28 janeiro 2011

Linha de Montagem

Hoje e mundialmente, há um assunto que suscita curiosidades, pesquisas, discussões e preocupações muito intensas. Preocupações públicas e privadas. Governamentais e familiares. Refiro-me a educação.
E entre os vários motivos e fatores que determinam o surgimento de interrogações e afirmativas, mais dúvidas do que certezas, destacam-se o fator econômico e o fator cultural.
Afinal, como deve(re)mos educar e instruir as crianças de modo que tenham um lugar digno e produtivo (e capaz de alcançar o sentimento de realização pessoal) nas estruturas de trabalho e economia do século 21?
Trata-se de uma tarefa muito complexa haja vista que a própria economia tem-se mostrado extremamente dinâmica e transformadora em seus modelos de organização, produção e comercialização.
E há a preocupação de natureza cultural, em sentido amplo. Afinal, a educação se constitui em alicerce da assimilação, consolidação e transmissão de valores e identidades culturais dos povos.
Aliás, hoje mais do que em época alguma, o fortalecimento dos valores sócio-culturais locais surge como uma forma de enfrentamento do processo de globalização. Refiro-me ao que considero negativo na globalização cultural: a “pasteurização” e padronização por motivos comerciais.
Voltando às crianças (e jovens) e à educação. Então, basicamente, o problema é que estamos e continuamos fazendo as mesmas coisas que fazíamos no passado e, mantido o processo educacional, alienando os alunos.
De modo que o discurso recorrente e mais comum gira em torno de qualificação de professores e elevação dos padrões de exigência.
Mas de que padrões estão falando? Vamos elevar os padrões de um sistema de educação que foi pensado, concebido e estruturado em outra época? É um tempo que já não existe mais!
Tanto a cultura quanto o pensamento econômico foram estabelecidos e construídos sobre necessidades e estruturas sociais do passado. E nem vou falar de (equivocadas) ideologias político-ideológicas e preconceitos étnicos, raciais e classes sociais inaptas. Esdrúxulos, absurdos, ridículos ou não, tinham sentido dentro de sua época, bem ou mal.
Mas hoje não é mais assim. Estamos vivenciando um dos períodos mais ricos da humanidade. Notícias, informações, entretenimento e interatividade pessoal e coletiva. Um tsunami de conhecimento e informação.
E no centro do tsunami, a criança e o jovem de hoje. Em casa, principalmente, em sua “ilha” tecnológica composta de computador, celular, iphones, ipod e centenas de canais de TV, entre outros recursos.
Mas, na real, o que está acontecendo? Os pais e professores estão dizendo que as crianças estão distraídas, desatentas e desinteressadas.
Entre parênteses: já observaram o que tem de criança tomando remédio por conta de um suposto transtorno do déficit de atenção?
As crianças e jovens nunca estiveram tão “ligados”. Estão distraídos na escola porque a escola está chata!
Mas não me peçam para enumerar as razões porque a escola é chata. Os especialistas sabem melhor disso. Vou dizer só uma frase: a escola atual é uma desumana e estúpida linha de montagem!

13 janeiro 2011

Governo? Tô dentro!

Encerrado o processo eleitoral e declarados os vencedores, assistimos – e continuamos assistindo – a montagem dos governos, tanto estaduais quanto o federal.
E entre movimentos e ações de todas as naturezas, corretas e incorretas, éticas e aéticas, fisiológicas e oportunistas ou não, destacam-se aquelas que indicam evidentes e gritantes distorções.
É o caso de partidos superados eleitoralmente que passam a integrar governos e maiorias parlamentares quando deveriam estar na oposição. Ou, ao menos, fora do governo!
Afinal, essa é a razão do processo eleitoral. Determinar quem vai governar e quem vai exercer a oposição e a vigilância das contas públicas. É o núcleo de nosso sistema democrático e político-partidário.
Mas como o povo tem pouca informação e memória curta, ninguém leva a sério esse quesito. Conseqüentemente, e sabedores dessa realidade, os detentores do poder tendem a desdenhar e corromper o sistema idealizado.
Em sua defesa, os governantes (e cooptadores) definem o procedimento como necessário para a governabilidade.
E de parte dos adesistas há vários argumentos. Dizem, por exemplo, que é preferível optar por cargos e responsabilidades que assegurem participação positiva (e belos orçamentos!).
Dizem mais: que as alianças de hoje são como uma vacina antioposição a ser usada no futuro, embora saibam que a política seja totalmente incoerente. Afinal, o “amigo” de hoje pode ser o “inimigo” de amanha. E vice-versa.
Agora falo eu: não concordo com nada disso. Este método de composição de governo e formação de maioria parlamentar, que eu prefiro chamar de construção de (falsos!) consensos, tem-se revelado recorrente, insolúvel, danoso e prejudicial aos interesses do povo brasileiro.
Resulta disso que o debate é sacrificado e impede-se o conflito a pretexto de que o consenso é positivo. Ou que o conflito é danoso e prejudicial à sociedade.
É como se fosse uma nova ideologia. Mas é uma falsa ideologia e deve ser denunciada. A carência de debates (e conflitos) gera uma mistificação e, com certeza, traduzirá uma falsa hegemonia de posição e relação de poder.
Políticos e partidos que se submetem aos “pedidos” governamentais e que optam por simples adesão, em verdade renunciam às suas faculdades e deveres institucionais. Isso quando não são “comprados”, a exemplo do “mensalão”.
Reiteradamente, o que temos assistido? Termina a eleição e já estão “entendidos”. Organizam-se em silêncio e pacificação. E resta o estado e a sociedade “capturados”.
O resultado de tudo isso é que a política perde seu sentido. Embora preserve sua institucionalidade e suas exigências sociais, a política fica desmoralizada por essas negociações e essas adesões.
Debate e o conflito são condições necessárias para um consenso de fato, em especial naqueles grandes temas que constituem os fundamentos da convivência social.
Afinal, esquecem que tão importante quanto governar, é exercer a oposição e a fiscalização. Não é que esqueçam. Não fazem questão de lembrar!

06 janeiro 2011

O Enigma Michel Temer

Quando novos governos e governantes assumem sempre há imediatas especulações sobre a natureza do poder real presente e futuro, sobre os prováveis detentores do poder de fazer ou deixar de fazer.
Em relação ao governo Dilma, há algumas divagações - e certezas - acerca da capacidade de articulação e envolvimento do vice-presidente Michel Temer.
Várias vezes apontado como o mais influente parlamentar brasileiro, Temer é doutor em direito e autor de livros jurídicos, deputado há décadas e presidente da Câmara dos Deputados duas vezes. Controla a “máquina” do PMDB e o Congresso. Comanda um partido fortalecido e guloso.
Regra geral, no presidencialismo a figura do vice é responsável pela articulação e promoção de alianças políticas e ampliação de palanques eleitorais.
Historicamente, os melhores vices-presidente sempre foram aqueles de conduta mais discreta, sem excessos midiáticos, e sem intromissões que pudessem atrapalhar um presidente e seu governo. Em resumo, sem maiores ambições eleitorais. Não é o caso de Michel Temer!
Dilma Roussef nunca teve mandato parlamentar. Novata no PT, foi uma candidata inventada por Lula. Tudo porque Lula não queria ficar dependente de ninguém. Como de fato não ficou. Fez sua aposta e venceu.
Então, o que temos? Qual a situação que se apresenta agora? Uma combinação surpreendente, inédita e temerária: uma presidente sem experiência parlamentar cujo vice é um político pleno de mandatos e dono de um partido grande, ainda que confuso. Mais confuso que grande!
Para que Dilma não reste “escravizada” por Temer e o PMDB, urge a reorganização do PT. O episódio “mensalão” fragmentou a “inteligência” partidária e pulverizou o debate interno.
O vendaval que atingiu Luiz Gushiken, Antonio Palocci e José Dirceu repercutiu em todo o partido. Alias, foi o fato determinante que permitiu que Lula se impusesse (na escolha de Dilma, principalmente), sem contestação partidária.
Não esqueçamos que à época da crise do “mensalão”, o deputado estadual gaucho Raul Pont propusera uma refundação do partido, ocasião em que enfrentou Ricardo Berzoini nas eleições internas (e perdeu).
Mas agora é outro momento, e para o bem de Dilma e seu governo o PT precisa recuperar sua independência. Precisa recuperar urgentemente a qualidade e o debate interno sob pena de se transformar num partido amorfo, submetido pelo empreguismo e o clientelismo político.
Claro que burocrática e eleitoralmente o PT se mantém forte e ativo, com expressivo tempo de televisão e disciplina partidária. Também, e afinal, agora tem grandes fontes de financiamento, principalmente de grupos patronais que antes não o financiavam.
Mas Dilma sabe que sua indicação e conquista presidencial é fruto desse vazio partidário pós “mensalão”. De modo que precisará do partido por completo, livre e forte.
Sob pena do PMDB – leia-se Michel Temer – realizar e exercitar um vice-presidencialismo ativo e protagonista. Naquilo que o PMDB tem de pior: o fisiologismo e o oportunismo!

04 janeiro 2011

Mundo Cão (sobre cães, higiene pública, donos e solidão)

Vivemos uma época de profunda impaciência, incompreensão e solidão humana, tempo e lugar em que, conseqüentemente, para muitas pessoas os animais são destinatários quase preferenciais de devoção e afeto. Até aí, nada demais. Afinal, quem não gosta de bichinhos?
Entretanto, percebe-se um quadro de notáveis exageros. E não apenas porque gastam fortunas na manutenção, enfeite e priorização de seus bichinhos - vejam só o crescimento do setor de pet-shop. De todo modo, e ainda assim, continua sendo uma respeitável questão e preferência pessoal. Cada um gasta seu dinheiro como quiser.
O mais grave, entretanto, é o desrespeito às demais pessoas. Crianças, principalmente. Não por acaso os condomínios, os parques e as ruas estão tomados de animais e sua urina e fezes.
E nem falei das feras e dos riscos inerentes à sua circulação em lugares públicos. Aliás, quanto às feras em destaque – a exemplo de pitbulls, rottweilers e dobermanns, há uma questão elementar, rudimentar, que alguns donos não compreendem, qual seja: são animais, irracionais, não dominamos, nem compreendemos suas reações e seus limites!
O que pode levar alguém a imaginar que o mais singelo bichinho pode ser controlável? Que linguagem animal é esta que os donos supõem dominar a ponto de cogitar/controlar/dialogar com seus bichos e suas reações ancestrais e atávicas?
Tudo muito óbvio, certo? Errado. Seja por razões de higiene pública, seja por razões de segurança das pessoas, qualquer óbvia reflexão e ação que deveriam suceder-se são impossíveis. Ai de quem fizer uma crítica.
A resposta mais comum que ocorre aos donos é que “quem não ama os bichos, não ama as pessoas!”. Ainda que uma coisa não tenha nada a ver com a outra.
Neste sentido, é lastimável o que está ocorrendo nas ruas e nos principais parques da cidade, a exemplo da Redenção, do “Parcão” e da Praça da Encol. E só como exemplo. Porque o problema é generalizado.
Literalmente, tratam-se, agora, de espaços públicos para reunião de cães e seus donos. Conseqüentemente, os demais usuários devem adivinhar se o cão é manso ou não – explique isto para uma criança! Pular e/ou desviar da guia esticada– sim, por que tem donos que não recolhem a guia à passagem das pessoas! Olimpicamente, desviar e/ou pular sobre as fezes.
Bucolicamente sentar na grama de um parque sem um detalhado exame, nem pensar. Usar o bebedouro de água, nem por ordem médica!
Talvez fosse o caso de reclamar ao poder público. Poderes Públicos! Embora a sugestiva sonoridade, que sugere autoridade, é um eufemismo.
Com certeza, são “os tempos”. Essa estranha modernidade. Afinal, cães já comem melhor que muitos brasileiros, têm assistência médica, já se vestem melhor e, ultimamente, tem até personal trainer. E parques!

01 janeiro 2011

Governo Tarso Genro - meios e fins - II

Depois de fazer uma análise da composição do futuro Governo Tarso Genro, principalmente sobre sua opção em recrutar políticos experientes em detrimento de técnicos (a exceção de dois ou três), prossigo com alguns comentários sobre a natureza das contas públicas.
Hoje, de cada três reais arrecadados pelo Estado, dois reais estão automaticamente comprometidos com vinculações constitucionais. E o real que sobra não cobre as demais despesas. E ainda não falamos em investimentos.
De modo otimista, a receita estadual precisa crescer 25% para alcançar 0% de investimentos. E de modo ainda mais otimista, crescer 50% na receita para garantir a possibilidade de 10% de investimento. Será possível?
É lógico que o PT não vai dar créditos para a governadora Yeda. Nunca deu para ninguém. Mas Tarso recebe as contas públicas em estado bem melhor que todos os governadores anteriores. O que pode ser útil do ponto de vista da administração. Mas, não significa o fim dos números negativos.
Há um conjunto terrível a ser enfrentado para recuperar capacidade mínima de investimentos futuros. Alta despesa fixa, precatórios pendentes, crédito aos exportadores (2 bilhões!), entre outros débitos gigantes. No conjunto, 2010 fecha com um déficit de 5,4 bilhões. A projeção para 2011 é um déficit total de 6,5 bilhões.
E nem falamos sobe o impacto das vinculações constitucionais. Aliás, trata-se de uma ficção orçamentária que permanente é objeto de manipulação político-eleitoral. Todo governante finge que executa. A oposição grita e denuncia, para depois no governo fazer igual. Demagogia pura!
Considerado o cenário geral de pouca receita e muita despesa, minha primeira crítica ao Governo Tarso, assim como já fizera em relação ao Governo Lula (e agora Dilma repete o erro!), diz respeito a sua opção pelo excessivo número de Secretarias de Estado.
Elementar e obviamente, significa excesso de despesas, manipulações políticas e perda de mobilidade administrativa e gerencial.
Em geral, os governantes Insistem em confundir ação de estado com tamanho de estado. Deveria haver mais gestão por objetivos, por metas específicas. Mais desestatizações. Mais concessões, permissões, autorizações e, agora muito comum, as parcerias público-privadas.
Eu lamento profundamente a falta de coragem de nossos governantes. De todos os governantes. Falta ousadia, falta inovação. Temem quebrar conceitos históricos (e antiquados!).
Por exemplo: a propriedade é secundária. O que importa é a oferta de bens e serviços de utilidade pública. De uma forma ou de outra tudo tem seu preço. Seja através dos impostos, seja através de pedágios, por exemplo.
Melhor pagar por cada uso, do que repassar bilhões aos governos. Governos que historicamente são maus gerentes, relapsos e descuidados com a qualidade do gasto público.