31 julho 2009

A Economia das Fraudes Inocentes

Em entrevista à revista Veja, edição de 15 de dezembro de 2004, o brilhante professor, escritor e economista norte-americano John Kenneth Galbraith (1908-2006), declarou o seguinte:
“A economia moderna é produto do surgimento de corporações poderosas e de novos métodos de administração.
O ponto forte dessa economia é a capacidade de mobilizar recursos científicos, organizacionais, culturais e políticos muito variados.
O maior de seus efeitos negativos é a habilidade das corporações de imiscuir-se à força nas políticas governamentais e direcioná-las.
O desserviço da economia moderna está na sua tendência de favorecer concentrações de poder.
A intromissão do setor privado no chamado setor público é ostensiva e crescente, e negá-la é uma fraude, nada inocente.”
À época, já com 96 anos de idade, e 70 dos quais dedicados à economia, Galbraith escrevera a obra “A economia das fraudes inocentes: verdades para nosso tempo”. O livro tem inúmeras referências a diversas áreas da economia, inclusive sobre saneamento e abastecimento de água.
Entre reflexões provocativas e irônicas, questiona “como é possível a fraude inocente, ou como a inocência pode ser fraudulenta”.
E diz mais: “se há inocência, ela indica ausência do sentimento de culpa ou responsabilidade. Se há fraude, ela remete à deturpação deliberada da realidade”.
Comumente, os estudos e debates relacionados à água tratam da redução de desperdícios, técnicas de preservação, recuperação de mananciais hídricos e de custos de tratamento de esgotos doméstico-industriais.
Mas um tema persiste polêmico, grave e preocupante. Trata-se da questão dos destinos econômicos e políticos dos serviços e reservas de água.
Uma observação antes de prosseguir: a redução da intervenção estatal é uma pauta correta e consolidada através alienações de patrimônio, concessões, permissões e/ou terceirizações.
Entretanto, e em desfavor das privatizações, essas mudanças revelaram uma falta de qualidade e capacidade de (auto) defesa do cidadão (consumidor) pelos partidos políticos, sindicatos e associações de moradores. Principalmente, pela ineficácia de instrumentos ativos de regulação e reclamação.
Em quase todos os lugares a privatização das águas foi prejudicial para as comunidades, incorrendo em tarifas extorsivas e casos de corrupção.
Prioridades como a qualificação da prestação de serviços e a universalização do atendimento foram prejudicadas em favor dos resultados financeiros.
De modo que para impedir tramitações rápidas (e mal esclarecidas) nas mudanças de serviços essenciais importa exigir a obrigatoriedade de discussões prévias e plebiscitárias.
Mas entre outras e tantas incertezas, há uma pergunta que não quer calar. Qual o porquê da precipitação e facilitação das privatizações por alguns políticos e seus partidos?
Provavelmente, talvez porque empresas estatais estão legalmente impedidas de financiar campanhas políticas. Mas as empresas privadas não têm esta restrição!
Uma longa concessão representa apoio financeiro para as eleições durante muitas legislaturas. Garantia de eleição até dos netos. Que dirá dos filhos!

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