27 março 2007

Para Compreender a Violência

Nós estamos no fundo do poço. Há quem diga que já passamos do fundo do poço. É verdade! Basta relacionarmos os inúmeros episódios recentes de violência explícita, tais como a morte do índio pataxó (queimado por jovens de classe média), o jornalista Tim Lopes (torturado e queimado por bandidos), a série de crianças estupradas e assassinadas, os ônibus incendiados com passageiros dentro, os ataques no Rio de Janeiro e em São Paulo. É uma lista sem fim e sem limites de crueldade.

E qual tem sido nossa reação ao crime organizado e à violência em geral? Abaixo-assinados, passeatas, criação de ongs, entre outras atitudes passageiras e sem objetividade prática. Notícias de jornal e tv que noutro dia dão lugar às notícias mais recentes (novos crimes).

Em comum, nossas reações têm o pedido de paz. Paz? Paz, não! Queremos justiça, ação policial, condenações, prisões. Queremos e precisamos da ação do Estado (ação municipal, estadual e federal).

Mas, sobre os pedidos de paz, façamos uma reflexão. Ainda que a maioria não seja afeita a raciocínios de natureza filosófica, isto é, àquelas elocubrações que pretendem a compreensão e/ou constituição racional das coisas que nos cercam.

A professora paulista Marilena Chauí (USP), em um antigo estudo sobre a violência, já observava que vários “dispositivos” e atitudes contribuem para ocultar a violência real e suas razões. Entre eles, destacava:

(1) um sistema jurídico que localiza a violência apenas nos crimes contra a propriedade e a vida;

(2) um sistema sociológico que considera a violência um momento no qual os grupos sociais "atrasados (eles)" entram em contato com grupos sociais "modernos (nós)". É o momento em “os desadaptados (eles)" tornam-se violentos;

(3) a vigência de uma distinção entre um "nós brasileiros não-violentos" e um "eles violentos". “Eles" são todos aqueles que, "atrasados" e deserdados, empregam a força contra a propriedade e a vida de "nós brasileiros não-violentos";

(4) e uma prática de distinção entre o essencial e o acidental: a sociedade brasileira não seria violenta. A violência seria apenas um acidente na superfície social sem tocar em seu fundo essencialmente não-violento. Isto explica, inclusive, porque os meios de comunicação se referem à violência com as palavras "surto", "onda", "epidemia", "crise", isto é, palavras que indicam algo passageiro e acidental.

Conseqüentemente, as desigualdades e as exclusões, o autoritarismo que regula todas as relações sociais, a corrupção, o racismo, o sexismo, as diversas formas de intolerâncias, não são consideradas formas de violência.

Isto é, a sociedade brasileira não é percebida (e não se auto-percebe) como estruturalmente violenta e por isso a violência aparece como um fato esporádico superável.

Esporádico e superável? Afinal, somos ou não somos violentos? E o que você acha? Pare, pense e reflita! Talvez ainda haja tempo de realmente salvarmos nossa pátria.

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