23 abril 2010

Bras-ilha da fantasia

Quarta-feira, dia 21 de abril, o Brasil comemorou os 50 anos de fundação da cidade de Brasília, a capital da república brasileira.
Com a proclamação da república (1889), e o fim da monarquia, os líderes republicanos queriam tirar a capital do Rio de Janeiro. O Rio era considerada uma cidade monarquista e simpática à família real.
Razão pela qual já nos debates políticos de 1890, e, consequentemente, na própria Constituição Federal de 1891, é anotada a idéia da transferência da capital. Fato que só se concretizou em 1961, durante o governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961). Setenta anos depois.
A interiorização da capital também seria uma forma de estimular a colonização do cerrado – uma imensa região desabitada – e promover seu desenvolvimento social e econômico.
Para a decisão definitiva de construir e transferir a capital (1956), também conta o fato de Kubitschek desconfiar do clima golpista que se vivia no Rio de Janeiro, sede de vários quartéis e clubes militares.
Parênteses: o pós-guerra mundial, a guerra fria entre russos e norte-americanos, a revolução cubana e nossas crescentes demandas sociais geravam, à época, efervescentes debates e provocações político-partidárias, colocando permanentemente em xeque o governo de Juscelino. De fato, o temido golpe militar ocorreu em 1964!
A construção de Brasília foi e é um dos maiores absurdos da história brasileira. Talvez o maior de todos os escândalos.
Construir uma cidade no meio do nada custou muito caro aos cofres públicos. Contribuiu para o aumento da divida externa. Já naquela ocasião usaram o dinheiro da previdência social.
Isso sem falar nos roubos, nas negociatas, nas dezenas de notas frias emitidas para uma mesma carga de ferro, cimento e tijolos, destinados aos imensos canteiros de obras.
E tão grave quanto gastar o que foi gasto para construir uma cidade artificial, no meio do nada, foi, depois, realizar a transferência de milhares de funcionários públicos.
Com todos os seus direitos ampliados e garantidos, direito de moradia, direito de ressarcimento de pagamento de aluguel, diferenças salariais por conta de mudanças, uma série de adicionais que depois foram incorporados nos salários básicos e geraram aposentadorias milionárias.
Brasília é uma conta que os brasileiros continuam pagando até os dias de hoje. Talvez um dia algum economista, algum contabilista, possa calcular a dimensão financeira do rombo.
Mas o maior crime cometido na construção de Brasília, cometido na transferência do poder político de uma cidade para outra, tirando a capital de uma metrópole e levando-a para o meio do nada, uma cidade de servidores públicos, foi afastar o povo do jogo político.
O povo foi afastado da oportunidade de realizar pressão no dia-a-dia sobre os parlamentares e governantes. Foi alijado da influência nas decisões de interesse nacional.
Na transferência da capital, na inauguração de Brasília, começa a decadência definitiva da qualidade de representação político-partidária nacional, hoje tão evidente.
O afastamento do povo, dos sindicatos e dos demais meios de pressão política determinou o acomodamento dos políticos.
Brasília é uma cidade de profissionais da política. Que vivem exclusivamente da e para a política. Quando a Capital era no Rio, era possível ao parlamentar manter a profissão de origem e seu mandato concomitantes, continuar próximo do povo, conviver no dia-a-dia, atento a realidade e exercendo sua autocrítica.
Hoje isso é impossível. Brasília é uma ilha. Imune e indiferente. Aliás, esse distanciamento e isolamento ajudam a explicar a sucessão e os crescentes escândalos e casos de corrupção.
De modo que não vejo razões para comemorar o aniversário de Brasília!

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