07 novembro 2006

A enfermidade de Dona Esperança
(sobre a crise ético-política)

A esperança fraudulenta
é uma das maiores malfeitoras da humanidade."Ernst Bloch, em "O Princípio Esperança".

Incluo-me entre os cidadãos que estão desesperançados com a indiferença e a não indignação social ante o conjunto dos crimes praticados no decurso do presente governo.
Quanto ao cego comportamento coletivo, convèm lembrar que a história é farta nas demonstrações dos erros decorrentes na indevida proteção dos governantes flagrados em delito, em detrimento da hierarquia dos valores permanentes de uma nação.
Do mesmo modo, importa denunciar a idolatria. Líder nenhum é fiel e exclusivo depositário das lutas de um povo, de suas esperanças e desejos político-sociais.
Independentemente de nossas opções/opiniões políticas, ideológicas e partidárias - e mesmo que não tenhamos nenhuma, não podemos prescindir da crença num sistema de valores nacionais, regras constitucionais, dispositivos legais, conceitos éticos, entre outros de igual importância.
Estes valores são frutos do esforço coletivo, sofrimento e resignação, às vezes de várias gerações. Não podem ser contaminados pela fraqueza, incompetência e desonestidade de indivíduos que não estão, ou não estiveram, à altura de determinado cargo e/ou momento histórico da nação.
Quanto à militância e fidelidade partidária, o engajamento no processo eleitoral, enfim, a opção por um companheiro/candidato, não pode constituir-se em compromisso inalterável, uma vez confrontado com fatos graves e ilegais, imorais e anti-éticos, relevantes à nação.
Descontados os equívocos de nossas opções partidárias, que merecem revisão e repactuação, a exemplo dos - por nós atribuídos - defeitos de outras ideologias, aliás, todas em constante processo de mutação e transformação, não tolero a idéia, nem me conformo, em permitir que destruam o patrimônio de luta, resistência e esperança de várias gerações.
Em verdade, neste vai-vem da política, aprendemos a sentir o amargo sabor da verdade e da realidade. À medida que a utopia e a paixão dão lugar à compreensão acerca das fraquezas humanas e das vocações autoritárias dos grupelhos políticos, aprendemos a valorizar os instrumentos básicos de um Estado Democrático de Direito.
A aprender, também, é que na política, como no amor, por conta de nossa idealização, demoramos para ver os defeitos de nosso objeto amoroso.
Todavia, mantenhamos as esperanças. Com certeza, haveremos de encontrar e construir as soluções para nossa tragédia e seus impasses. A história ensina que cada geração tem uma experiência inédita. Não há repetição. Cada retrato da sociedade é próprio de sua época.

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