18 julho 2012

Festa de Outubro

Um amigo pessoal, inteligente, irônico e “viajado”, dizia que bastava conhecer uma festa popular do interior do estado para saber como seriam as demais. Porque me lembrei disso? Ao tomar conhecimento da relação de atrações nacionais da próxima Oktoberfest de Santa Cruz do Sul. Bandas de música popular brasileira, roqueiros especialmente, mas também pagodeiros e duplas de música sertaneja. Sem pretensão de julgamento prévio ou caracterização de preconceito musical e cultural, não são atrações que tenham alguma relação objetiva com o centro e a razão de existir dessa festividade típica. Máximo Gorki (1868-1936), poeta e romancista russo, já dizia que “se queres ser universal, fale de tua aldeia”. O também russo Anton Tchekhov (1860-1904), médico e escritor, disse algo parecido: “canta a tua aldeia e cantarás ao mundo”. Há quem diga que essas frases teriam tido inspiração em reflexões do grande filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), que, reza a lenda, nunca teria saído de sua então pequena cidade Königsberg. Mas, mesmo assim, Kant tornou-se universal! Até parece que esses humanistas e escritores estavam dotados de poderes premonitórios e adivinhatórios. Como se soubessem que o mundo caminharia não só para a globalização dos negócios, mas para a “pasteurização” e padronização sem limites dos hábitos de consumo e comportamento humano. Como se soubessem que adviria o momento de destacar o valor das coisas locais, das próprias origens, dos costumes, dos idiomas, dos hábitos, de suas idéias, entre outros aspectos, isso que popular e costumeiramente chamamos de cultura de um povo. Naturalmente, não preciso falar sobre as origens históricas de povoação e cultura local, sobre o que poderia vir a significar a “oktoberfest” e sobre o que se pretenderia com tais iniciativas, ditas de viés sócio-cultural. Mas, observada a prática organizativa e festiva (com a exemplar, elogiosa e comovente participação da comunidade!), ano após ano, e, principalmente, o mencionado rol de atrações, cabe perguntar sobre o que realmente se pretende: Bater recordes de público e arrecadação? Fazer o máximo de shows populares? Tornar o município conhecido no mapa estadual, nacional e mundial? Alcançar novos recordes de consumo em litragem de chope e cerveja? Lotar hotéis e arrecadar impostos? Divulgar e vender produtos da indústria local? É isso, mais ou menos? Resumindo, um “festão sócio-comercial” e para todos os gostos? Para quê? Mas não é, e não deveria ser, uma festa típica, com objetivos muito particulares, especialmente o enaltecimento de uma cultura local e histórica? Transformar em atração turística, destacar, iluminar e festejar aquilo que realmente é um diferencial histórico no estado e no Brasil? Relembrando a introdução e as reflexões dos mencionados escritores, não seria algo para destacar e “cantar nossa aldeia e nosso povo”?

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