26 setembro 2008

Admirável Gado Novo

A falta de boa educação básica é uma das razões da desigualdade nacional, determinando e contribuindo na segregação social, atingindo e excluindo milhões de brasileiros de oportunidades dignas de vida, trabalho e salários.
Segundo as estatísticas, de cada quatro brasileiros, três não completam o ensino médio. Entre os maiores de 15 anos, 20 milhões são analfabetos.
Outros 30 milhões são analfabetos funcionais - aqueles que conhecem as letras, mas não conseguem ler frases mais longas, nem formular idéias.
Para educar um filho dos 04 aos 25 anos, da pré-escola à universidade, um cidadão de classe média gasta, em recursos próprios ou do Estado, R$ 250 mil.
Esse valor corresponde ao custo médio das escolas particulares na educação básica e no ensino médio, somado ao que o governo gasta por aluno nas universidades públicas.
O filho do pobre, aluno na rede pública municipal ou estadual, custa 80 vezes menos. Mas, então, se gastamos/investimos 80 vezes menos com o que deveria ser a educação básica, como aspirar e desejar gerações preparadas e menos desigualdade social?
O ensino público brasileiro é de baixa qualidade. E o problema central não está na (des)qualificação dos professores, seu estado de ânimo e/ou sua histórica má-remuneração.
Como diz o povo: se a escola pública fosse boa, os filhos dos "hômi" estudavam nela!
É verdade. Geralmente, filhos de políticos e de administradores públicos, mesmo os da área de educação, não estudam em escolas da rede pública. E nem é por bondade – tipo deixar vaga para quem mais precisa.
Há uma evidente contradição nas práticas de gestão governamental. Cuja discussão, aliás, os políticos evitam fazer, centrando seus discursos e ações num conjunto de bobagens legislativas e sem repercussão objetiva no dia-a-dia das pessoas.
Como é possível que a união, estados e municípios, que constroem estradas e viadutos, prédios públicos suntuosos, navios e usinas hidrelétricas, e que têm tamanha eficiência na arrecadação (extorsão) de impostos, não consigam manter escolas públicas de qualidade?
Mais: juntamente com a questão da segurança, da saúde e do (des)emprego, como ousam (com pompa e circunstância) ignorar tamanha carência pública?
Infelizmente, o povo não tem organização, não tem voz, e não tem qualidade argumentativa para exigir serviços públicos. Que dirá serviços de qualidade!
Na exata proporção de sua desorganização, de sua não representatividade política, de sua não ação cívica e cidadã, enfim, do seu conformismo e submissão, é que ocorre o desdém governamental.
Como canta Zé Ramalho, na música Admirável Gado Novo: “... ê, ô, ô, vida de gado, povo marcado, ê, povo feliz... é duro tanto ter que caminhar, dar muito mais do que receber...”

19 setembro 2008

A Índole do Lobo(Teoria da Conspiração?)

Ultimamente, a internet tem sido um excepcional meio de divulgação de insistentes e variadas teorias acerca da ocupação estrangeira de reservas indígenas brasileiras, das ameaças à titularidade da descoberta e exploração de reservas de petróleo, e, mais recentemente, sobre as razões para a presença da Quarta Frota da Marinha norte-americana em águas brasileiras.
Conspiratórias ou não, as teorias correntes tem um sem número de boas razões para provocar nossa desconfiança em torno da movimentação e dos interesses não revelados das grandes potências econômicas e militares.
Face os antecedentes que a história mundial ensina, é inevitável o ressurgimento do debate em torno da natureza do imperialismo.
Aliás, modelo de ação e intervenção que muitos analistas e pensadores julgavam superado haja vista os efeitos colaterais e gerais da globalização e do moderno mercantilismo.
A palavra imperialismo vem do latim “imperator”. Modernamente, surge em 1830 relacionado ao império napoleônico. O sentido pejorativo, comum nos dias de hoje, surge em 1848, graças à política “cesarista” de Napoleão III.
Em 1870, a política de fortalecimento e expansão do império colonial britânico, na administração do primeiro-ministro Disraeli, recebe, igualmente, a denominação de imperialismo.
Com o tempo, sobretudo em função da política externa e expansão inglesa, o significado ficou, definitivamente, claro: imperialismo é o estabelecimento da soberania política de uma nação sobre povos e territórios estrangeiros.
Por motivações geopolíticas e econômicas, de tempos em tempos culturas, civilizações, regimes políticos e nações são ocupadas e aniquiladas por ações arbitrárias de potências militares!
O imperialismo é indiferente às variações de forma ou força. Suas razões e objetivos podem ser econômicos, como podem ser de natureza estratégica quanto à manutenção de poder e preservação de áreas de influência.
Não esqueçamos que a Guerra do Iraque já recolocara na ordem do dia o tema do imperialismo. E mais recentemente, o caso Geórgia versus Ossétia do Sul implicou duelos verbais entre russos e norte-americanos.
No passado, Inglaterra e Rússia (ex-URSS), principalmente, se destacaram por esta prática intervencionista.
A Rússia ocidental impusera-se aos demais povos da comunidade soviética. Não é a toa que se desintegrou em semanas, haja vista que a liderança era mantida apenas pelo poder das armas.
A Inglaterra, todos lembram, era “o reino onde o sol nunca se punha”, tantos eram os territórios sob seu controle.
Já os Estados Unidos, sucessor dos impérios decadentes, é mais esperto e promove a ocupação cultural e financeira. Mas, à distância, ainda vige o signo do aparato bélico.
O lobo muda o pelo, e não a índole!

15 setembro 2008

A Invasão das Mulheres-Fruta

Os espectadores mais velhos lembram d’O Homem do Sapato Branco, de Flávio Cavalcanti, do Chacrinha e suas chacretes, da Dercy Gonçalves e seus palavrões.
Mas a ingênua ousadia do passado não alcança a desfaçatez dos atuais programas de auditório, notadamente àqueles relacionados ao estilo de biguebróderes, gugus, lucianas, leões e ratinhos. Um pânico geral na televisão brasileira. Literalmente!
Ultimamente, acresçam-se as novas celebridades femininas que atendem pelo nome de frutas. As mulheres-melancia, moranguinho, jaca, berinjela, maçã e outras mais. Direto das gôndolas para as revistas e os programas de televisão.
Líderes da preferência nacional, se sucedem as bundas e seios cirurgizados, siliconados e turbinados, em permanente estado de exposição analógica e digital.
De diferentes origens e raças, pequenas e grandes, arrebitados ou não, se revesam nos palcos da vida, rebolando suas razões existenciais e seus ideais artísticos, para além da dança da garrafa.
Têm audiência, planos e objetivos. Existem e repercutem no mundo sócio-econômico, criando estilos e “fazendo” moda. Em suma, toda a nudez não será castigada!
Ironias à parte, a desqualificação geral da programação da televisão aberta está relacionada aos objetivos de quem decide e tem o controle acionário dos negócios.
Trata-se, evidentemente, de manobra comercial que obriga o espectador mais exigente a migrar para a assinatura da TV a cabo.
Mas a massificação e mediocridade da programação é conseqüência também de outras variáveis. Indiretas, mas influentes.
Por exemplo, a multiplicação das opções de lazer eletro-eletrônico (internet, videogame, dvd) oferecido às classes de maior poder aquisitivo afastam-na da programação televisiva comum.
Também, a impressionante queda de preços dos televisores comuns (face à ascensão da televisão digital) facilitou sua aquisição à totalidade da população.
Consequentemente, seja pela falta de opções de lazer condizentes com sua origem, sua inserção social, suas limitações e dificuldades financeiras, principalmente, o povo tem na televisão sua mais expressiva opção de lazer.
Assim, somados baixa escolaridade popular e ausência de outras opções de lazer, resta potencializada a audiência. E o brasileiro é presa fácil e refém da banalização!
Sem cair na tentação da censura e ação governamental, um caminho possível de combate e remoção dessa avalanche de mediocridades consiste no boicote aos produtos dos respectivos patrocinadores.
Regra geral, são empresas e produtos tradicionais, de larga penetração comercial, que não suportariam abalos de imagem.
Se assim não for, os programas deseducadores, desinformativos e desavergonhados continuam e abundam, com perdão do trocadilho!

05 setembro 2008

Conflito e Consenso na Política

Há um aspecto da política vigente que se tem revelado recorrente, insolúvel, danoso e prejudicial aos interesses das comunidades e da nação. Trata-se da negação do conflito. E a construção dos (falsos) consensos.
Inicialmente, o que pode parecer um oportunismo dos políticos, ou uma covardia no trato de desafiadoras e complexas questões, na verdade é um resultado da fragmentação da reivindicação social.
Nós estamos presenciando uma mudança do papel da política. Ela não responde mais, e exclusivamente, pela definição dos rumos sociais. E nem promove os necessários debates e exame de alternativas.
Face à emergência de novos atores que disputam espaços de representação e participação, as diferenças e os ânimos se acirram nos conflitos sociais.
Assim, à falta de respostas e soluções objetivas de parte da política, e sua submissão aos grupos de interesse, determina a ocorrência de uma pressão para que os políticos (e a política) ajam na forma de consenso.
Por improdutividade e insegurança política ou não, resulta um falso consenso. Sacrifica-se o debate e impede-se o conflito a pretexto de que o consenso é positivo. Ou que o conflito é danoso e prejudicial à sociedade. É uma nova ideologia!
Mas é uma falsa ideologia e deve ser denunciada. A carência de debates (e conflitos) gera uma mistificação e, com certeza, traduzirá uma falsa hegemonia de posição e relação de poder.
Por exemplo, há um desequilíbrio gritante entre o Legislativo e o Executivo. Quando não são “comprados”, a exemplo do “mensalão”, políticos se submetem aos pedidos governamentais e renunciam às suas faculdades institucionais.
Abdicam do conflito. Ignoram que a tensão é um fator criativo. Debate e o conflito são condições necessárias para um consenso de fato, em especial naqueles grandes temas que constituem os fundamentos da convivência social.
Mas a “índole do consenso”, que se verá no exercício da representação, constitui-se ao tempo das eleições.
Sucede às reuniões, formações e coligações político-partidárias inimagináveis. “Casamentos” que já não são mais responsabilidade da manipulação dos “caciques”, senão que restam acordados e justificados pelos demais partidários. Na maioria das vezes, de forma unânime!
Semeia-se, pois, desde já, o espírito do consenso. Não é a toa que já não há mais oposição. Organizam-se, em silêncio e pacificação, e restam o estado e a sociedade “capturados”!
De modo que nesses debates pré-eleitorais, creio que seria uma boa oportunidade de se questionar os candidatos, invocando seu compromisso acerca do papel institucional. Afinal, tão importante quanto governar, é exercer a oposição e a fiscalização!