30 março 2006

Globalização e Sociedade

Os recentes episódios ocorridos em Gênova, Itália, a exemplo do ocorrido em outras cidades no mundo, ratificam a atualidade e polêmica do tema “globalização”. A natureza constitutiva deste processo, a partir do consenso de Washington, determinou um modelo de relacionamento econômico e tecnológico que parece conduzir os países ditos em desenvolvimento à adesão subordinada, quase que inevitável, face a globalização financeira e volatibilidade do capital.
Neste sentido, já havíamos, em outra ocasião, abordado o tema sob a perspectiva da necessária (re)construção de um novo contrato social, didaticamente fundamentada, nos seguintes termos:

1-Introdução Política
A humanidade, de tempos em tempos, defronta-se com novos e significativos desafios, notadamente aqueles que dizem respeito a sua convivência, a harmonia social e econômica, as permanentes e insistentes diferenças sociais.
Estes novos e significativos desafios, embora muitas vezes renovam-se travestidos, produzem um conjunto de comportamentos, de ações e reações, de bases filosóficas, que determinam novas formas de atuação e compreensão da realidade.

2-Análise Político-Institucional Mundial
O triunfo do liberalismo parece determinar também, além do fim do emprego, o fim das relações sociais, confinando o ser humano a uma existência solitária. Em síntese, a construção e a aplicação do conhecimento não é mais uma tradução das experiências individuais e coletivas. Tradições, costumes, família, não são mais os pressupostos fundamentais que determinam o social. O novo homem é um sujeito de necessidades e ilimitados desejos de posse, e, assim, sua existência é medida pela quantidade. A liberdade e o desejo são expressos em números. A abstração do sujeito – pela ausência ou ignorância da contradição - parece determinar o fim da dialética.
Este precário quadro econômico e esta transformação comportamental, revelam indivíduos e grupos sociais fragilizados, suscetíveis de apelos demagógicos, à margem das soluções institucionais, dos poderes de estado, e, principalmente, à margem da organização básica formal e histórica.
As reações do povo, pela reflexão dos intelectuais e líderes políticos, organiza formas de enfrentamento, ora constituindo o lugar do cidadão, como fez a revoluçao francesa, ora constituindo o lugar do trabalhador como fez o manifesto comunista.
Agora, mais recentemente, com a queda do Muro de Berlim, e a instalação hegemônica do pensamento e prática neo-liberal, sob o domínio econômico das indústrias de informação e comunicação, com o predomínio dos bens culturais sobre os materiais, o que está sob ameaça é a própria existência humana, a liberdade do sujeito, os direitos humanos primários.
Se a revolução francesa determinou a busca da libertação política, o manifesto comunista a libertação econômica, nosso desafio consiste na libertação cultural, capaz de impor limites éticos ao reinado e império do lucro.



3-Tendência Político-Econômica Mundial
(desagregação, marginalização e exclusão)
As inovações tecnológicas de produção e de processos, demarcadas pela mundialização da economia e pela terceira revolução industrial, proporcionam o revezamento de cientistas e economistas na avaliação e nos prognósticos acerca dos cenários sociais e econômicos deste final de século.
No conjunto de reflexões e análises sobressai-se, inequívoco e unânime, que o "...futuro reserva menos empregos", como diz Jeremy Rifkin, presidente da Fundação das Tendências Econômicas, de Washington ( Folha de São Paulo, 25-08-97). Diz mais: "...os empregos serão poucos. Deles se ocupará uma pequena e bem paga elite profissional altamente qualificada".
“Os crescentes índices de desemprego geram um estado de ansiedade e perplexidade geral, com graves repercussões comportamentais.” É o que examina Viviane Forrest (revista Exame, 27-08-97), autora do best-seller "Horror Econômico".
Ignácio Ramonet, da Universidade de Paris, afirma que “esses fenômenos de mundializacão da economia e de concentracão do capital, tanto ao sul como ao norte, quebram a coesão social. Eles agravam, em toda a parte, as desigualdades econômicas, que se acentuam a medida que aumenta a supremacia dos mercados. Por isso, a obrigacão de revolta, o direito a agitacão popular tornam-se novamente cidadãos imperativos para recusar esses regimes globalitários inaceitáveis. Já não é tempo de reclamar a entrada , em escala planetária, de um novo contrato social?”

4-Mobilização, Resistência e Organização
Configura-se, pois, um quadro de inúmeras contradições que demandarão um profundo esforço e exercício de nossa capacidade. O exercício da liberdade pressupõe a tolerância e a solidariedade. Compromissos com a responsabilidade social determinarão um equilíbrio de consciência sobre direitos e obrigações.
Creio que os desafios da política consistirão da mediação da crise, em torno da construção do novo contrato social, elemento último e definitivo a confirmar e determinar a superação da razão sobre o instinto predador.
Contrato social em que as relações econômicas deverão estar a serviço do ser humano, da pessoa, e não a pessoa a serviço da economia. A economia é objeto da pessoa e esta seu sujeito, e não a economia sujeito da pessoa e esta seu objeto.
A liberdade de auto-determinação não pode limitar-se a capacidade e autonomia de consumo, mas sobretudo alcançar a idéia de um sentido próprio a vida, de sua consagração, conferindo um sentido positivo.