27 junho 2012

Lula, Maluf e Companhias Ilimitadas

O assunto dominante ainda é a união político-partidária do ex-presidente Lula com Paulo Maluf, deputado federal e ex-governador de São Paulo, denunciado pelo Ministério Público brasileiro e réu em vários processos de corrupção, com já identificadas contas bancárias no exterior. Em torno de 200 milhões de dólares depositados em bancos nas Ilhas Jersey, bloqueados pelas autoridades locais. Mas olhando para trás e para os lados, qual é a novidade política e comportamental, antiética e debochada, que já não fosse do conhecimento de todos? Não há novidade nenhuma. Assim como vários outros partidos e candidatos se aliaram a Maluf em outras e diferentes eleições, a exemplo da própria petista Marta Suplicy nas eleições municipais de 2004, o próprio Lula já homenageara e ressuscitara o poder e a influência política de Sarney, Collor, Jader Barbalho e outras figuras nefastas. Ao longo do seu recente mandato presidencial, Lula nunca teve preocupações ideológicas ou ético-seletivas tocante aos seus aliados de ocasião e companheiros em descaminho. Simples perspectiva de manutenção do poder e a desculpa de que o fez em nome da tal da governabilidade. Claro que o “patriótico” Maluf, com certeza, dirá o mesmo. Afinal, se vale para um, vale para todos! Então, a surpresa e a notícia, quando muito, poderia ter sido o silêncio do Partido dos Trabalhadores, sempre tão cioso do debate interno e da crítica ideológica. Mas esse silêncio também não é uma surpresa. O PT está submisso e quieto há muitos anos. Talvez por puro constrangimento. Talvez por conveniência. Ou, talvez, porque não haja mais nada mesmo para ser dito depois de tudo quanto já se viu, ultimamente. Lula, assim como Maluf, Sarney, Collor e outros tantos líderes (eu disse líderes?) políticos, seja nos estados ou nos municípios, sabem, afinal, que nós somos um povo sem memória, tolerante e acostumado ao “deixa-disso”. A verdade é que nós perdemos a noção/a razão de que deve haver sempre uma relação ética entre os fins e os meios. Estamos nos tornando cínicos. Comportamo-nos como condenados a aceitar determinado jogo e realidade porque não podemos mudá-la. Pior: sabemos que isto está errado e que não deve/deveria ser assim. A realidade deixou de ser um desafio e virou um destino. De modo que só nos resta “botar a boca no trombone” e denunciar para todos os cantos que há um descumprimento dos papéis institucionais reservados aos partidos e aos políticos. Isto é, uns de governar, e outros de fazer oposição e fiscalizar, principalmente. Se há uma quebra de confiança e delegação, também é verdade que as eleições e o voto são sempre uma oportunidade para mudar isso. Na política, assim como na vida, a esperança é a última que morre.

20 junho 2012

O Direito de Morrer

Um dos aspectos mais marcantes que estamos tendo a oportunidade de presenciar e (con)viver, atualmente, diz respeito à longevidade humana. É impressionante o número de idosos. Vida longa, graças aos novos conceitos sobre qualidade de vida, evolução da medicina e consumo regrado de alimentos e bebidas. Mas alcançar expressiva idade e com plena saúde é privilégio de poucos. A idade avançada ainda é sinônimo de problemas físicos e mentais, e, consequentemente, de dificuldades na convivência familiar e social. Nesse ambiente, também são comuns os casos de portadores de doenças incuráveis e progressivas, alguns com prognóstico de morte próxima. Desse quadro problemático deriva uma nova, inevitável e urgente questão pública, legal e sociológica: o direito de morrer. Um questionamento legítimo, decorrente e baseado em histórias pessoais e reais e que têm em comum muito sofrimento à própria pessoa, seus familiares e cuidadores. Com certeza, não se trata de egoísmo daqueles submetidos diariamente à tortura e ao sofrimento físico e espiritual em amparar vidas e corpos incapazes de ação, emoção e/ou memória. A extinção da vida envolve vários e diferentes processos. Os mais conhecidos são a ortotanásia, a eutanásia e o suicídio assistido. Conhecedores das respectivas técnicas e habilitados em relação à sua execução, no entanto, os médicos e seus conselhos profissionais enfrentam as restrições e previsões punitivas da legislação penal, além do inevitável debate ético. Em outro nível e extremidade, religiões e seus seguidores argumentam contrariamente à utilização desses métodos embasados em suas crenças espirituais. Exagerada e estupidamente, algumas religiões defendem a provação e o sofrimento, como se isso significasse nobreza e destino celestial. Mas qual pode ser o limite da nossa intervenção na vida alheia? Se é certo tutelar a vida intra-uterina, a vida de bebês e crianças, não é um exagero do estado querer tutelar também o direito de morrer de um adulto? É ético submeter alguém ao sofrimento e à vida artificial, contrariando, por vezes, a própria vontade do doente? Não seria a morte muito mais digna e humana? E não são diferentes de pessoa para pessoa os conceitos e sentimentos sobre o que significa “vida”? Ao negarmos às pessoas o direito à morte, é como se o corpo delas nos pertencesse, como se nos apropriássemos do seu destino. Nós, por nossas interferências e decisões, e o estado, pelas leis restritivas e impeditivas. Tanto em um caso quanto no outro, é um absurdo. Um abuso. Para encerrar o artigo. Pesquisas periódicas revelam que a maioria dos brasileiros é contrária à eutanásia. Em média, 60%. Já no Canadá, 76% da opinião pública é a favor. Na Austrália, 81%. E nos Estados Unidos, 57%. Outra pesquisa. Realizada em 1997 por universidades em hospitais dos Estados Unidos, constatou que: 40% das pessoas doentes morrem sentindo dores insuportáveis; 80% enfrentam fadiga extrema; e 63% passam por grande sofrimento físico e psíquico pouco antes de morrer.

13 junho 2012

O Nome Adequado

A manipulação da verdade e o ilusionismo, ou a própria mentira, nos casos mais graves e extremos, não são uma exclusividade da prática política. São comportamentos e reações tipicamente humanos e podem ter vários e diferentes momentos e razões de ser. De um modo ou de outro, a seu tempo, maneira e circunstância, seu autor provavelmente responderá por seus atos e conseqüências. No campo das relações pessoais e dos pequenos grupos, ato e conseqüência são facilmente localizáveis e, eventualmente, quantificáveis em termos de ônus. Mas quando se trata de questões públicas, que afetam a comunidade como um todo, e cujo ônus, em geral, corre à conta dos cofres e do dinheiro público, isso nem sempre fica claro e responsabilizável. Ou porque a autoria, o ato e sua conseqüência são realmente duvidosos e/ou discutíveis, ou porque não é do interesse de alguns o respectivo questionamento. Politicamente, manipulação da verdade, ilusionismo e mentira também são conhecidos e nomeados como demagogia. Relembrando, com ajuda do Wikipédia: “demagogia é estratégia de obter poder político, (...), por meio de retórica e propaganda, e frequentemente usando temas populistas, (...), propostas e declarações que não podem ser postas em prática, feitas apenas com o intuito de obter benefício eleitoreiro ou de popularidade para quem as promete.” Com o meu pedido antecipado de indulgência aos que acham que sempre exagero nas críticas aos governantes, a exemplo de dois artigos anteriores e recentes – na questão da redução dos juros e na classificação da classe média, hoje trago mais dois exemplos de – no meu entender - ilusionismo e meias verdades. O governo estadual enviou para a Assembléia Legislativa projetos de lei com previsão de aumentos salariais para policiais civis e praças da Brigada Militar(PLs 140, 141, 142 e 143/2012). Não há divergências quanto à necessidade de bem remunerar essas categorias. A questão polêmica é que o governador promete expressivos aumentos não apenas até o final de sua gestão, 2014. Mas muito além, até o final de 2018. Ou seja, promete aumentos de 100, 200 e até 250%, para além de seu mandato e à conta do próximo governador. A realidade econômico-financeira do Estado é caótica, difícil e confusa ontem, hoje e continuará sendo amanhã, e o governo faz promessas para além de seu mandato. Que nome se pode dar a essa prática política? Outro exemplo. Na recém aprovada Lei Geral da Copa do Mundo, o governo federal obriga a FIFA a vender ingressos com desconto de 50% por cento para brasileiros “participantes de programa federal de transferência de renda”. O governo está falando de beneficiários do Programa Bolsa-Família. Mas há algo errado aqui. Não são famílias pobres e com alto grau de carência e dificuldades pessoais? E Bolsa-Família não é uma ajuda com dinheiro de todos os contribuintes? Oferecer desconto e estimular a compra de ingressos de futebol internacional - dinheiro que irá aos cofres da FIFA - não é uma forma de deseducação dessas famílias? Quando um governo defende esse tipo de idéia e prática, tipo pão e circo para o povo, como é nome disso?

06 junho 2012

Voce é "um classe-média"?

No que diz respeito a autopropaganda, governos e governantes são todos iguais. De um modo ou de outro, querem e precisam provar e comprovar ao cidadão (e eleitor!) tudo quanto de bom e útil fizeram em serviços e obras públicas. Regra geral, e nesse intuito, também acham que são “o centro do mundo”, e que todo o progresso e o desenvolvimento sócio-econômico são frutos de sua gestão. Divulgar, informar, esclarecer, entre outras iniciativas, é essencial. Tudo certo, se não acabassem sempre exagerando, se valendo de manipulações e meias-verdades. O governo federal tem exagerado na retórica acerca de sua paternidade nas transformações econômicas e sociais. Principalmente em relação a ascensão de camadas populares a outros e maiores níveis de renda e consumo. Agora ditas como a nova classe média. Primeiramente, importa anotar que a ascensão de determinados grupos se deve muito mais a estabilização da inflação e dos esforços familiares e empresariais do que as iniciativas de governo. Aliás, governos têm extraído cada vez mais recursos das famílias através dos já conhecidos e extorsivos impostos de todas as naturezas. Recentemente, a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE) definiu que integram a classe média brasileira as pessoas com renda familiar per capita (somando-se a renda familiar e dividindo-a pelo número de pessoas que compõem a família) entre cerca de R$ 291 e R$ 1.019. E que representariam 54% da população brasileira. E que as subdivisões dessa nova classe média seriam as seguintes: baixa classe média, com renda per capita entre R$ 291 a R$ 441; classe média, com ganho entre R$ 441 a R$ 641; e classe média alta, com rendimento entre R$ R$ 641 a R$ 1.019. Para chegar a esses números, disse ter levado em consideração o padrão de despesa das famílias e os gastos com bens essenciais e supérfluos. Pergunto: com esses valores e referências, você acha que é “um classe média”? E se você ganha mais do que R$1.019,00 (dou de barbada, e até proponho o dobro, o triplo...), então você é mais do que classe média? Quem sabe, classe B ou A? Você acredita nisso? Vejamos: com esses valores, é possível cobrir os seus gastos com saúde e educação, alimentação e lazer – e quem sabe uma viagenzinha anual? E a prestação da casa própria e do carro, o combustível e todos os impostos, o plano de saúde e o material escolar? E os etecéteras, que são muitos? É lógico que não! Resulta que isso é uma meia-verdade. É manipulação estatística. É pura propaganda. Um artifício para turbinar os feitos governamentais e “colorir” o imaginário popular, sempre tão carente de rótulos e estratificações. E nem precisamos lembrar e discutir os conceitos clássicos e históricos, marxistas ou não, que identificam e nomeiam o que vem a ser classe média. Conceitos que vão muito além de faixas específicas de renda e alcançam relações sociais, grau de escolaridade, qualificação profissional, entre outros igualmente relevante