo modo.
Agora, em relação aos seus “novos amigos”, Renan Calheiros, Fernando Collor e José Sarney, o presidente faz uso novamente de métodos inadequados a um presidente da república. Refiro-me a sistemática desqualificação dos acusadores e da imprensa.
O presidente e seus “rasputins” ignoram a opinião pública e peregrinam soberbos na companhia de amigos e aliados apanhados com a mão na bolsa de moedas.
Infelizmente, as atuais formas de poder servem para usurpar, legislar e manipular na manutenção de seus feudos medievais.
Tipicamente fanfarrão, o presidente esquece seu próprio discurso e a dimensão ética do cargo: “Ninguém neste país tem mais autoridade moral e ética do que eu para fazer o que precisa ser feito neste país." (Lula em 21/06/2005).
O PT, completamente submisso e entregue aos prazeres do poder, não reage. A ascensão de um partido de esquerda ao governo, com apoio e legitimidade popular, evidenciara e reacendera a esperança do povo. Em vão!
Por sua trajetória político-sindical, pelo conjunto de seus comprometimentos originais, se esperava que a ascensão de Lula pudesse se constituir numa novidade positiva. Também em vão!