27 julho 2011

EUA no paredão

Faz algum tempo, fins de 2010, ocorreu um fato extraordinário, porém de pouca repercussão popular. Uma notícia restrita mais ao mundo da economia e dos negócios internacionais.
A notícia em questão dizia que a agência estatal chinesa de avaliação de créditos havia reduzido a avaliação do crédito dos EUA e questionado a sua liderança econômica mundial. Inacreditável, não?
Dito de outro modo, o que aconteceu foi que a China denunciou a fragilidade, a deterioração e a incapacidade de pagamento norte-americana de suas dívidas. E por quê?
Porque a China é, atualmente, o maior credor dos Estados Unidos. Detentora da maior parte dos títulos da dívida pública norte-americana. Quem diria: a ditadura comunista chinesa, ontem seu “maior inimigo” mundial, hoje é seu maior “acionista”.
A notícia de 2010 recupera sua atualidade e importância nos dias de hoje e seguintes. Ocorre que estamos assistindo o apelo do presidente Obama (Partido Democrata) junto ao Congresso norte-americano para aumentar a capacidade nacional de endividamento.
Contra a vontade dos republicanos – partido de oposição - sempre tão ciosos em torno do equilíbrio orçamentário e do bom estado das contas públicas.
A dívida interna dos EUA atinge a cifra estratosférica de 14 trilhões de dólares. Se ocorrer a autorização de aumento do endividamento - e vai acontecer, haverá uma emissão adicional de moeda. Bilhões e bilhões de dólares. Sem lastro. Moeda sem fundo.
É o dólar “fake” (falso, em inglês)! Essa é a razão da preocupação chinesa. E com certeza também uma preocupação a mais para as autoridades brasileiras, haja vista que o Brasil recebe diariamente “rios” de dólares, cada vez mais desvalorizados.
Doláres à procura dos nossos altíssimos juros (hoje, o juro norte-americano é de apenas 0,25% ao ano!). A inundação de dinheiro norte-americana desestabiliza o câmbio e perturba nosso comércio.
Estados Unidos e China são a grande ameaça ao comércio e estabilidade mundial. Um por sua dívida pública e iminência de cair em profunda recessão. E o outro por seu “monopólio comercial mundial e por sua moeda artificialmente subvalorizada. Os dois campeões em manipulação de moeda nacional.
O gigante à beira da recessão precisa repensar sua relação com o mundo. Precisa reavaliar seus gastos militares. O governo Obama já levou uma surra eleitoral recentemente. Precisa desesperadamente reduzir o desemprego. Mas de que jeito?
Desde 1945, os EUA comandam o mundo financeiro e comercial mundial. Maior que a força de seu armamento e de suas incursões bélicas, é a força de sua moeda. O poder mundial do dólar.
Será que assistiremos o fim da hegemonia norte-americana? Não acredito. A economia norte-americana é muito diversificada, dinâmica, ágil e versátil.
Não é a toa que seu Produto Interno Bruto (PIB) totaliza anualmente US$14,624 trilhões. É igual a soma dos gigantes China (US$5,745), Japão(US$5,390) e Alemanha (US$3,305). Ou então, a soma de sete Brasis (US$2,023)!

26 julho 2011

Quebra de Confiança

O Brasil é uma república. A palavra república vem do latim “res publica”. Significa coisa pública, que é de todos.
Liberdade, participação dos cidadãos, submissão às leis e ação limitada do estado são algumas das características institucionais de uma república.
O regime republicano brasileiro vigora desde 1889. Embora passado tanto tempo, a república brasileira ainda tem um grande inimigo. A corrupção!
Nossa idéia mais comum sobre corrupção está relacionada a desvio de dinheiro público, ou coisas materiais, por um funcionário, um administrador ou um político desonesto. Basicamente, sempre relacionada às coisas públicas, não privadas. Mas esse não é o maior crime do corrupto.
Seu maior crime é “matar a confiança”. A confiança é o núcleo do ideal republicano. A confiança é o principal bem em comunidade. A corrupção elimina a confiança de um cidadão no outro.
De modo que a nossa indignação está erradamente focada na questão do dinheiro. Imprensa e judiciário, principalmente, também cometem o mesmo erro.
Mas porque toleramos a corrupção se ela degrada os bons costumes sociais, e, principalmente, o alicerce da república?
Histórias de outras épocas e nações falam de cidadãos que se orgulhavam da república e davam suas vidas por ela.
Hoje impera o individualismo. Em detrimento do engajamento público e político, a vida privada se ampliou. Trabalho, lazer e valores éticos são medidos a partir do indivíduo. E não do interesse social.
A idéia e a prática da coletividade para nós é uma abstração, um sacrifício. Nada que exija sacrifícios e custos pessoais tem chance de prosperar.
Perdemos a compreensão e a dimensão do interesse público e social. Não acreditamos no coletivo, nem no ideal republicano.
Significa dizer que costumes (ética, não corrupção, ideais públicos) não são mais garantidores e fundadores da república.
E se a república tem um ideal coletivo e valoriza o bem comum, que significa o compromisso de todos com todos, a corrupção é sua negação.
A corrupção realiza a degradação de bons costumes e “rouba” bens indivisíveis como a virtude, o direito e o ideal comunitário, valores que nos enriquecem coletivamente.
O principal prejuízo causado pela corrupção é a quebra de confiança. Seja a confiança de uma pessoa na outra, seja a confiança nas autoridades e nos demais representantes da sociedade.
Sem confiança não há república. Hoje, atual e infelizmente, nossa república é só de nome. Uma miragem. Uma farsa!
Urgentemente precisamos reinventar o respeito ao próximo e ao interesse coletivo. Recuperar ética e socialmente o ideal de que há algo em comum entre nós.
É o que eu tenho a dizer aos governantes, sempre tão centrados e ciosos com seus fantásticos planos de governo. Simplifiquem e priorizem o combate à corrupção!

20 julho 2011

11 tá bom: causa e consequência

Quando a democracia representativa ensaiava seus primeiros passos, os mandatos parlamentares eram gratuitos.
Ou, então, na melhor das hipóteses, deputados e vereadores eram simplesmente indenizados das despesas inerentes ao desempenho de suas funções.
Porém, o tempo e a experiência ensinaram que a gratuidade descaracterizava o sistema representativo, eis que reservava, regra geral, os mandatos às pessoas ricas e abastadas. Ou, então, aos seus "testas-de-ferro".
De modo que no século XVIII, principalmente na Inglaterra e na França, firmou-se o princípio de que o ressarcimento e a indenização eram devidos pela nação e paga pelo tesouro público.
Mas, mesmo assim, o povo sempre reclamou dos “salários” e dos gastos dos seus representantes. Em todos os lugares e em todos os tempos.
A verdade parece ser que essas discussões sobre número de vereadores, assessores, vantagens, remuneração e horas trabalhadas, somente adquirem relevância e publicidade – e reclamações do povo - na exata proporção da incapacidade (e não dedicação) dos políticos darem conta de suas tarefas.
E isso vale não apenas para Santa Cruz do Sul, mas vale também para a absoluta maioria das câmaras de vereadores dos milhares de municípios brasileiros.
Para exemplificar e fundamentar a desconfiança e a inconformidade popular, poderíamos simplesmente perguntar:
O que tem sido feito sobre e em torno da fiscalização dos atos e as contas do Poder Executivo?
E sobre o estado geral do patrimônio público (imóveis, máquinas, móveis e equipamentos)?
E sobre a quantidade, recrutamento e qualificação do quadro de servidores públicos?
E sobre as necessidades urbanas estruturais, a ocupação territorial e a qualidade de vida dos cidadãos?
E sobre as políticas públicas de conservação ambiental e qualidade de convivência entre os cidadãos?
E sobre as perspectivas sócio-econômicas futuras da municipalidade e da população?
E sem esquecer, é lógico, o compromisso com os princípios de ampla publicidade, economicidade, zelo pelo dinheiro público, enfim, todos aqueles comandos, adjetivos e substantivos constitucionais previstos e jurados na posse.
E vai por aí afora. Assunto não falta. São apenas alguns exemplos entre as dezenas de tarefas objetivas e potenciais destinadas aos representantes públicos.
Mas percebam, por favor, que não estou falando de eventuais “pitacos e chutes”, típicos das atuações cenográficas e limitadas à tribuna.
Estou me referindo a mobilizações públicas e setoriais, motivadas e embasadas em estudos sistemáticos, programáticos e científicos.
Tenho certeza que a comunidade, cidadãos e contribuintes, não questionariam o número de vereadores e seus respectivos gastos se o nível de resolução das questões públicas fosse melhor e mais compromissado.
Não é o que se vê. E não é o que se acredita. Muito pelo contrário. Resumindo, a discussão sobre o número de vereadores é apenas uma conseqüência.
E por quê? Porque partidos e parlamentares não têm correspondido às expectativas e necessidades do nosso povo!

13 julho 2011

Humor e Receita de Bolo

Durante a ditadura militar e plena vigência da censura, episodicamente alguns jornais continham receitas culinárias no lugar de reportagens ou opiniões previamente proibidas pelos censores militares. Às vezes, eram páginas inteiras!
A página em branco ou uma publicação substitutiva e alternativa era um tipo de denúncia e protesto de viés irônico e humorado, imediatamente percebida pelo leitor e cidadão.
Hoje e agora, em meio aos sucessivos escândalos de corrupção e mau uso do dinheiro público, a exemplo da orgia dos pré-gastos da Copa do Mundo, também faço meu alternativo protesto publicando um divertido texto (cujo autor desconheço) coletado na internet.
E porque um texto alternativo? Porque não adianta falar mais nada mesmo. Nada acontece. O povo está anestesiado com a propaganda oficial e ocupado em “tocar” a própria vida. O Poder Legislativo já não existe mais, eis que cooptado pelo Poder Executivo. E o Poder Judiciário...bem, como sempre, mais preocupado com suas entranhas e seus salários!
Eis o meu texto alternativo: “Prezado técnico de informática, há um ano e meio troquei o programa “Noiva 1.0” pelo “Esposa 1.0” e verifiquei que o programa gerou um aplicativo inesperado chamado “Bebê.exe” que ocupa muito espaço no HD.
Por outro lado, o “Esposa1.0” se auto-instala em todos os outros programas e é carregado automaticamente assim que eu abro qualquer aplicativo.
Aplicativos como “Cerveja Com A Turma 0.3”, “Noite De Farra 2.5” ou “Domingo De Futebol 2.8”, não funcionam mais, e o sistema trava assim que eu tento carregá-los novamente.
Além disso, de tempos em tempos um executável oculto (vírus) chamado “Sogra 1.0” aparece, encerrando abruptamente a execução de um comando. Não consigo desinstalar este programa!
Também não consigo diminuir o espaço ocupado pelo “Esposa 1.0” quando estou rodando meus aplicativos preferidos.
Sem falar também que o programa “Sexo 5.1” sumiu do HD. Eu gostaria de voltar ao programa que eu usava antes, o “Noiva 1.0”, mas o comando “Uninstall.exe” não funciona adequadamente.
Poderia ajudar-me? Por favor!”

Resposta do técnico:
“Prezado senhor, sua queixa é muito comum entre os usuários, mas é devido, na maioria das vezes, a um erro básico de conceito: muitos usuários migram de
qualquer versão “Noiva 1.0” para “Esposa 1.0” com a falsa idéia de que se trata de um aplicativo de entretenimento e utilitário.
Entretanto, o “Esposa 1.0” é muito mais do que isso: é um sistema operacional completo, criado para controlar todo o sistema!
É quase impossível desinstalar “Esposa 1.0” e voltar para uma versão “Noiva 1.0”, porque há aplicativos criados pelo “Esposa 1.0”, como o “Filhos.dll”.
“Filhos.dll” também não podem ser deletados, ocupam muito espaço e não rodam sem o “Esposa 1.0”. É impossível desinstalar, deletar ou esvaziar os arquivos dos programas depois de instalados.
Você não pode voltar ao “Noiva 1.0” porque “Esposa 1.0” não foi programado para isso. Alguns usuários tentaram formatar todo o sistema para em seguida instalar a “Noiva Plus” ou o “Esposa 2.0”, mas passaram a ter mais problemas do que antes.
Leia os capítulos “Cuidados Gerais” referente a “Pensões Alimentícias” e “Guarda das Crianças” no software “CASAMENTO”.
Uma das melhores soluções é o comando “DESCULPAR.EXE/flores/all” assim que aparecer o menor problema ou se travar o programa.
Evite o uso excessivo da tecla “ESC-escapar”. Para melhorar a rentabilidade do “Esposa 1.0”, aconselho o uso dos utilitários “Flores 5.1”, “Férias No Caribe 3.2” ou “Jóias 3.3”. Os resultados são bem interessantes!
Mas nunca instale “Secretária De Minissaia 3.3”, o “Antiga Namorada 2.6” ou o “Turma Do Chope 4.6”, pois não funcionam depois de ter sido instalado o “Esposa 1.0” e podem causar problemas irreparáveis ao sistema.
Com relação ao programa “Sexo 5.1”, esqueça! Esse roda quando quer. Se você tivesse procurado o suporte técnico antes de instalar o “Esposa1.0”, a orientação seria: Nunca instale o programa “ESPOSA 1.0” sem ter a certeza de que é capaz de usá-lo!”

08 julho 2011

"Armários" existenciais

Compreendo o estado de surpresa e estupefação de muitas pessoas com a emergência de uma agenda público-privada absolutamente inovadora em torno dos direitos de minorias. Algumas minorias nem tão minoritárias, a exemplo de gays e lésbicas.
A rigor e em verdade, nem são assuntos assim tão novos e surpreendentes. Basta percorrer a história de muitos povos e nações.
Em algum momento, eram os escravos, os indígenas, depois as mulheres, os negros, entre outros. Quando não ignorados, apenas modestos coadjuvantes da história.
Existências e manifestações restritas à esfera privada. E olhe lá. Ou como se diz hoje, presos aos “armários”. Os “armários” existenciais!
Na base de tudo e de todas as adversidades, um sério questionamento dos modelos patriarcais e graníticos da sociedade e a sistemática negativa de assunção de novos sujeitos políticos.
Estigmatizados e rotulados, tornados socialmente invisíveis e desconstituídos (e desprovidos) de desejos e necessidades.
O despertar dos sujeitos e a fragilidade das razões impostas fizeram das maciças paredes dos armários frágeis vidros e portas escancaradas.
A politização da vida privada provoca a iluminação das questões e suas conseqüentes polêmicas. Questões habitualmente complicadas pelo estado, governos e igrejas, histórica e intrinsecamente conservadores.
Assim aconteceu com as questões tocantes às mulheres: planejamento familiar, cuidados e proteção dos filhos, direitos políticos, trabalhistas e sexuais, entre outros.
O mesmo ocorre agora com a questão dos homossexuais. É o fim da clássica distinção entre o "dentro" e o "fora", o “privado" e o "público”.
Entretanto, apesar dos largos e consistentes passos, não tenhamos ilusões. A jornada é árdua e longa.
Tanto na dimensão estatal quanto nos demais planos de organização social, a marca, a regra ainda é a desigualdade e o preconceito. Sejam de gênero, classe social, orientação sexual ou raça.
E na superação e amplificação dos conflitos – entre esfera pública e privada e a inter-relação da moral, do direito e da política - tem papel fundamental a imprensa. Assim ensinou o grande filósofo alemão Jürgen Habermas.
Simplificando, Habermas disse que a imprensa, a mídia, é um espaço, é uma arena em que os cidadãos privados se apresentam e se colocam como públicos para debater questões e influenciar processos de decisão política.
E que esse local, com certeza, se constitui fora da vida doméstica, das igrejas e dos governos.