30 março 2006

A Tragédia de Erechim
(ou sobre o método, o treinamento e a hora certa)

Infelizmente, nada mais previsível que as consequências da falta de método, de treinamento e da hora certa. Tristemente, nada mais monótono, repetitivo e cansativo do que a sucessão de tragédias.


Comoveu-se todo o Rio Grande do Sul com a tragédia de Erechim. Nada mais trágico, nada mais arrasador, nada mais negação da condição humana do que a morte de uma criança, sobretudo quando ocorrer por razões não naturais, à conta da participação e/ou omissão humana.
Trata-se da cassação, interrupção, anulação de uma hipótese de vida, de uma perspectiva absolutamente particular e não renovável de uma existência, de um ilimitado espírito em comunhão com as limitações do corpo.
Entretanto, aos meus olhos, e sobretudo à minha irritante racionalidade, trata-se de mais um minúsculo parágrafo neste imenso livro chamado Brasil, recheado de capítulos com variações sobre um mesmo tema: incompetência e negligência.
Nosso dicionarista Aurélio informa que “competência é a qualidade de quem é capaz de fazer determinada coisa com capacidade, habilidade, aptidão, idoneidade”. Por consequência, incompetência é a característica de incapacidade, inabilidade, inaptidão e não idoneidade na concretização de determinada tarefa. Deduzo que a negligência é sua irmã siamesa.
Incompetentes e negligentes somos no nosso trabalho ao dar ou tolerar um jeitinho. Ao marcar hora certa e não cumprir, ou fazer o serviço com defeito. Ao descuidar da linha de produção da fábrica e daquela máquina importada que custa uma fortuna. Ao “esquecer” a mão dentro de uma engrenagem. Ao fazer manobras de risco no trânsito, causando arrepios no passageiro e nos transeuntes.
Incompetentes e negligentes somos na nossa condição de cidadãos ao tolerar lideranças e governantes que desperdiçam dinheiro público e privado em obras inacabadas, mal-localizadas e não funcionais.
Objetivamente, a incompetência e a negligência são frutos de nossa aversão ao método, à hora certa e ao treinamento. Por que? Porque toda previsibilidade é monótona, é repetitiva, é cansativa.
De praxe, reagimos ironicamente aos melhores profissionais porque sua competência e concentração é gélida e inumana, não combinando com nossa alegria e espontaneidade. Mas de que alegria e espontaneidade mesmo é que estamos falando?
Infelizmente, nada mais previsível que as consequências da falta de método, de treinamento e da hora certa. Tristemente, nada mais monótono, repetitivo e cansativo do que a sucessão de tragédias.

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